Investidores estrangeiros fecham crédito à banca portuguesa

Grandes fundos de investimento com perdas na solução do Novo Banco são dos principais financiadores da banca nacional e estão com reservas em ceder novos empréstimos. Blackrock avisa que Portugal é um mercado arriscado.

Investidores estrangeiros fecham crédito à banca portuguesa

Os bancos portugueses estão a enfrentar condições de financiamento mais difíceis nos mercados internacionais, desde a intervenção no Novo Banco. As perdas imputadas aos detentores de obrigações atingiram alguns dos principais financiadores das instituições financeiras no exterior, que estão com reservas face a novos empréstimos, segundo adiantaram ao SOL vários gestores de casas de investimento que operam no mercado de dívida. As dificuldades serão mais visíveis se houver necessidade de aumentos de capital.

No final do ano passado, depois de os testes de stress do BCE terem identificado insuficiências de capital no Novo Banco, o Banco de Portugal (BdP) decidiu recapitalizar a instituição através de uma transferência de obrigações para o BES, o banco ‘mau’ que ficou com os ativos mais problemáticos do antigo grupo de Ricardo Salgado. Ou seja, a responsabilidade de pagar essa dívida passou para um banco sem ativos suficientes para reembolsar, o que atingiu grandes  investidores internacionais que financiam a banca nacional através da compra de obrigações.

Entre eles estão a Blackrock, a maior sociedade financeira de gestão de ativos, com sede nos Estados Unidos, e a Pimco, outro grande fundo de investimento dos EUA. Segundo explicaram ao SOL fontes do sector bancário, estes fundos eram dos principais financiadores da banca nacional e estão agora com reservas face a bancos portugueses.

Scott Thiel, diretor-adjunto da Blackrock, deixou esta semana um aviso, numa entrevista à Bloomberg: «Com o que aconteceu em alguns bancos no país, os investidores ficaram cautelosos».

Risco acrescido

Nas salas de mercados das casas de investimento em Portugal, é reconhecido o efeito da decisão do Novo Banco. «Certamente que a decisão tomada [no Novo Banco] irá afetar a tomada de obrigações por parte dos fundos de investimento, já que perderam dinheiro com o financiamento às instituições por via das obrigações», explicou ao SOL Pedro Lino, presidente da Dif Brokers, uma sociedade financeira de corretagem e de gestão de carteiras.

O gestor acrescenta que a perda de financiamento se dá a outro nível: nos depósitos de clientes particulares afetados pela decisão. «Ao impor perdas a obrigacionistas não qualificados, muitos deles clientes das próprias instituições, encerra-se uma importante fonte de financiamento dos bancos. Esta decisão aumenta o risco para os detentores de ações, obrigações ou títulos representativos de capital ou dívida dos bancos».

Esta semana foi de grande agitação nos mercados financeiros internacionais, e não é fácil avaliar até que ponto as dificuldades se devem apenas à intervenção no Novo Banco ou a outros fatores de stress dos investidores – uma provável desaceleração económica à escala global está também a gerar preocupações nos mercados, tal como as políticas orçamentais do Governo português para 2016.

Segundo explicou ao SOL Filipe Silva, diretor da gestão de ativos do Banco Carregosa, no mercado secundário de obrigações, onde os grandes investidores internacionais transacionam títulos de dívida de empresas e Estados, há apenas uma linha de obrigações relevantes de bancos portugueses: pertence ao BCP e esta semana registou perdas na negociação.

Contudo, frisou o gestor, a semana que agora termina não é exemplo para se avaliar se a banca portuguesa está sob pressão, «porque todo o mercado  – e não só a banca –  está sob stress». Para Filipe Silva, «o grande teste à aversão dos investidores à banca portuguesa vai ser quando algum banco precisar de fazer um aumento de capital, saber onde o vai buscar».

Rating da DBRS é decisivo

A nível de financiamento de curto prazo, os bancos têm sempre uma solução de último recurso: ir buscar dinheiro ao Banco Central Europeu (BCE), como aconteceu nos momentos mais agitados da crise dos últimos anos. Mas há quem tema o que acontecerá em abril, quando a única agência de rating que mantém a dívida pública elegível para operações de financiamento do banco central fizer uma revisão da notação portuguesa.

Para pedir empréstimos ao BCE, os bancos têm de apresentar garantias sólidas – geralmente títulos de dívida pública com um nível de rating considerado adequado para investimento. A DBRS revê o rating de Portugal a 29 de abril.

As dificuldades de financiamento na banca de um país são  um dos cenários mais temidos pela generalidade dos economistas. Não só o financiamento da economia é posto em causa como a própria solidez das instituições diminui. Como os bancos precisam permanentemente de refinanciar dívida para pagarem outras dívidas mais antigas, a falta de financiamento tende a gerar riscos de incumprimento, que por vezes é agravado com as corridas aos depósitos no momento em que se sabe que há bancos em dificuldades.

joao.madeira@sol.pt