‘Plafonamento’, a palavra horrível que Passos adora

O debate de Passos Coelho com Catarina Martins mostrou que o primeiro-ministro continua com um défice de convicção, de chama e de argumentos. Depois do confronto perdido com António Costa, voltou a falhar, agora frente à porta-voz do Bloco de Esquerda – a surpresa agradável deste ciclo de embates televisivos.

Passos Coelho esteve mais apático, defensivo e — com uma suposta deferência pela adversária que acaba por parecer simples displicência no debate — deixou ecoar sem resposta acusações de que mente e não tem propostas para o país.

A rigidez do modelo Passos-Costa deu lugar a uma quase ‘não moderação’ permitida pelo jornalista da RTPI. Catarina Martins aproveitou para levar a conversa para onde quis. Quando era suposto falar-se de austeridade, colocou o adversário a explicar-se sobre o modelo liberalizante da segurança social que dá pelo nome de ‘plafonamento’. Passos quase esteve sempre à defesa, ou, nas suas palavras, "a explicar-se".

Talvez para se redimir da referência críptica ao "plafonamento vertical" no debate com Costa, o líder do PSD agarrou a segunda oportunidade de voltar ao tema. E, infelizmente para as suas pretensões de captar eleitorado ao centro, alongou-se na ‘explicação’ de um sistema que tira no imediato contribuições para a segurança social. Porque isso permite salvar a sustentabilidade do sistema, talvez? Parece que não, afinal: “Isto não resolve o problema da segurança social”, admitiu, depois de uma longa exposição, bem ao seu jeito.

Catarina Martins embalou no ataque, lendo uma passagem do livro “Mudar” de Passos Coelho (o seu programa político antes de chegar ao Governo), ficando no ar a dúvida de que o “plafonamento” pode pôr em perigo o pagamento das pensões. E por causa da apatia de Passos Coelho, a incerteza ficou no ar.

Contra o Bloco de Esquerda, dir-se-á, teremos sempre a Grécia. E o líder do PSD lá invocou o nome de Varoufakis para provar que se tivesse seguido o caminho da irresponsabilidade aí estaria o segundo resgate. Catarina rebateu porém a acusação: o PSD nunca denunciou as más contas da governação do “partido irmão” da Nova Democracia que conduziram os gregos ao desespero. E, defendendo-se das acusações de radicalismo, a líder da extrema-esquerda até trouxe em seu auxílio Manuela Ferreira Leite e Bagão Félix. Chegou para não perder o ponto.

As posições chegaram a inverter-se, na retórica do debate. Foi quase cómico ver Catarina Martins acusar o primeiro-ministro de não apresentar contas para as suas propostas (“precisava que dissesse alguns números”, “está a ser perfeitamente demagógico”) e de querer lançar o país numa "Aventura".

No final, Passos Coelho equilibrou, ao contrariar o ataque de que o aumento da dívida pública se deve à política do Governo. Mas ainda não foi com Catarina Martins que inverteu o ciclo de prestações televisivas medíocres. 

manuel.a.magalhaes@sol.pt