Veiga suspeito de ‘lavar’ 500 milhões

Tem relações privilegiadas no Congo e terá recebido nas suas contas milhões de euros sem justificação aparente. Também terá feito a ponte para negócios de portugueses em África.

José Veiga seria uma espécie de oficial de ligação para negócios ilegais entre o Congo e Portugal.

O empresário é suspeito de receber ‘luvas’ de um lado para garantir negócios em África a clientes portugueses – canalizando depois parte desse dinheiro para governantes congoleses – e também pagamentos ilegais para ‘lavar’ vários milhões de euros de altas individualidades daquela antiga colónia francesa. Segundo apurou a investigação, só desde 2010 passaram pelas suas contas 500 milhões de euros.

O antigo agente desportivo foi detido na quarta-feira e esteve três dias a ser ouvido pelo juiz de instrução Carlos Alexandre. O SOL_sabe que, no Tribunal Central de Instrução Criminal, José Vega foi confrontado, entre outros factos, com a avultada quantia de dinheiro vivo que a PJ encontrou numa casa de Cascais – um imóvel em nome de uma offshore, mas que o Ministério Público acredita pertencer, na realidade, ao empresário. Veiga, aliás, não tem  bens em seu nome em Portugal e deve ao Fisco cerca de dez milhões de euros.

O valor da dívida quase é equivalente à quantia de dinheiro encontrado numa espécie de bunker nessa moradia em Cascais: oito milhões de euros que se acredita pertencerem a altas figuras do Estado congolês, quando se sabe que Veiga (com dupla nacionalidade), passa largas temporadas no Congo desde 2009 e tem, de resto, residência fiscal naquele país.

Além da quantia em dinheiro vivo apreendida no esconderijo de Cascais, os investigadores arrestaram 11 milhões de euros que estavam numa conta bancária, dinheiro que serviria como garantia para a compra do Banco Internacional de Cabo Verde ao Novo Banco. O valor total do negócio seria de 14 milhões de euros.

Mas o património arrestado não fica por aqui. Terão ainda ficado à ordem do processo um Bentley, dois Porches e dois Mercedes – isto a somar aos 17 milhões apreendidos pelas autoridades aos arguidos.

Na investigação, foram constituídos 11 arguidos, ainda que só três estejam detidas: José Veiga, Paulo Santana Lopes e a advogada Maria de Jesus Barbosa.

Para a investigação, importa perceber por que razão, nos últimos seis anos, passaram milhões sem aparente justificação pelas contas de Veiga e de Paulo_Santana Lopes – o irmão do antigo primeiro-ministro, também ele detido na quarta-feira, suspeito de ser sócio do empresário.

Suspeitas envolvem Damásio

Segundo o SOL apurou, a investigação acredita que Paulo Santana Lopes terá tido um papel determinante no esquema, tendo disponibilizado as suas contas bancárias para que o dinheiro de origem duvidosa pudesse circular. Além disso, desempenharia uma função de prospeção de oportunidades para os negócios de José Veiga. No caso de Ana Barbosa, os investigadores estão a passar a pente fino todas as ligações que a advogada mantinha com os outros dois arguidos para perceber qual o seu papel na teia.

Ainda que não seja arguido no processo, o SOL sabe que Manuel Damásio é outra peça importante: o empresário e ex-presidente do Benfica é suspeito de ter tido intervenção no processo de lavagem de dinheiro dos governantes do Congo por meio da sua relação com José Veiga.

Em África, o esquema contava com a cooperação de altos dirigentes, incluindo a família do Presidente do Congo e o Presidente do Gabão.

Tal como o SOL avançou no final de 2014, numa reunião do clã Espírito Santo em que se discutia a entrada de Veiga como acionista de relevo na instituição, o empresário foi referido como tendo relações ao mais alto nível com responsáveis políticos daqueles países africanos.

Os crimes

Na chamada Operação Rota do Atlântico, estão a ser investigados indícios de corrupção no comércio internacional, branqueamento e fraude fiscal.

 Segundo a Procuradoria-geral da República, «estão também indiciadas suspeitas da prática dos crimes de tráfico de influência e de participação económica em negócio na compra e venda de ações de uma instituição financeira estrangeira, ações, essas, detidas por instituição de crédito nacional» (ou seja, o Banco Internacional de Cabo Verde). A PGR esclareceu ainda que também estão debaixo do olho dos investigadores a origem de diversos fundos movimentados em outros negócios em que são intervenientes os suspeitos, «nomeadamente a celebração de contratos de fornecimento de bens e serviços, obras públicas e venda de produtos petrolíferos».

carlos.santos@sol.pt e pedro.rainho@sol.pt