Os 2.508 lesados que compraram papel comercial aos balcões do BES aguardam quase há um ano para serem ressarcidos. Depois de vários avanços e recuos, no início da próxima legislatura deverá abrir-se um novo campo de negociação, já que o recurso à arbitragem recebeu o primeiro aval dos maiores partidos políticos, PSD/CDS e PS.
O SOLsabe que a Associação Os Indignados e Lesados do Papel Comercial (AIEPC) está já a desenhar uma solução de reembolso que, numa primeira fase, prevê pagar um máximo de 200 mil euros por cliente e passa pelo recurso à mediação.
Em declarações ao SOL, Ricardo Ângelo, presidente da AIEPC , confirmou que “a associação tem vindo a desenvolver conversações com os partidos do arco da governação, a coligação Portugal à Frente e PS, e que apresentará a solução formalmente ao novo Governo”.
Quem paga?
Se avançar, a proposta permitirá ressarcir por completo 70% a 80% dos lesados e quem não for reembolsado na totalidade receberá o remanescente em parcelas, ao longo dos próximos anos. O perfil das aplicações de papel comercial mostra precisamente uma média de 200 mil euros por investimento. Há uma minoria de investidores – 60 – que investiram mais de um milhão de euros.
Se esta solução vier a ser adotada e implementada, é a primeira vez que os lesados se disponibilizam a aceitar uma proposta que não garante o reembolso de 100% do valor investido em papel comercial.
O mais difícil de consensualizar será a proveniência dos fundos para o reembolso. Quem pagará a fatura: o Estado, o Sistema de Indemnização de Investidores, o comprador do Novo Banco? Esta resposta teria de ser encontrada num processo conciliatório que já ocorreu antes. Uma das inspirações para este caso é a tragédia de Entre-os-Rios.
Na altura, foi preciso definir as indemnizações a pagar aos familiares. O Governo nomeou uma comissão para o efeito, presidida por um magistrado judicial e onde estavam representados o Provedor de Justiça e representantes dos familiares. As indemnizações foram definidas caso a caso, pela comissão, e o dinheiro veio do Orçamento do Estado.
No caso dos lesados, a proveniência das verbas para as indemnizações seria mais difícil de acordar, já que no caso de Entre-os-rios o Estado assumiu a culpa pelo acidente – que vitimou 59 pessoas – e pagou.
Outra diferença que os lesados querem vincar tem a ver com o valor dos reembolsos, que não poderia diferir de cliente para cliente. “Tem de haver uma base comum, com direitos consignados. É uma solução ad hoc baseada na equidade”, explicou Ricardo Ângelo ao SOL, adiantando que o objetivo é ter a proposta totalmente desenhada para ser apresentada ao novo Executivo.
Ricciardi apoia lesados
Nas últimas semanas, os assessores jurídicos da associação – Nuno da Silva Vieira que trabalha em estreita articulação com Luís Miguel Henrique – têm tentado reunir apoios para uma solução negociada. Além dos principais partidos, a proposta de arbitragem já terá o consentimento prévio do presidente da CMVM, Carlos Tavares.
O aliado mais recente dos lesados é José Maria Ricciardi, o único elemento da família Espírito Santo que ainda está em funções, no Haitong Bank (ex-BESI). Na entrevista ao SOL na última edição, o gestor defendeu que tem de haver uma solução para os clientes lesados, de forma a iniciar a recuperação do nome da família. “E tudo farei para encontrar uma solução”, disse.
Ao que apurou o SOL, poderá haver contatos futuros entre Ricciardi e os representantes dos lesados, embora nada de concreto esteja ainda definido.
A última tentativa de solução para o problema foi apresentada por Carlos Tavares em julho. O presidente da CMVM sugeria uma troca de papel comercial por dívida subordinada. Os lesados, que apoiaram a proposta, passariam a ser credores do Novo Banco. O Banco de Portugal rejeitou a solução, considerando-a inviável porque teria impacto nos rácios de capital do Novo Banco.
Na campanha para as legislativas, o primeiro-ministro recomendou aos lesados avançarem com ações em tribunal.