Os comunistas não têm vantagem em assinar

Um dia, há cerca de cinco anos, numa das últimas conversas com o meu pai, perguntei-lhe se colocava a hipótese de apoiar a candidatura de Fernando Nobre – a pergunta não era inocente, ele já era comunista antes de eu nascer e, pormenor que me parecia relevante, dava-se bem com o criador da AMI e…

Conto o episódio por esclarecer o que está em jogo nas difíceis negociações entre socialistas e comunistas. É preciso entendermos que um comunista não se alista no PC para ter benesses sociais, ascender em empresas ou ter lugares no governo. Regra geral, aceitam pagar o preço que for necessário, têm orgulho na sua condição revolucionária, nos seus heróis, no seu mundo à parte, na sua superioridade moral. Os comunistas definem os socialistas como mencheviques, traidores da classe operária e dos trabalhadores, gente que tem da política o mesmo entendimento da direita, a mera ambição de lugares e a incapacidade de sacrificar privilégios de classe e o seu bem-estar. O conservadorismo dos comunistas é militante e não quebra.

Nesta fase do jogo tudo pode acontecer, mas seria uma surpresa ver o PCP assinar um contrato escrito que viabilizasse um governo de esquerda durante quatro anos. Os indícios não param de ser somados: Heloísa Apolónio, João Oliveira, António Filipe e o Avante repetiram o mantra de que a palavra de um comunista torna a assinatura de um papel ridícula e desnecessária. Não o fizeram por acaso, fizeram-no concertadamente.

O PCP controla vários poderes, essa é a sua força motriz, nisso não poderá tocar. Ao contrário do Bloco tem muito a perder. E mais importante do que o sucesso de Costa (que implicará sempre concessões ao poder ‘capitalista’ de Berlim e Bruxelas), interessa o sucesso da CGTP e das dezenas de pequenos e médios sindicatos que controlam e que são a sua vanguarda.

Os comunistas são ‘mesmo’ revolucionários, tenho-o escrito bastas vezes. Almoçar com um comunista não é igual a pedir um bife com batatas fritas na companhia de um bloquista; são conversas, culturas e uma língua diferente. Os comunistas estão preparados para o sacrifício, é um peso que carregam e de que se orgulham. Não nos iludamos, para os comunistas o acordo à esquerda, e uma possível integração efetiva num governo de Costa, será vista como um sacrifício supremo, jamais como uma felicidade. Os comunistas querem o poder, não este poder. O PCP só assinará um papel se concluir que, na via para uma verdadeira revolução, o passo pode ser uma mais-valia.

Quanto a António Costa, fez como Mourinho quando está em alta. Meteu férias com o país em ebulição – fê-lo no mesmo espírito do treinador quando sai para as cabines ainda com dois ou três minutos para jogar. Quer passar um sinal de força e tranquilidade, uma prova de que não está tranquilo e de que o seu poder está preso por arames. Se ganhar é o golo de uma vida.

luis.osorio@sol.pt