Perante a crescente dificuldade de construção de verdadeiras alternativas políticas, existe hoje um clima de maior incerteza e volatilidade nos eleitorados, que ultrapassa a capacidade de previsão das sondagens. As decisões de última hora ou as reviravoltas nos propósitos previamente anunciados parecem predominar cada vez mais sobre a previsibilidade dos comportamentos eleitorais.

Curiosamente, quer na Grécia, quer no Reino Unido, os resultados das eleições acabaram por beneficiar os anteriores ocupantes do poder, apesar das desilusões e descontentamentos com as políticas seguidas.

Os gregos apostaram de novo no Syriza porque, à beira das urnas, se viram confrontados com a ausência de uma verdadeira alternativa, face aos velhos partidos oligárquicos que tinham conduzido o país ao desastre ou os pequenos partidos sem expressão para constituírem um bloco coerente.

Já os britânicos ficariam divididos entre dois triunfos de sentido oposto: o dos conservadores e o dos nacionalistas escoceses, castigando o rumo incerto dos trabalhistas e a falta de carisma do seu então líder, Ed Miliband. A crise existencial do Labour iria, aliás, conduzir o partido a uma nova liderança, protagonizada por um esquerdista da velha guarda, Jeremy Corbyn.

Este é apenas o sintoma mais recente da desorientação geral em que se encontra o centro-esquerda europeu, perdido algures numa fronteira difusa entre o pensamento único de matriz germânica e a tentação do radicalismo (agora encarnada pelo Labour de Corbyn ou o Podemos espanhol).

Não querendo pagar o preço de uma aventura de saída do euro, os gregos preferiram arcar com o peso das ilusões perdidas e de uma nova submissão à austeridade imposta pelos credores externos, esperando talvez que Tsipras possa compensar essas frustrações com as reformas internas de que a Grécia tanto necessita (nomeadamente, através de um combate de última oportunidade ao nepotismo e clientelismo que, há longas décadas, gangrenam o país).

Se Tsipras deixou muitos órfãos pelo caminho, os dissidentes do Syriza que tinham formado um partido autónomo não conseguiram o apoio eleitoral suficiente para obter representação parlamentar. O temor da saída do euro – um caminho proposto em Portugal pelo PCP, mas que nem o Bloco nem o Livre assumem – levou os gregos a aceitar a metamorfose do radical Syriza como um mal-menor.

Ora, é esse mal menor que está a assombrar as próximas eleições portuguesas, se dermos crédito às sondagens ou ‘bússolas eleitorais’ (embora, como vimos, esse crédito esteja consideravelmente prejudicado pelos recentes exemplos estrangeiros).

A paisagem eleitoral portuguesa oferece as indicações mais desconcertantes, sendo apenas certo que nem a coligação de direita nem o PS se encontram próximos de assegurar a maioria absoluta. Mais surpreendente, à primeira vista, é a coligação ter surgido à frente do PS nas ‘bússolas’ ou inquéritos conhecidos, se tivermos em conta o balanço global da governação nos últimos quatro anos ou as angústias que pairam sobre o défice do país depois do fracasso da venda do Novo Banco.

Para além da forma hábil como Passos e Portas têm gerido a campanha – apesar das manifestações hostis com que se defrontam nas ruas -, a tendência que parece desenhar-se em Portugal é uma réplica do que aconteceu na Grécia ou no Reino Unido. Ou seja, o receio de uma mudança tenderá a pesar mais do que a confiança numa alternativa, enquanto a direita vai exibindo a sua folclórica unidade e a esquerda se acantona irremediavelmente nos seus redutos.

Para que serve ter a esquerda, no seu conjunto, a maioria absoluta dos votos se a divisão entre os seus vários segmentos se mostra insuperável? Por mais que o PS se bata pelo voto útil, a perspetiva de conseguir capitalizar para si essa maioria absoluta aparece já como uma ilusão, apesar de António Costa surgir como campeão da simpatia. Ora, a perceção de que o PS está longe de atingir esse objetivo acaba por favorecer o apelo da estabilidade com que a coligação acena ao eleitorado, para além da bússola perdida dos inquéritos de opinião.