Mercados: Onde para o petróleo?

Abrandamento da China e excesso de oferta devem levar preço da matéria-prima para 20 dólares por barril. Só as tensões geopolíticas podem inverter a tendência.

O preço do petróleo tem vindo a atingir mínimos históricos nas últimas semanas, mas a tendência de desvalorização não deve ficar por aqui. A barreira dos 20 dólares por barril poderá estar para breve, na opinião de responsáveis do setor contactados pelo SOL.

A cotação da matéria-prima não tem parado de cair. Ontem negociou abaixo dos 30 dólares, o valor mais baixo desde 2003. Os receios do abrandamento económico na China, aliados a uma produção mundial que continua a estar acima do nível de consumo, são os fatores por detrás da desvalorização contínua.

O analista Ricardo Marques, da consultora IMF, alerta que «os preços tenderão a cair até que haja perspetivas de eliminação ou redução do expresso produzido diariamente».

Já para o gestor da corretora XTB Tiago da Costa Cardoso, é possível que a cotação atinja 27 dólares este ano. «Com menos atividade fabril, entramos num ciclo vicioso em que a procura de petróleo irá ser reduzida. Ora, isto aliado a uma produção previamente acertada pelos países da OPEP, leva-nos a criar uma alta expectativa de stocks, o que traz o preço naturalmente para baixo, e provavelmente a cair ainda mais», refere.

Subida a médio prazo

A desvalorização poderá até levar o barril de petróleo para os 20 dólares, mas a expectativa a médio e longo prazo é que seja retomado algum equilíbrio entre oferta e procura, com alguma subida de preços. Rui Mayer, sócio do escritório de advogados Cuatrecasas, lembra que este equilíbrio deverá ser «resultado do crescimento económico, sobretudo dos países mais industrializados, que em alguma medida é impulsionado pelos baixos preços da energia». Este advogado especializado no setor petrolífero antevê também «alguma redução de produção, sobretudo em regiões onde os custos são mais elevados, mas também resultante da redução do ritmo dos investimentos em exploração e desenvolvimento de reservas petrolíferas».

Pode até haver riscos internacionais a contribuir para uma subida de preços. O cenário pode alterar-se rapidamente se a situação no Médio Oriente mudar radicalmente e afetar a produção dos países daquela região. E há outras incógnitas geoestratégicas. «Se a situação de atrito diplomático que recentemente se criou entre o Irão e a Arábia Saudita escalar até ao nível de conflito militar aberto, será natural que as exportações daquela região sejam subitamente reduzidas, o que poderá impulsionar um aumento de preços mais rápido. A longo prazo, e salvo se vierem a constatar situações de catástrofe, a tendência deverá ser para o crescimento dos preços, refletindo a tendência para o reequilíbrio das tensões entre oferta e procura», prevê Rui Mayer.

Investimentos em queda

A desvalorização do preço do petróleo acaba por afetar o atual investimento das petrolíferas. Ricardo Marques lembra que esta situação não é inédita. «Já no ano passado se verificou uma redução do investimento, estando projetada outra redução com igual ou maior magnitude para este ano».

Tiago da Costa Cardoso lembra que já começaram a sentir-se esses problemas em algumas regiões, como Angola.

«Se os preços se reduzem a níveis que não permitem uma remuneração correta dos investimentos na pesquisa e produção, os investimentos nessas atividades reduzir-se-ão, o que deverá, a longo prazo, resultar na redução do ritmo de reposição de reservas – porque haverá menos descobertas – e de produção – porque as reservas provadas se irão esgotando», explica Rui Mayer.

Já em relação ao futuro do setor, os analistas acreditam que «não tem os dias contados», nas também aqui há riscos: a tendência normal será para que as reservas de petróleo sejam cada vez mais difíceis de descobrir, e mais caras de explorar.

Daí a necessidade de encontrar alternativas. Haverá uma tendência natural para que a sua substituição por processos de produção de energia mais eficientes do ponto de vista de relação custo-benefício. Rui Mayer lembra uma frase do antigo ministro dos petróleos da Arábia Saudita, Sheik Ahmen Yamani: «Assim como não foi por falta de pedras que a Idade da Pedra acabou, não será por falta de petróleo que a idade do petróleo irá acabar».

No entanto, Ricardo Marques aconselha a indústria a adaptar-se a novas realidades e, esta passa por apostar num consumo inferior à capacidade de instalada de produção assim como a preços baixos.

sonia.pinto@sol.pt