Resumo das eleições

A PàF ganhou as eleições legislativas portuguesas, mas perdeu a maioria. O PS perdeu mas ganhou onze deputados. O PCP ganhou três deputados, o que significa que teve uma vitória estrondosa.

O Bloco de Esquerda, como sabemos, mais que duplicou a sua bancada; ou seja, está duas vezes mais sozinho. Sempre que as eleições não resultam naquilo a que os perdedores chamam ‘a ditadura da maioria’, oferecem por seu lado possibilidades que a essência da democracia por vezes esquece: a negociação, a moderação das ambições, o poder baseado no debate e na discussão. O futuro não será calmo, mas se a responsabilidade impera, então é legitimo pensarmos que podemos ambicionar por debates mais estimulantes na Assembleia da República, problemas e soluções mais complexos, e assim talvez a discussão política se torne mais aberta. São só boas notícias. Se isto acontecer, tenho a certeza de que a abstenção provocada pela indiferença perderá por fim as próximas eleições.

Contributos deprimentes

Ainda não decidi se fazemos a nossa sorte ou se é apenas um acaso. Se calhar depende. O PS não ajudou e não teve sorte. O apoio de Carlos do Carmo, na reta final da campanha, fez mais mal do que bem a António Costa. Carlos do Carmo fez o papel do amigo que nos quer tanto ajudar que nos enterra de vez. Pareceu-me ouvir naquele almoço em que defendia um Costa atacado por todos, mencionando Sócrates e criticando aqueles que tinham deixado o líder à mercê de uma candidatura de Maria de Belém à presidência da República (com a própria presente, pormenor notável), o som de uma pá a ser enterrada na areia, chac, chac. José Sócrates teve o seu momento Instagram com a fotografia de um jantar em sua casa. Sócrates, na sua infinita simpatia, mostrou o seu apoio após o debate celebrado pelos socialistas como memorável. Foi isso. O golpe final aconteceu no próprio dia das eleições, com a imagem de Sócrates de fato e gravata à hora de almoço. Chac, chac…

Um deputado

O Partido Pessoas-Animais-Natureza, um nome que não dá jeito nenhum, mais conhecido por PAN, elegeu um deputado. Dos chamados ‘pequenos partidos’ foi o único que conseguiu uma eleição. Há várias boas notícias. Temos a oportunidade de ter um partido na Assembleia que discuta questões relacionadas com o ambiente e com os animais. Dir-se-ia que para isso existem Os Verdes. Acontece que durante décadas nunca lhes ouvi uma única palavra sobre estes temas. A votação no PAN implicou a não votação noutros recipientes de votos de protesto. Marinho e Pinto não foi eleito, o que nos deve dar motivo de orgulho no país, e Joana Amaral Dias vai poder gozar a sua licença de maternidade em paz. Há casos em que a multidão é sensata. Só me causa ansiedade um gosto exótico do PAN por copos menstruais, tudo em benefício do ambiente. Mesmo assim vai ser divertido ver os deputados a falar de menstruação. Se percebem ou não alguma coisa do assunto é o que veremos.

76

Até à data em que escrevo, sabemos que dos 230 deputados, 76 são mulheres. Trata-se de um terço do Parlamento e não de metade, mas é certo que os resultados são melhores do que nas eleições de 2011, em que tinham sido eleitas apenas 62. A representatividade das mulheres no Parlamento, nas empresas e na vida cívica em geral não depende de uma questão de gosto nem se trata de um assunto que pode ser adiado. Impedir que mulheres ocupem cargos de topo nas empresas, evitar que figurem nas listas dos partidos em lugares elegíveis, subtilmente afastar as mulheres de grupos de poder, não contrariar políticas que protegem a desigualdade salarial e que permitem que as mulheres ganhem menos do que os homens no desempenho das mesmas funções são várias formas de engano. As mulheres estão em maioria nas universidades e isso quer dizer que o Estado aposta na sua formação. Impedir que cheguem a certos cargos e ocupem certos lugares é por isso enganá-las.

Ai, a mensagem…

Há muitas razões que explicam o magro resultado do PS. A falta de unidade do partido, o discurso contraditório, a atitude por vezes ideologicamente errática de António Costa: ou é de esquerda de mais ou de menos ou de direita de menos ou de mais. Penso que o líder socialista era tudo o que o PS é em partes. Costa quis falar aos socratistas, que vá-se lá saber por que carga de água agora representam a ala mais à esquerda do partido. Por outro lado, quis ser moderado para seduzir os seguristas. Por outro lado ainda, quis mostrar-se um negociador enérgico para satisfazer e preservar os costistas de gema. Acabou por ser tudo muito confuso. Já a coligação, pelo contrário, foi capaz de organizar a sua mensagem e ‘comunicá-la de uma forma simples’ (é assim que se diz, não é?): fizemos isto (austeridade) porque tinha de ser e agora queremos fazer menos (austeridade) para folgar as costas. Pode parecer vago, mas não há ninguém que não perceba.