‘Não podemos vender leite mais barato do que água’

Os produtores de leite da zona do Minho e Douro Litoral alertaram hoje que a maioria das explorações leiteiras estão numa situação financeira insustentável, lembrando que se está “a vender leite mais barato do que água”.

Alguns produtores da região reuniram-se hoje numa exploração em Vila do Conde para deixar um apelo aos consumidores nacionais que bebam leite português, mas, também, para pedir maior colaboração por parte do Governo.

"A mensagem para o nosso Governo, mas também para os setores da distribuição e da indústria, é que parte do problema resolve-se em Bruxelas, mas também tem de haver uma intervenção nacional", começou por dizer Carlos Alves, da Associação de Produtores de Leite de Portugal – APROLEP.

O empresário revelou "esperança moderada" nas negociações que hoje decorrerem em Bruxelas, na Comissão Europeia, para se fixar um novo preço de referência a partir do qual a União Europeia comprará os excedentes do mercado, e explicou o motivo da sua relutância.

"Já existe um preço em que a Europa intervém comprando os excedentes do mercado, mas é muito baixo. Resta saber se hoje vai ser negociado um aumento simbólico ou algo realmente significativo. Porque como está atualmente não compensa", disse o produtor.

"O preço de intervenção está entre 18 e 21 cêntimo por litro, mas o que precisávamos era de 34 cêntimos. E nem queremos estar sempre a trabalhar para a União Europeia, pois se, tal como em França, existisse um acordo com os setores da indústria e distribuição para vendermos a esse preço, ficaríamos bem", completou Carlos Alves.

Para alcançar esse acordo, os produtores apelam à intervenção do Governo e do Presidente da República, mas pedem, também, para que se consuma mais leite nacional.

"Não queremos inflacionar o preço do leite, mas se a indústria e a distribuição colocarem à venda a um preço razoável e os consumidores preferirem leite nacional as coisas melhoravam. O que não podemos é estar vender leite mais barato do que água", afirmou o produtor, completando.

"Não gostaria que as manifestações muito violentas que aconteceram em França se pudessem repetir aqui em Portugal. Mas estamos a sentir-nos abandonados e ignorados por toda a cadeia do setor", concluiu.

Outro produtor, Manuel Azevedo, de 40 anos, que detém uma exploração familiar em Vila do Conde, partilhou os números da sua empresa para justificar a afirmação de que "a situação está insustentável.

"Tenho 230 vacas, que por mês produzem 85 mil litros de leite. O comprador está, de momento, a pagar-me 23 cêntimos por litro, mas isso representa um prejuízo de 10 cêntimos em cada litro que produzo", explicou.

Manuel Azevedo lembrou que em janeiro de 2014 recebia por litro de leite 39 cêntimos e que um ano depois o preço caiu para 29 cêntimos.

"Para podermos viver deste negócio precisamos de receber pelo menos 35 cêntimos por litro, porque só os custos de produção representam 33 cêntimos", apontou.

O produtor vila-condense lembra que o setor, que representa 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, que cria cerca de 100 mil empregos diretos e indiretos, e que concentra na zona de Minho e Douro Litoral 55% do leite produzido em Portugal Continental, poderá "não sobreviver se a situação continuar como está".

"Alguns produtores que conheço fecharam as explorações, outros estão prestes a fazê-lo. Eu não sei quanto tempo mais consigo aguentar, e felizmente não tenho empréstimos de investimentos senão seria impossível continuar", descreveu.

Lusa/SOL