O resultado das eleições visto por 11 personalidades

Veja as reações obtidas pelo SOL de personalidades dos mais variados setores da sociedade portuguesa sobre os resultados das eleições. Uns serão mais à esquerda e outros mais à direita, mas a maioria conflui num ponto: os portugueses exigem que coligação e PS se entendam.

 

Leia as reações obtidas pelo SOL de personalidades dos mais variados setores da sociedade portuguesa sobre os resultados das legislativas de 4 de outubro. Uns serão mais à esquerda e outros mais à direita, mas a maioria conflui num ponto: os portugueses exigem que coligação e PS se entendam.

 


António Cluny, procurador-geral adjunto, representante de Portugal no Eurojust

" Os portugueses deram de facto uma vitória à coligação, mas por outro deram uma maioria de votos aos partidos da oposição que defendem uma política diferente.

Isso implica necessariamente que qualquer que seja o governo que daqui vier a resultar terá de ter em conta esta leitura política e terá que ter uma sensibilidade muito grande nas medidas a adotar, designadamente nas políticas sociais."


António Cunha, presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas

"Não fiquei surpreendido com a vitória da coligação, tendo em conta os resultados que se foram desenhando nas últimas sondagens.

Acho que haverá um governo minoritário da coligação e obviamente que vai ser mais difícil governar num quadro minoritário, mas espero que os políticos tenham a habilidade para saber encontrar os compromissos de que o país precisa. Acho impossível vaticinar se o próximo governo vai durar muito tempo ou se daqui a dois anos estaremos de novo em eleições.

Uma boa notícia do novo governo seria a criação de um ministério somente para o Ensino Superior, separado do Ministério da Educação."


António Simões, antigo jogador de futebol

"Esta vitória da coligação seria impensável há uns meses. É o reconhecimento do rigor e da honestidade do Governo num momento muito difícil para o país. Representa uma segunda oportunidade, baseada numa esperança e confiança no futuro que a coligação inspira.

Não é fácil governar sem maioria, mas por outro lado é um grande desafio, cívico, moral e patriótico para o PS respeitar a legitimidade do Governo e contribuir para uma governação estável. No banco de suplentes ou a jogar, o importante é o sucesso coletivo, neste caso dos portugueses. Como no futebol, o meu espírito de equipa ou o meu patriotismo não deve existir só quando eu jogo, mas também quando sou suplente. Esse é o grande teste ao PS. "


Eduardo Catroga, economista

“Há uma vitória clara da coligação depois de quatro anos difíceis, que deve apresentar o seu programa no Parlamento.

O PS deve ter uma postura responsável e não inviabilizar o OE e o programa de governo. Recordo que há uma tradição democrática de o PS e o PSD, quando perdem as eleições, viabilizarem o programa do Governo.

O segmento mais europeísta do PS deve assumir as suas responsabilidades e ser consequente. O PS deve fazer pontes com o Governo e a coligação deve fazer pontes com o PS.

Finalmente, penso que deve haver um acordo de médio prazo para políticas europeias. O país quer estabilidade.” 


D. Ilídio Leandro, bispo de Viseu

“Este resultado foi a expressão do desejo dos portugueses que votaram e que se traduziu nesta percentagem. Já era difícil se um partido tivesse maioria absoluta, pois Portugal, a Europa e o Mundo não estão em boa situação.

Agora esta situação é mais difícil, dado que se atingiu uma impossibilidade de consenso. Julgo, porém, que o PS vai viabilizar em diálogo um governo e este tem de conseguir uma posição de diálogo com o PS. Até acho positivo um governo onde a força do diálogo seja a força maior.” 


Isabel Vaz, Presidente da comissão executiva da Luz Saúde

"Acho que é um resultado extraordinário para o PSD, no sentido de que é um partido que vem de quatro anos muito difíceis.

Depois, acho que em termos globais os resultados revelam uma maturidade muito grande dos portugueses, no sentido de que exigem aos políticos que se entendam nas questões fundamentais que se discutiram nas eleições, como as pensões.

No fundo, o que os portugueses disseram foi isto: nas questões do dia a dia, deixem a coligação governar;  quanto às grandes questões, a coligação que se entenda com o PS, designadamente nas pensões.

Agora exige-se maturidade à coligação e ao PS, vamos ver se os seus políticos estão à altura. O tempo não está para graças. E a votação reflete isso: os portugueses são realistas e não vão  por facilitismos e por discursos radicais, estão realistas. “


José Manuel Silva, Bastonário da Ordem dos Médicos

"Como sempre o povo português revelou ser sábio e prudente.

Retirou a maioria absoluta à coligação para que houvesse mais democracia na sociedade e mais espaço para o diálogo e respeito pelas organizações que representam a sociedade civil. E penalizou o PS por não ser capaz de se renovar, virar para o futuro e desligar do seu passado e das pessoas do passado. E mostra que é difícil o povo português dar uma maioria absoluta ao PS se ele não se renovar.

