Namorada de jovem que morreu no São José escreve carta a contar tudo

A namorada de David Duarte, o jovem de 29 anos que perdeu a vida na madrugada de domingo para segunda, no Hospital de São José, porque a equipa médica que o poderia operar não trabalha ao fim de semana, escreveu uma carta a descrever tudo o que se passou.

Elodie Almeida, de 25 anos, divulgou-a no site do Expresso. E fez questão de explicar todos os pormenores.

 

“Na sexta-feira, dia 11 de dezembro, em pânico, liguei para o 112 por volta das 14h30. O David ficou paralisado do lado direito, sem conseguir formular frases. Tentava falar mas era incapaz, apenas conseguia gritar e chorar. A ambulância chegou, o David estava consciente e ciente daquilo que lhe pediam e perguntavam, porém, continuava sem conseguir expressar-se. Ajudaram-no a vestir-se e a calçar-se, colocando-o de seguida numa cadeira de rodas, visto que não tinha força na perna direita”, começa por escrever.

“Fui com eles na ambulância. O David chegou ao Hospital de Santarém e foi logo colocado em observação. Fizeram-lhe exames, enquanto aguardei”.

Só a deixaram vê-lo após “30 a 45 minutos” de espera. “O David dormia mas por vezes abria os olhos. Estava muito agitado. O médico acordou-o e pediu-lhe para levantar os braços e ele conseguiu levantar apenas o braço esquerdo. Pediu-lhe para levantar as pernas e ele conseguiu levantar a esquerda e, muito lentamente, levantou a direita. Estava consciente”.

A avó de David também estava no hospital por outros motivos. Ambas foram chamadas. “Anunciaram-nos, numa sala à parte, que o David tinha tido uma hemorragia cerebral e um grande hematoma e teria de ser transferido de urgência para o Hospital de São José, em Lisboa. Apenas tive tempo de lhe dar um beijo. Ele abriu os olhos e eu disse-lhe: “Eles vão cuidar de ti.” Foi de imediato transferido pelo INEM, penso que seriam cerca de 18h”, lê-se no site do Expresso.

O pai de Elodie veio de Coimbra para a ir buscar e levá-la até ao São José. “Chegámos por volta das 22h, penso eu. Pedimos informações, procurámos o edifício que nos referiram, porém estava fechado. Apareceu uma enfermeira, que gentilmente nos fez entrar e aguardar pela médica. Esperámos cerca de uma hora. No final, foram dois médicos que se reuniram connosco numa sala. Estávamos presente eu, o meu pai, Fernando, e a Sra. Zélia, mãe do David, que fomos buscar a Vila Chã de Ourique no caminho para o Hospital de São José”, descreve a jovem.

“Ali anunciaram-nos, descontraidamente, que se tratava da rutura de um aneurisma, que o sangue se espalhou pelo cérebro e que, geralmente, estes casos de urgência teriam de ser tratados de imediato, ou seja, o doente teria de ser logo operado. Mas como os médicos referiram, infelizmente calhou ser numa sexta-feira, logo não iria haver equipa de neurocirurgiões durante o fim de semana. O David teria de aguardar até segunda para ser operado. Deram-me a entender que o sangue espalhado pelo cérebro poderia, muito provavelmente, causar sequelas e posteriormente múltiplos AVC”, escreveu Elodie.

No sábado, dia 12, a jovem ficou em Coimbra, sabendo que a família mais próxima de David ia visitá-lo. Elodie afirma que ligou várias vezes para o hospital e que raramente a atendiam ou pediam para ligar mais tarde. “Pedi ao Sr. José, tio do David, para pedir informações junto às enfermeiras ou aos médicos, pois queria saber se existia a hipótese de o David ser transferido para outro hospital, de forma a ser operado o mais rapidamente possível. Pelo que entendi, a melhor opção era sem dúvida o Hospital São José e não seria apropriado transferi-lo”, explica.

Na carta, divulgada pelo Expresso, a jovem de 25 anos descreve algumas coisas que David conseguia fazer: “Nesse mesmo dia, a mãe do David referiu que ele abria os olhos, levantava os ombros e sentia frio nas pernas, tendo tido a iniciativa de se tapar com o lençol, apesar de as enfermeiras terem informado que não estaria consciente, que não iria reconhecer-nos e que estava demasiado confuso e perturbado. Visitei o David no domingo, dia 13, e ele estava em coma induzido”.

“Disseram-me que o caso se tinha agravado, que ele vomitou durante a noite, que começou a fazer demasiado esforço para respirar e que o coma induzido seria uma forma de ele não permanecer agitado e de o ajudar a respirar, de modo também a prepará-lo para a cirurgia de segunda-feira de manhã”, descreve.

Os médicos disseram-lhe que “a sorte dele era ser novo” e que “o grande problema era o sangue espalhado pelo cérebro, que poderia provocar sequelas e outras complicações”.

“Porém, algo bom aconteceu. Segundo o médico, criou-se um coágulo de sangue que permitiu “fechar” a veia, mantendo o sangue a circular dentro da mesma e permitindo que ele ficasse calmo e que a veia não voltasse a rebentar. A operação consistia na remoção do hematoma e desse coágulo, selando a veia através de um “clipe” e eliminado definitivamente o aneurisma”, escreve Elodie.

Outra médica confirmou ao pai da jovem que a operação “seria no dia seguinte de manhã” e que seria melhor aguardarem 48 horas antes de visitar o paciente.

“No dia seguinte, segunda-feira dia 14, liguei várias vezes, querendo saber como tinha corrido a operação. No momento em que atenderam, por volta das 14h30, disseram-me simplesmente que não tinha sido realizada e que seria melhor deslocar-me ao Hospital São José, sem acrescentarem mais informações. Eu própria tive de informar a mãe do David, visto que ninguém do hospital nos telefonou”.

“Mais uma vez, fomos de Coimbra até Vila Chã de Ourique buscar a mãe do David. Chegámos ao Hospital de São José e aí anunciaram-mos que o David tinha tido morte cerebral e que seria irreversível. Não me deram mais detalhes. Completaram esta grave notícia, anunciando que no mesmo dia ou no dia seguinte ele seria operado para a doação de alguns dos seus órgãos”, concluiu Elodie.