‘O valor do Português é cada vez mais reconhecido’

Diplomata revela que, na China, os chineses que estudam a língua portuguesa têm mais empregabilidade do que os que apostam noutro idioma. A poucos dias da gala dedicada aos negócios entre os dois países, avança que a Economia Azul, a Economia Verde e a alta tecnologia serão os próximos alvos de investimento. 

‘O valor do Português é cada vez mais reconhecido’

Como estão as relações entre Portugal e China?

Assiste-se a um progressivo maior conhecimento em cada um dos países sobre a realidade do outro, baseada em experiências concretas de investimento e negócio, em contacto pessoal em viagens de lazer ou de trabalho, em maior intercâmbio entre instituições científicas, em mais retorno prático das relações de cooperação entre instituições académicas, nomeadamente formando chineses lusófonos e portugueses falantes de mandarim. Esse maior conhecimento recíproco é a base sólida indispensável para o reforço sustentado das relações que são excelentes no plano político e entusiasmantes em todos os outros vetores do relacionamento bilateral.

O que levou as empresas chinesas a investir em Portugal?

Houve uma conjunção temporal oportuna entre o processo de internacionalização de empresas  chinesas, encorajadas ao Going Global [a tornarem-se globais] pelas autoridades de Pequim e a circunstância de terem ficado disponíveis, por via das privatizações em Portugal, ativos de dimensão e interesse óbvio para investidores chineses. Mas, acima de tudo, as empresas chinesas não fizeram mais que juntar-se a uma tendência que tem a ver com a constatação que o mercado português tem para oferecer a investidores estrangeiros tem características muito apetecíveis.

Que características são essas?

Localização estratégica, potencial de hub, qualidade dos recursos humanos, facilidades logísticas, medidas fiscais e outras de incentivo ao investimento, lifestyle único. A forma, naturalmente simpática, como lidamos com visitantes chineses também tem sido transmitida ‘boca a orelha’ a outros potenciais investidores.

Os chineses entraram em Portugal primeiro com pequenos negócios como restaurantes, lojas ou frutarias. Depois vieram as grandes empresas. Em que áreas podem surgir novos investimentos?

Na Economia Verde e na Economia Azul, e em setores de alto conteúdo tecnológico e em que se aposte na inovação. À medida que há cada vez mais empresas e investidores chineses em Portugal, com maior conhecimento no terreno da realidade portuguesa, serão esses “novos peritos”, esses “Amigos de Portugal”, que saberão identificar o que mais se adequará aos seus objetivos de expansão e investimento.

Que papel pode ter Portugal na relação da China com os países lusófonos?

Temos uma língua comum, uma vivência do mundo muito semelhante e uma partilha de afetos  que permite que sejamos parte da solução e nunca o problema. Outro trunfo é que soubemos consolidar uma relação de respeito mútuo e de confiança com a China – e de admiração recíproca das nossas qualidades. E pode ser jogado quanto a projetos em que a língua mais profícua para gerir ou fechar um negócio seja o português. Um projeto de cooperação trilateral será sempre win-win-win.

O interesse dos chineses em aprender português é cada vez maior. Como se explica? Está relacionado com o aumento das relações entre os países lusófonos e a China?

O valor económico da língua portuguesa, que é cada vez mais reconhecido, jogará seguramente um papel importante na expansão da rede de universidades e outros estabelecimentos onde se leciona o português. A empregabilidade dos jovens licenciados dos cursos de Língua e Cultura Portuguesas na China tem ultrapassado a empregabilidade dos jovens chineses que se propuseram aprender outra língua estrangeira. Mas tem de ser mais que isso, ou não teríamos cem mil hits no site da embaixada no Sina Weibo, o Twitter chinês, quando anunciámos uma nova tradução de um livro de Saramago.

Que conselhos deixa a empresários que queiram investir na China?

Que não percam as características que nos fazem encarar o mundo de uma forma que não é nem dramática nem ingénua, que foi o que sempre nos definiu. Há que fazer bem o trabalho de casa e prepararem-se com perseverança e resiliência para o longo prazo.

Têm-se falado muito do interesse em estabelecer ligações aéreas diretas entre Portugal e a China? Quando poderão surgir?

Estou convencido que já estamos muito perto do ponto em que o retorno puramente comercial na abertura da linha direta encorajará uma certa companhia aérea chinesa a abalançar-se a essa aposta. Mas, por agora, ficava-me por aqui.

O que espera da gala Portugal-China de 29 de outubro?

Que se consolide como uma data incontornável para todos que estão ligados ao relacionamento entre Portugal e a China, em particular na componente empresarial. É ótimo e muito significativo que haja uma ocasião anual em que se possam confraternizar, trocar notas e celebrar o que ocorreu no ano anterior no quadro cada vez mais dinâmico da atividade de empreendedores e empresas nos nossos dois mercados.

ana.serafim@sol.pt