Pablo Iglesias sempre foi republicano dos quatro costados, o seu avô paterno, Manuel Iglesias, foi condenado à morte pelos franquistas em 1939, depois da guerra civil que opôs republicanos a monárquicos e fascistas. Foi salvo por milagre. Iglesias tinha que tomar uma decisão difícil no 31 de maio de 2007: para receber o prémio que lhe permitiria estudar em Cambridge era obrigado a ir a uma cerimónia em que teria de apertar a mão ao príncipe Filipe, herdeiro do trono de Espanha. Resolveu a questão com pragmatismo: foi, apertou rapidamente a mão do herdeiro, e não convidou o pai e a mãe para verem.

Pablo Iglesias Turríon nasceu em 1978, o ano da Constituição espanhola. O seu avô materno foi fundador da UGT, central sindical socialista espanhola, a sua mãe advogada das Comisiones Obreras, central sindical comunista. Aos 14 anos de idade aderiu às juventudes comunistas, de que saiu aos 21 anos. Tem uma licenciatura em Direito e outra em Ciência Política. A sua tese de doutoramento, de orientação nitidamente negrista, tem como título: “Multitude e ação coletiva pós-nacional: um estudo comparado dos desobedientes: de Itália a Madrid (2000-2005)”. A partir de 2006, vai trabalhar para a Fundação Centro dos Estudos Políticos y Sociales (CEPS), instituição que foi chamada a assessorar regimes de esquerda, nomeadamente na redação das novas constituições da Venezuela e Bolívia. Depressa a função da CEPS alarga-se para estudos de opinião e apoio a campanhas eleitorais. Entre os espanhóis presentes, vai-se encontrar o núcleo duro, todos professores da Complutense, que vai fazer o Podemos: Iglesias, Juan Carlos Monodero, Luis Alegre, Iñigo Errejón e Carolina Bescansa; juntamente com o histórico da Esquerda Unida Manolo Monoreo.

A experiência do populismo da América Latina, como forma de romper com o poder das oligarquias, vai influenciar muito este grupo. Iglesias vai evoluir das teses cosmopolitas do “Império” de Toni Negri, para as ideias da “Razão Populista”, de Ernesto Laclau e a sua defesa da construção de novas hegemonias, nacionais populares, que configurassem sujeitos de transformação. No regresso a Espanha, Pablo Iglesias aposta na criação de espaços alternativos de comunicação, como os debates da Tuerka, exibidos na televisão comunitária de Vallecas, bairro operário dos arredores de Madrid, onde habita. Começa a ser convidado para a Intereconomia, televisões de direita, e a partir daí para tertúlias das televisões generalistas. Iglésias e os seus amigos vão envolver-se nas movimentações do M15, a partir de 15 de maio de 2011, as praças das cidades de Espanha são tomadas por milhares de pessoas fartas de uma situação de desemprego generalizado e de corrupção da classe política.

Ainda assim, o PP de Rajoy vence as eleições com maioria absoluta de deputados e o melhor resultado de sempre: mais de 10,7 milhões de votos. Carolina Bescansa vai dizer: “percebemos que as fichas ganhas no casino dos movimentos sociais não tinham tradução no casino da política”. Perante a perceção dessa autonomia do político e um certo esgotar do M15, vários setores vão envolver-se na constituição de partidos, dos quais o Podemos. Nele confluem muitos setores políticos, grupos trotskistas como a Esquerda Anti-capitalista e o grupo de ativistas da Complutense. Iglesias é cabeça de lista e Errejón dirige a campanha. Tem uma decisão de génio, os estudos mostram que Iglesias tem 70% de notoriedade e o Podemos apenas 7%, mudam o símbolo para a cara de Iglesias. São a surpresa das Eleições Europeias de 2014, as sondagens não davam por eles, elegem cinco eurodeputados. Na conferência de imprensa da noite, Iglesias, surpreende tudo e todos, a dizer que foi derrotado. Vencer, para ele, é ganhar e conquistar o poder.

Depois de uma campanha eleitoral para as legislativas de amanhã, em que venceu todos os debates, Iglesias sonha estar mais perto do seu objetivo. Há uns meses, a 15 de abril, reencontrou-se com o agora rei de Espanha, Filipe VI, em Bruxelas. O republicano Iglesias ofereceu ao monarca a coleção de a “Guerra dos Tronos”, como forma de ilustrar as novas ruturas em Espanha: O inverno está a chegar.

Ilustração de Óscar Rocha