Frederico Morais: ‘Quero chegar à elite mundial’

Apanhou a primeira onda aos cinco anos, numa prancha de bodyboard, mas aos 23 é no surf que dá cartas. Entre hoje e amanhã, em Cascais, Kikas, como é mais conhecido, discute o título de campeão nacional com o ‘irmão mais velho’ Tiago Pires.

Está a disputar o título nacional com Tiago Pires, seu ídolo de infância. É caso para dizer amigos amigos, ondas à parte?

Tem de ser. Acima de tudo queremos ganhar. O que não impede de sermos amigos fora de água. Sei que o Tiago se vai aplicar, mas eu vou lutar pelo título, que gostava de revalidar. Vai ser renhido.

Como nasceu essa amizade?

Conheci-o no Mundial da Figueira da Foz, em 2000, quando lhe pedi um autógrafo e tirámos uma fotografia. Depois ele magoou-se num joelho e como o meu pai é fisioterapeuta acabou por tratar dele. A partir daí começou a ir buscar-me a casa para surfarmos e surgiu esta relação de ‘irmão mais velho’. Não podia ter escolhido melhor pessoa para trabalhar.

Com que idade apanhou a primeira onda?

Comecei por me pôr de pé numa prancha de bodyboard numas férias de verão, em Vilamoura. Se contarmos isso como uma onda, deve ter sido por volta dos cinco anos (risos). Depois, aos seis, comecei a fazer surf com o meu pai, no Guincho.

Em que momento o sonho de fazer carreira no surf se tornou real?

Aos 14 anos, quando me sagrei campeão nacional de sub-21. Foi aí que tanto eu como os meus pais acreditámos que havia em mim mais alguma coisa. Já tinha sido campeão de várias categorias, mas esse título foi marcante.

Treina muitas horas por dia?

Começo por surfar duas vezes por dia, logo de manhã e ao fim da tarde. Tento conjugar as marés com a melhor altura para surfar. E ainda tenho um treino de ginásio ou boxe.

O boxe ajuda-o a surfar melhor?

Há certos aspetos que consigo ir buscar ao boxe e aplicar no surf e em mim. Dá-me força mental e garra e isso ajuda-me a ter uma melhor performance na competição.

Passa quantas horas dentro de água?

Nos dias em que o mar está de gala, aqueles dias de sonho que imaginamos na nossa cabeça, passo umas cinco ou seis seguidas. Se não, uma hora e meia para tirar o melhor rendimento, depois descanso e volto a treinar mais uma hora e meia.

Chegou a treinar no estrangeiro.

As férias de família tornavam-se férias de surf. No Natal, íamos um mês para o Havai. Desde os meus 10 anos que fazemos isso. E na Páscoa íamos para a Austrália, também um mês, onde tinha aulas para melhorar o inglês. No Carnaval tentava sempre ir às Maldivas. E quando havia uma janela aberta ia para as Canárias surfar. Era bom ter professores novos, pessoas muito experientes no mundo do surf, que foram bases essenciais na minha evolução.

O apoio da família foi fundamental?

Os meus pais sempre me disseram: ‘Desde que assumas o compromisso e te dediques, nós vamos apoiar-te a 100%’.

Em quantos países já esteve?

Foram mesmo muitos. Já nem sei de cor. A seguir a Portugal, que é o meu país de eleição, é na Austrália que me sinto mais em casa.

Dedica-se em exclusivo ao surf?

O surf é o meu trabalho. Hoje em dia é uma profissão e ocupa-nos o tempo inteiro.

Há quanto tempo?

Durante alguns anos conciliei os estudos com o surf, mas depois acabei o 12.º ano e dediquei-me a tempo inteiro. Tornou-se impossível conciliar.

Identifica-se apenas com o surf convencional ou também com o de ondas gigantes como o da Nazaré?

Não sou surfista de ondas grandes, muito menos na Nazaré. É uma adrenalina que gostaria de experimentar no futuro, quando for mais velho e deixar a competição.

Onde surfou as melhores ondas?

Na Indonésia, em Mentawai. É paradisíaco, com mulheres lindíssimas, palmeiras por todo o lado, areia branca, água transparente… do mais perfeito que se possa imaginar.

Já teve algum susto?

Tinha 14 anos e estava em Pipeline, no Havai. Um dia em que o mar estava grande, maior do que o normal, a maré estava muito vazia, já havia pouca água e eu caí da prancha numa onda e bati no fundo do mar, nas rochas. Tive que levar 14 pontos na cabeça e outros 14 num ombro.

Pensou em desistir?

Não, nunca. É um estilo de vida. Surfar dá-me uma paz enorme e uma alegria imensa. Está fora de questão deixar de surfar.

Aos 23 anos, qual foi o seu momento mais alto da carreira? 

Tenho dois. A vitória sobre o Kelly Slater em Peniche (2013). Uma vitória inesquecível, numa prova do circuito mundial. E quando me sagrei no mesmo ano Rookie of the Year (novato do ano). Foi inacreditável, um objetivo realizado que me deu uma notoriedade muito grande no surf internacional.

O que sentiu ao derrotar o onze vezes campeão do mundo? 

Pensei que não estava a acontecer. Que era só um sonho. Sabia que não tinha nada a perder, que podia arriscar. Foi o que fiz e bati o maior do surf mundial.

Quais as prioridades para os próximos anos? 

Quero chegar à elite do surf mundial. É o meu maior objetivo e é por ele que tenho trabalhado tanto.

hugo.alegre@sol.pt