Assis assume ‘fratura’ com Costa e defende governo da coligação

“A melhor solução para o país e para o PS é a coligação formar governo. E o PS assumir de forma clara e responsável a liderança da oposição, dialogando sempre com os partidos à sua direita e à sua esquerda”, defendeu ontem Francisco Assis, em entrevista à RTP3. 

O eurodeputado socialista assumiu a "fratura" em relação à estratégia que está a ser seguida por António Costa. E embora defenda que a questão da liderança não se coloca para já, disse estar disponível para se candidatar "em condições excecionais", se o partido assumir um papel contrário ao que defende e que é o de liderar a oposição.

"Do ponto de vista da governação do país, a grande clivagem no Parlamento não é entre PSD e PS, mas sim à esquerda, entre o PS e PCP e BE", salientou Assis, apontando como exemplos as matérias relacionadas com a Europa, nomeadamente o euro e o tratado orçamental. "Do ponto de vista da legitimidade formal, qualquer solução que saia do Parlamento é legítima. Mas eu coloco a questão do ponto de vista da factibilidade: é possível um governo com apoio de PCP e BE ter estabilidade e verdadeira capacidade de fazer as reformas de que o país precisa, por exemplo na Segurança Social? Tenho as maiores dúvidas".

Para o eurodeputado socialista, "seria muito negativo" um governo PS apoiado pelo PCP e pelo BE: "Temos a responsabilidade histórica de evitar a destruição do Estado social, mas também temos de admitir que o Estado social precisa de reformas. Ora, os partidos à esquerda do PS têm uma visão antireformista".

É como se os ateus de repente se aliassem ao Papa

Assis diz que a disponibilidade manifestada pelo PCP "é uma novidade, mas não é boa porque não tem consistência: quando falamos em fazer acordos com partidos, temos de olhar para a sua identidade e ver os seus programas eleitorais".

"O PCP e o BE não vão deixar de ser quem são de um dia para o outro, ninguém acredita", acrescentou o eurodeputado socialista. E ironizou, dando uma imagem como exemplo: "É como se uma associação de ateus convidasse o Papa para a integrar, dizendo para esquecerem de momento a divergência quanto ao facto de ele acreditar em Deus, mas que podem estabelecer um acordo quanto aos menus do almoço e do jantar".

Na sua opinião, o caminho a seguir pelo PS é ir diretamente para o Parlamento: "Não vejo também utilidade em o PS estabelecer qualquer pré-acordo com a direita. A direita deve apresentar o seu programa de governo, o PS assume-se como partido de oposição responsável e em cada momento terá de negociar com o Governo os instrumentos imprescindíveis à governação do país. Quando nós estivemos em maioria relativa, também não negociámos previamente com nenhum partido, caso a caso, as medidas. O PS tem é que assegurar uma correta representação na AR das suas propostas e dos segmentos da população que o apoiaram".

'Assumo a fratura com António Costa. Mas não se pode governar a qualquer preço'

Francisco Assis diz compreender a desilusão dos socialistas com os resultados eleitorais, mas avisa: "Não se pode governar a qualquer preço, de qualquer maneira, porque depois pagamos um grande preço por isso e que seria o PS não conseguir governar de acordo com as suas propostas e visão para o país. Seria terrível".

"Assumo, nisto, a fratura com António Costa. Mas sinto que tenho essa obrigação. E há muita gente no PS e no país que pensa como eu e que está a ser vitima de pressão inaceitável de muitos setores arrogantes que nos querem classificar como sendo de direita e colocar isto no plano moral", acrescentou.

Corrida à liderança? Agora não, mas…

O eurodeputado, que já antes disputou a liderança do PS com António José Seguro, elogiou António Costa ("seria um ótimo primeiro-ministro") e voltou a defender que o facto de ter perdido uma eleição não quer dizer que acabou a sua carreira política: "A questão da liderança do partido não se coloca neste momento".

E Francisco Assis? "Os socialistas podem contar comigo para tudo, mas só volto a ser candidato a líder do PS em circunstâncias excecionais: se entender que tenho a obrigação, perante a minha consciência e o partido e o país, de me candidatar. Mas estamos muito longe ainda de chegar a essa situação. Ainda espero que nos próximos dias as coisas evoluam num sentido tal que não tenhamos que chegar a uma situação dessa natureza", respondeu.

paula.azevedo@sol.pt