Quando é impossível acabar uma relação

António Costa queixa-se de Carlos Costa, mas segundo a Vanessa está metido no mesmo berbicacho que estavam os casais antes do 25 de Abril. Costa não pode divorciar-se de Costa. Estamos a assistir a uma espécie de “A Guerra das Rosas”, o filme.

E esteve muito frio. E nunca gostamos do frio, do calor, da chuva, etc. Se o resmunganço por causa do tempo fosse contabilizado em euros a favor do Estado, Portugal já tinha pago metade da dívida. Passamos a vida a queixar-nos do tempo. Claro que é uma queixa inofensiva até porque é um clássico que falar do tempo cumpre um papel essencial na comunicação entre os seres humanos. É dos melhores usos que tem a função fática da linguagem que é mais ou menos falar por falar. Se precisamos tanto de falar por falar – infelizmente para aqueles que adoram o silêncio, há muito mais gente a insistir no contrário – que falemos do tempo.

E esta semana esteve mesmo muito frio. Nada para o modelo do Norte da Europa, nada para o que se passa em Bruxelas ou Londres, mas imenso para a nossa tendência de achar que um vestido curto de manga também curta devia poder ser utilizado o ano inteiro. E que a porcaria das lãs picam, tirando a cachemira que é cara. E que mesmo que a roupa de Inverno não pique, enchouriça uma pessoa. E depois há os ares condicionados e é tudo um veste-despe cansativo.

Não sabemos viver com o Inverno. As imagens dos nova-iorquinos no Central Park com temperaturas mínimas aqui parecem retratos de Marte. Com tanto frio não se sai de casa. E toda a gente sabe que os holandeses, que andam de bicicleta no meio daquele gelo, são doidos. Metade do mundo que vive o Inverno normalmente é chalupa. Nós trememos de um frio misturada com raiva e com uma espécie de winter blues. Estou farta do frio e de ouvir pessoas queixarem-se do frio. Num país em que, por junto, nem há frio a sério 30 dias num ano, a queixa relativamente ao frio é uma queixa sobre como é difícil ser rico, num tempo em que toda a gente anda a pedir dinheiro emprestado.

Mas não há nada a fazer: nós queixamo-nos de todas as coisas contra as quais nada podemos fazer. E o tempo está ali mesmo à mão.

Estava eu a tentar convencer a Vanessa de que era perder tempo andar a dizer mal do tempo – e se pensarmos bem a chuva até tem graça – quando a Vanessa se lembrou das críticas violentas que António Costa fez ao governador do Banco de Portugal.

– Mas tu não achas que António Costa a dizer mal de Carlos Costa é como isso que andas a dizer sobre falar mal do tempo? Ele não pode fazer nada para o demitir, pois não?

– Pode, mas é difícil.

– Muito mas mesmo muito difícil?

– É preciso arranjar provas de “falha grave” e depois vai tudo ser discutido em Frankfurt.

A Vanessa estava subitamente interessada no conflito da semana que envolvia o primeiro-ministro e o governador do Banco de Portugal. Ou seja, há muito tempo que o primeiro-ministro acha que o governador do Banco de Portugal não serve para nada mas não o consegue pôr a andar. Esta semana tinha feito a mais violenta declaração de um primeiro-ministro contra o governador do seu banco central.

– Então é verdade que isto do António Costa andar a dizer mal do Carlos Costa é como andar a dizer mal do tempo. Não serve para nada?

– Serve para forçar o governador a demitir-se.

– Mas o governador quer demitir-se?

– Parece que não.

– É chato. Parece aqueles casamentos que havia antigamente, no tempo dos nossos pais, em que as pessoas não se podiam divorciar.

– É mais ou menos isso.

A Vanessa lembrou o que acontecia antes da lei do divórcio

– Era chato porque se massacravam todos os dias.

A “guerra dos Rosas” de Costa e Costa está para durar.

ana.lopes@ionline.pt