Cuidado com o botulismo na alimentação

Trata-se de uma intoxicação alimentar rara, mas potencialmente fatal. Curiosamente, o princípio do botóx, uma das mais famosas intervenções cosméticas, é precisamente o do botulismo.

Logo no final das férias de Verão, em setembro, o país entrou numa espécie de pânico alimentar, com o anúncio de que tinham sido detetados uns casos perigosos (vieram a revelar-se felizmente não mortais) de botulismo, por causa do consumo de umas alheiras da empresa denominada ‘Origem Transmontana’. Mais recentemente, a Direção Geral de Saúde comunicou terem-se registado em Lisboa mais três casos de botulismo, desta vez devido a um presunto artesanal, feito pela própria família dos doentes, no Fundão. Parece que também não se deu a tragédia de alguém chegar a morrer. Mas cuidado com o susto. Em setembro, um jornal chegou a titular ‘Pela sua saúde, não coma alheiras e fumados com a marca Origem Transmontana’. Claro que os transmontanos amuaram, e houve até quem se interrogasse sobre o motivo de uma empresa poder arvorar no seu nome (nesta caso publicamente maculado) toda uma região que vive de fazer e vender o mesmo tipo de produtos.

E o botulismo não é brincadeira nenhuma. Trata-se de uma intoxicação alimentar rara, mas potencialmente fatal. Há uma toxina, normalmente presente no solo, água não tratada ou em alimentos contaminados, que destrói as proteínas e provoca uma crescente paralisia muscular, que pode levar à morte. Lembro-me de uma vez a minha mulher perder o controlo muscular, e até a fala, ao meu lado, no carro, quando ia a caminho de Évora. Com uns amigos e o telemóvel, conseguimos que ao chegar lá, já nos esperassem no hospital, e lhe administrassem imediatamente um soro. Melhorou em algumas horas. Concluiu-se depois que fora uma toxina graças a Deus fraca, não só debelada com rapidez, mas até com um medicamento geral, e não um antídoto específico. Achámos também que tudo se deveria a uma excelente alheira, comida ao almoço, num bom restaurante entretanto fechado. A minha mulher nunca mais conseguiu ir a esse restaurante, nem voltou a comer alheiras.

Outro amigo teve o mesmo problema, também com uma alheira, num dos mais famosos restaurantes lisboetas.

Ocorre-me agora que, quando era miúdo, os mais velhos iam alegremente para mariscadas, recolhendo depois ao hospital com alguma intoxicação alimentar. Mas os que eu conhecia, nomeadamente os meus mais próximos, nunca deixaram de comer o que gostavam, por medo das terríveis intoxicações.

Claro que há povos com mais anticorpos. Recordo países do Norte de África, em que os alimentos estavam à venda no chão. Provavelmente são poucos os de lá que morrem com intoxicações alimentares. Mas a nós, os de fora, recomenda-se que só se coma em restaurantes ocidentais de luxo. Porque temos menos anticorpos e sucumbimos àqueles costumes com grande facilidade.

Curiosamente, o princípio do botóx, uma das mais famosas intervenções cosméticas, é precisamente o do botulismo. Injeta-se a toxina em pequenas e controladas doses, para provocar uma contração muscular, e eliminar temporariamente as rugas. Há pessoas que repetem sem fim este tipo de operações.

E agora mesmo, uma das mais famosas farmacêuticas americanas, que produz o popularíssimo Viagra, a Pfizer, anunciou uma OPA sobre a irlandesa Allergan, do Botox.