Proteção civil debaixo de fogo por causa das cheias no Algarve

A Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANPC) devia ter aumentado o nível de alerta de risco para o sul do país, criticou hoje a Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e Proteção Civil (ASPROCIVIL).

Proteção civil debaixo de fogo por causa das cheias no Algarve

 Ontem, o distrito de Faro foi fustigado pelo mau tempo. Loulé, Portimão, Olhão e Silves foram alguns dos concelhos mais afetados pela intempérie mas o mais devastado pelas fortes chuvas e ventos que se abateram na região foi Albufeira, cuja baixa ficou completamente inundada. 

A ASPROCIVIL não poupa críticas à ANPC por não ter, após o aviso vermelho do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) para aquela zona do país, elevado o alerta para risco extremo – ou seja, laranja ou vermelho – o que se traduziria na prontidão de todos os meios da proteção civil para responder às necessidades.

 “O IPMA emitiu um aviso de condições de risco extremo, a ANPC deveria tê-lo cruzado com as probabilidades do que as condições implicaram para a população e ter elevado o alerta”, que permaneceu azul – cor que corresponde a alerta de risco mínimo, logo a seguir ao verde, explicou ao SOL o responsável da ASPROCIVIL, Ricardo Ribeiro.

Em nota, a ASPROCIVIL diz não compreender a inação da Proteção Civil no distrito de Faro, com os dados facultados pelo IPMA que alertou o país e a ANPC “de que haveria a previsão de Risco Extremo de períodos de chuva forte e persistente".

“Sendo verdade que a caracterização urbanística, a dimensão e características das redes de águas pluviais dos locais afetados não foram capazes de responder a este tipo de eventos extremos, que acontecem ciclicamente”, refere a associação, “não se entende como é possível que a ANPC, tendo conhecimento da previsão de condições de risco extremo, tenha mantido inalterado o estado de alerta especial azul para aquela região.

Para a estrutura da Proteção Civil “o que conta é o risco”, esclarece a mesma organização, considerando que esta “omissão de decisão certamente levou a que bombeiros, autoridades, serviços municipais de proteção civil, entre outros demorassem mais tempo a responder operacionalmente ao evento que se abateu no sul do país”.

Um morto, e 40 desalojados em Albufeira, erguida sobre a ribeira

Hoje, tanto a população como as autoridades começaram a trabalhar no centro de Albufeira, a cidade mais fustigada pela enxurrada, para tentar repor a normalidade. O rescaldo é devastador: cerca de 40 desalojados, um idoso de Boliqueime encontrado sem vida durante a madrugada, lojas, cafés, garagens e habitações inundadas, carros submersos ou arrastados pela enxurrada, ruas cortadas. Foi assim este domingo em Albufeira, após quase 10 horas de chuva constante.

Esta manhã, o presidente da Câmara Municipal de Albufeira realçou que é preciso “fazer uma avaliação de tudo para sabermos como agir”. Tanto o sistema elétrico como o serviço de água foram afetados. “Temos danos de todas as maneiras e feitios”, admitiu mesmo o autarca, acrescentando uma mensagem de esperança: “As pessoas de Albufeira veem as suas vidas aqui um bocado atrapalhadas mas vamos juntos vencer isso”.

Esta não é a primeira vez que a Albufeira fica debaixo de água, com as águas da ribeira a invadir a cidade. Segundo o site do jornal local Sulinformação, nas décadas de 40 e 50 do século passado, também “pródigas em inundações no Algarve”, as cheias "adquiriram contornos violentos em Albufeira". “Cheias causadas por intensa pluviosidade, que engrossaram a ribeira e invadiram a vila, que cresceu precisamente sobre a ribeira” nota o jornal, recordando que estas inundações “semearam o pânico e o horror, provocando elevados prejuízos materiais e até perdas de vidas humanas”.

Diz o autor do artigo, engenheiro de ambiente e investigador da história local, que "sendo as cheias um fenómeno cíclico e normal no clima mediterrânico, e a função dos cursos de água tão-somente transportá-la (…), a ocorrência de cheias fluviais em Albufeira é (…) uma verdadeira 'bomba relógio', de consequências imprevisíveis" .

"Quanto a responsáveis", conclui, "somente o Homem o é, afinal ocupou, usou e abusou de uma área que não era sua, mas da Ribeira de Albufeira".

sonia.balasteiro@sol.pt