Assinalo também a vitória do BE que se apresentou renovado, com pessoas jovens e com uma mensagem que passou e foi premiada com o sua significativa subida de votos. Por isso, há que lamentar que o nível de abstenção continue elevado. Era importante que mais portugueses tivessem ido votar, até porque este ano houve muitos projetos políticos."


Lídia Jorge, escritora

"De certa forma é o resultado esperado. Esta foi uma péssima campanha. Teve dois pontos apenas. Um deles foi a discussão sobre a questão das reformas, que fez com que esta fosse uma decisão feita a partir dos lares da terceira idade e não do futuro de Portugal nem da relação de Portugal com o mundo. O outro foi a discussão em torno das sondagens, que tornou o resultado expectável: as sondagens vieram confirmar aquilo que os comentaristas diziam sobre as sondagens.

Os resultados, na minha perspetiva, correspondem assim ao que estava desenhado. É o processo de destino: cumpriu-se o que já estava cumprido.

Em relação ao que está a acontecer, há dois pontos a sublinhar: a tristeza com que vejo uma atitude absolutamente conservadora por parte dos partidos de esquerda, que procuram não se entender e que espremem o PS entre uma tenaz. É terrível, é uma atitude arcaica dos partidos de esquerda. Não são capazes de fazer um processo de aproximação, sendo de uma exigência que inviabiliza uma alternativa.

Por outro lado, desejo que o PS, que é onde se radica uma verdadeira alternativa à política da coligação, não deite pela janela, nos próximos dias e semanas, o que de melhor tem: António Costa. Não vejo outro rosto, não vejo outra força. Hoje, apesar de ficar de fora, é o político melhor preparado para liderar uma alternativa que ficou inviabilizada. Os deuses da vingança e do rancor costumam ter uma cara muito feia. Espero que isso não aconteça.“


Mira Amaral, presidente do BIC

"Estes resultados são uma estrondosa derrota do PS e não me surpreenderam, apesar do desencanto dos portugueses com a política da coligação PSD/CDS.

O líder do PS deve demitir-se: António Costa não se demitir é pornografia política. Até gostava dele, mas fiquei desiludido com a campanha desastrosa que fez. Ele tomou o poder de António José Seguro, fracionando o partido, assumiu-se como herdeiro de José Sócrates, e radicalizou o discurso ao dizer que não aprovaria o Orçamento do Estado para 2016.

A grande incógnita agora é saber se a coligação Portugal à Frente tem condições para governar em minoria."


Rogério Alves, antigo bastonário da Ordem dos Advogados

“O PS sofreu uma derrota pesadíssima que era impensável há seis meses. Agora o partido vai ter de viabilizar o programa de Governo da coligação PSD/CDS, caso contrário ficará totalmente descredibilizado em Portugal e na Europa. 

O PS tem de pensar na sua sobrevivência como projeto alternativo e de influência nas principais reformas. Isto ao mesmo tempo que António Costa, que não se demitiu, vai enfrentar dentro do seu partido dias ou mesmo meses de 'facas longas'.”


Rui Zink, escritor 

É uma vitória do génio político de Paulo Portas e da lata semi-ingénua de Pedro Passos Coelho. E é uma vitória porquê? Porque tudo menos PSD-PP levarem uma cabazada seria uma vitória. E ficarem à frente, mesmo em minoria, vale muito. Para mim é um bocadito imoral, mas é uma vitória moral. Ficam bem posicionados para as próximas eleições, que toda a gente sabe serão em breve, lá para Março. 

É uma vitória pessoal de Catarina Martins e Mariana Mortágua. O único partido com duas mulheres muito jovens e muito inteligentes como rosto de campanha mostrou que tem eleitorado. 

Não é uma derrota pessoal de Costa. Já se sabia que havia riscos sérios de o caso Sócrates derrotar o PS.

É uma vitória dos editores. Digo, editores de jornais e TVs e uma derrota do facebook e das redes sociais. Se eu fosse o Mark Zuckerberg demitia-me. É a diferença entre passar a mensagem e pregar aos convertidos. Provado fica que uma escolha calculada de notícias e manchetes, bombardeadas com destreza e arte, continuam a valer muito. É uma boa noticia para os directores de jornais: provado fica aos investidores que ainda vale a pena perder dinheiro com esta velha forma de comunicar, o papel impresso. 

Um exemplo: ainda ontem, dia das eleições, um editorial desvalorizava a emigração, dizendo que sim, prontos, mas ingleses e alemães (povos modelo de riqueza) também emigram. Era uma distorsão despudorada, mas estava feita, e num dia em que teoricamente… 

É uma vitória dos péssimos (mas eu iria jurar que é de propósito) cartazes do PCTP-MRPP, cheios de exclamações e «mortes aos traidores!». Podiam ter até um lema: «Há 40 anos a ridicularizar a esquerda.»

A frase da campanha cabe a Jerónimo: «Se a simpatia desse votos…»  A CDU está como eu: se os likes dessem dinheiro… 

Depoimentos recolhidos por Ana Paula Azevedo, Catarina Guerreiro, Joana Ferreira da Costa, João Madeira, Rita Carvalho, Rita Silva Freire,  Rui Antunes e Sandra Almeida Simões