Os últimos dias de Diogo, o ‘Grande’

O português encontrado morto em Brighton passou os últimos dias de vida a dançar num festival em Leicestershire. Acabara os exames e decidira festejar com amigos. A polícia continua a investigar o caso.

A dançar com os amigos ao som de música electrónica e house, sob a copa de árvores que enchem as colinas de Leicestershire, no coração da Inglaterra rural. Diogo Moreira, de 29 anos, passou ali os últimos dias de vida com um grupo de amigos. Não era habitual ir a este tipo de festas mas acabou os exames na universidade e decidiu ir festejar as notas para o Festival Noisily, que começou dia 9 de Julho. Tinha pedido uma semana de folgas ao dono do café Redroaster, em Brighton, onde trabalhava em part-time. Antes de ir embora, ainda comprou ao patrão uma máquina de café portátil. «Andava entusiasmado», recorda Tim Hume, o proprietário do estabelecimento, onde o emigrante trabalhava há cinco anos.

Ficou combinado que voltaria ao trabalho no dia 15. Mas, nesse dia, já os amigos andavam desesperados à procura de Diogo. Depois de sair do festival, regressou a Brighton no dia 13. Nessa segunda-feira, teve um ataque de pânico, contaram, entretanto, os amigos. Decidiu então não ir para o apartamento onde vivia juntamente com dois músicos: Richie Monroe e Joseph Aswhin, que trabalhava com ele no mesmo café. Ficou antes a dormir em casa do sérvio Jovan Popovic, um dos amigos que o acompanhou aos concertos.

Popovic contou depois à Polícia que, quando acordou em casa às quatro da manha de dia 14, não viu o português. A porta da rua estava aberta. Diogo deixou em casa o casaco onde tinha a carteira e os documentos. O telemóvel ficou perdido no festival.

Nesse dia, os amigos ainda desvalorizaram a situação mas, com o passar do tempo, a preocupação aumentou. Jovan Popovic e Joseph Aswhin optaram por avisar a polícia de Sussex na quinta-feira, depois de o amigo não se ter apresentado no emprego. «Em cinco anos nunca chegou sequer atrasado ao trabalho», recorda Hume.

Era um rapaz tranquilo e calmo, dizem os amigos.

 

Reservado e alegre

No último ano, o ‘Grande’ – o nome pelo qual Diogo era conhecido desde os tempos dos escuteiros em Espinho – conseguiu uma bolsa de estudos e voltou à universidade. «Queria muito estudar e entrou em Ciências Ambientais e Geologia», conta ao SOL Carlos Filipe Silva, um dos muitos amigos de adolescência, que manteve contacto com o português e organizou, em sua memó- ria, uma caminhada em Espinho.

Antes de emigrar, há oito anos, Diogo já entrara em Engenharia Civil em Aveiro, seguindo as pisadas do irmão Paulo, mas acabou por desistir do curso. «Fez um break de um ano pois não tinha garantias de que era o caminho que queria seguir», explica Pedro Zanella de Sá, seu colega nos tempos da secundária Dr. Gomes de Almeida, em Espinho, e que, quando emigrou para Inglaterra em 2011, ficou uns tempos em casa do ‘Grande’, em Brighton.

Depois de deixar a Universidade de Aveiro, Diogo tornou-se instrutor de ioga, e deu aulas numa escola em Santa Catarina, no Porto, e também nas instalações do Núcleo de Montanhismo de Espinho, onde fazia escalada e caminhadas. «A escalar, o ‘Grande’ reflectia a sua personalidade. Calmo, responsável e em perfeita comunhão com o meio que o cercava», escreveu o amigo João Graça no Facebook.

Acabou por sair do país, ansiando por novas experiências e a oportunidade de conhecer pessoas diferentes. Chegou a Cardiff em 2008, onde viveu com dois grandes amigos de Espinho, que para ali tinham emigrado. Ficou dois anos no País de Gales, a trabalhar numa coffee shop de uma sala de espectáculos. Em 2010, partiu para Brighton. Mas não ficou muito tempo. Um problema de saúde da mãe leva-o a interromper a aventura durante quase um ano, regressando a Portugal para a ajudar a recuperar.

«O ‘Grande’ era alegre, relaxado, mas sempre foi uma pessoa reservada. Os tempos em Inglaterra tornaram-no mais extrovertido», recorda Carlos Filipe Silva, lembrando que tinha naquele país um enorme grupo de amigos de várias nacionalidades, o que é característico da sua personalidade.

A sérvia Tijana Topalovic, que vive em Brighton e conheceu o português há dois anos, decidiu dar o nome de Diogo a uma estrela da constelação de Capricórnio. «Registei uma estrela com o nome de Diogo em sua honra. Assim podemos encontrá-lo sempre», explica, dizendo que esta é uma merecida homenagem a uma pessoa tão ‘grande’. Para Tim Hume, o dono do café Redroaster, perder o português foi perder uma parte da família. «Tivemos muitos choros, muito abraços. Éramos uma família de 12 trabalhadores. Ele vai fazer-nos muita falta».

 

Unidos pelo Facebook

A história de Diogo espalhou-se rapidamente através do Facebook. Logo após o alerta à Polícia, os amigos e a comunidade portuguesa em Inglaterra usaram a rede social para tentar encontrar Diogo. Em segundos, a informação circulou entre conhecidos nacionais e estrangeiros, chegando não só a várias cidades inglesas e portuguesas mas também aos EUA. Quase de imediato os amigos começaram a receber respostas: de uma mulher que vira um rapaz «vagamente parecido» com Diogo. Dois dias depois, a 20 de Julho, um dos amigos conta que receberam um telefonema onde alguém afirmava ter visto o jovem, na noite do seu desaparecimento, a falar com um grupo de franceses na estação de Brighton. Pela cidade, os amigos procuraram Diogo a cada relato de avistamento.

Na página criada nas redes sociais para divulgar informações sobre o estudante da Universidade de Brighton, convocaram-se pessoas de Brighton para ajudarem nas buscas, onde participaram também os dois irmãos mais velhos de Diogo, Paulo e Nuno, que estiveram cinco dias em Inglaterra.

Tudo termina no dia 22, oito dias depois de o jovem ter sido visto pela última vez. A Polícia dos Transportes britânica descobriu o seu corpo, caído a poucas dezenas de metros da casa de Popovic, numa ravina rodeada por um muro alto de pedra, com arame farpado, junto a uma linha de comboio desactivada. Estava irreconhecível e foram objectos encontrados nos bolsos e as impressões digitais que permitiram confirmar a sua identidade.

A morte foi confirmada através do Facebook no dia seguinte. E foi online que os amigos em Espinho, em Brighton e aqueles espalhados pelos EUA, organizaram à mesma hora homenagens em sua memória no passado domingo, reunindo mais de 700 pessoas. A investigação à morte de Diogo prossegue e a família aguarda que o corpo seja libertado e possa ser trasladado para Portugal.