Jorge Coroado: ‘Jorge Sousa prejudicou as duas equipas no dérbi’

Em entrevista ao SOL, Jorge Coroado fala em erros do árbitro para os dois lados no Sporting-Benfica da Taça de Portugal e desvaloriza as ofertas de cortesia dos encarnados. Mas diz que podem ser interpretadas como uma forma de conhecer os árbitros.   

Jorge Coroado: ‘Jorge Sousa prejudicou as duas equipas no dérbi’

O Sporting tem sido beneficiado pelas arbitragens esta época?

Num jogo ou outro, terá usufruído do beneplácito dos árbitros. Mas também já foi castigado. Acontece com todos os clubes.

No dérbi de sábado para a Taça de Portugal, o Sporting foi ajudado?

Foi beneficiado e prejudicado. A cotovelada de Slimani a Samaris merecia o cartão vermelho e o Adrien teve lances que justificariam ação disciplinar. Mas foi prejudicado ao não ser assinalado um penálti de Samaris sobre Slimani, e há três entradas – de Jardel, André Almeida e Samaris – para vermelho. Jorge Sousa, o melhor árbitro português, não esteve ao seu nível, mas não prejudicou uma ou outra equipa. Prejudicou ambas.

Não referiu o penálti reclamado pelo Benfica. Foi propositado?

Não existe falta. Os jogadores estão de costas e chocam. Só depois as pernas de João Pereira se entrelaçam nas de Luisão. Ocontacto é próprio do futebol.

Para usar a expressão de Rui Vitória, esta semana foi a vez do Benfica ‘fazer barulho’. Algum dos grandes foi mais beneficiado até agora?

Tenho esse registo informático, mas não o sei de cor. No final, as coisas ficam sempre iguais. É natural que quem está pior classificado reclame mais. No ano passado o Benfica foi beneficiado em alguns jogos e não reclamou. É comum a todos: quando são beneficiados, calam-se. Por isso, quando reclamam, vale bola. Vale bola.

A tese do ‘quem não chora não mama’ é válida? 

Nem sempre. Dou um exemplo do meu tempo. O Manuel Cajuda, então treinador do Belenenses, queixava-se dos árbitros por tudo e por nada. Um dia pedi-lhe para não se manifestar e, após três ou quatro semanas, disse-me: ‘Epá, oh Coroado, as arbitragens estão a correr melhor’. Isto para dizer que, quando alguém é ultrajado permanentemente, o subconsciente tende a decidir em desfavor daquele que mais o caustica.

O diretor de comunicação do Benfica, João Gabriel, acusa a atual geração de árbitros de não estar preparada para enfrentar a pressão. Concorda?

Essa personagem é sempre motivo de boa disposição pelas coisas que diz, mas neste caso até concordo.

Se o ‘quem não chora não mama’ pode fazer ricochete, como diz, porque é que os clubes insistem?

Os dirigentes entendem que se falarem grosso retiram benefícios. E ao tentarem carrear para terceiros responsabilidades próprias, também escondem os erros cometidos. É atirar areia para os olhos dos adeptos.

Foi isso que o Sporting fez, ao criticar muitas vezes as arbitragens ao longo dos últimos anos, ou havia mesmo razões de queixa?

O Sporting sempre foi o calimero do futebol português. Mas recordo-me que, quando o clube decretou o luto, e até foi após um jogo em Chaves em que eu meti a pata na poça, teve razões de queixa. Houve demasiados erros nessa época, mas não com o intuito de prejudicar o Sporting. Parto do princípio que os árbitros não perseguem nenhum clube, mas só posso falar por mim.

Como reagia às críticas?

Era para o lado que dormia melhor. Adorava arbitrar jogos quando, por antecipação, punham em causa a minha nomeação. Davam-me mais pica e eram os que me corriam melhor.

O presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, colocou em causa a seriedade dos árbitros ao denunciar as ofertas de cortesia do Benfica?

Não entendi assim. Quis antes fazer uma acusação ao Benfica que não tem pés nem cabeça. Mas censuro o facto de os vouchers, e sei que era assim, não estarem visíveis no momento da oferta. É falta de respeito serem metidos por debaixo da camisola e pode até ser entendido – e na minha perspetiva é – como o Benfica querer conhecer quem tem à frente. Como quem diz: se o árbitro os utilizar, já sei quem ele é e o que posso fazer com ele depois. Também sei que o conjunto não foi oferecido a todos os árbitros. É um erro. Ou se oferece a todos ou a nenhum. Não sei qual é o procedimento atual do Sporting, mas parece que também oferece umas bugigangas.

Uma camisola e comida, segundo o que veio a público.

Isso o lanche está sempre na cabina. No tempo de Sousa Cintra até lagosta havia. Champanhe, whisky, vinho do porto, cerveja, água das pedras, era um fartar de vilanagem.

Qual foi a oferta mais extravagante que lhe fizeram?

Foi a do senhor Bernard Tapie, em Marselha. Não aceitei, mas quis oferecer-me um Rolex em ouro. Fui a uma ourivesaria no Rossio e fiquei a saber que o relógio valia uns 2.500 contos. A minha regra era só aceitar o que tinha capacidade líquida para comprar.

Como interpreta o silêncio do FCPorto?

O FC Porto comporta-se sempre desta forma nas lutas entre Benfica e Sporting. Deixa-os andar à cabeçada, que nós vamos apanhar os cacos. Deixa-os pousar.

As acusações do ex-árbitro Marco Ferreira a Vítor Pereira, sobre supostas pressões sofridas antes de jogos do Benfica, ferem de morte o responsável pelas nomeações dos árbitros ou não são de valorizar?

Teriam todo o cabimento se tivesse dado conhecimento imediato ao Conselho de Disciplina. Mas deixou terminar a época, foi despromovido e só depois falou. Soa a desculpa de mau pagador e é a palavra de um contra a do outro. Não me custa admitir que as conversas tivessem acontecido, mas não acredito que tivessem sido explícitas. Digamos que não houve sexo explícito, quando muito foi platónico.

Há corrupção na arbitragem?

Não há no sentido material da palavra, embora se tivessem confirmado algumas situações execráveis. Agora que há corrupção moral e ética, através de lóbis, não tenho dúvidas nenhumas. E os lóbis têm sempre o objetivo de beneficiar ou prejudicar alguém.

rui.antunes@sol.pt