Grim Sleeper, um serial killer sem sono

Passaram-me mais de três décadas desde o verão de 1985, em que Lonnie David Franklin Jr., mais conhecido por Grim Sleeper, fez a sua primeira vítima. As mortes continuaram, parando apenas, aparentemente, três anos mais tarde. O assassino, cuja identidade não era então ainda conhecida, ‘adormeceu’ entre 1988 e 2002, ano em que voltaria a…

Grim Sleeper, um serial killer sem sono

Debra Jackson, uma empregada de mesa baleada três vezes no peito, foi a primeira vítima do assassino em série. A última, Janecia Peters, viria a ser descoberta num aterro a 1 de janeiro de 2007 – uma forma macabra de começar o ano. A polícia deteve o presumível autor dos crimes três anos mais tarde, em 2010, após de terem sido encontrados vestígios do seu ADN próximos dos cadáveres. Oprocedimento varia pouco: os corpos das vítimas – na sua maioria mulheres de raça negra ligadas à droga ou à prostituição – eram despejados em becos e contentores de lixo no sul de Los Angeles. Uma escolha que, de resto, não constituiu surpresa para a Polícia: afinal Lonnie trabalhava como profissional de recolha de lixo. A maioria das vítimas tinha sido estrangulada ou baleada e muitas delas apresentavam sinais de violação. Todas se encontravam cobertas de detritos e praticamente nuas.

O julgamento do caso que apaixonou e aterrorizou a comunidade do sul de Los Angeles começou na passada terça-feira. Lonnie Franklin Jr. declarou-se inocente e, de acordo com essa posição, não mostrou qualquer arrependimento. Mas os indícios que o incriminam são fortes. A prisão do filho do suspeito por posse de drogas e armas ilegais, forneceu a primeira pista: as amostras de ADN recolhidas do jovem revelaram batiam certo com os vestígios recolhidos nos locais dos crimes. Posteriormente, uma sobrevivente testemunhou em tribunal contra Franklin Jr. No final do julgamento, que pode durar até dois meses, os procuradores vão pedir pena de morte pelo homicídio de nove mulheres e uma rapariga de 15 anos.

As críticas

Mas não é só o suspeito que está sob fogo. A decisão da Polícia de manter os casos escondidos na gaveta também indignou a população, que falou de desrespeito para com as vítimas e de ameaça à segurança da comunidade.

Apesar do secretismo, o caso acabaria por despertar o interesse de um cineasta britânico. No documentário “Tales of the Grim Sleeper” (Contos do Cruel Adormecido) Nick Broomfield desenvolve a teoria de que o homicida esteve sempre acordado, ou seja, não houve qualquer pausa nas mortes, e que as vítimas ascendem a mais de 180. Muito crítico, o cineasta visou a polícia e a comunicação social: “Estava a acontecer um genocídio e ninguém o noticiava”. Broomfield, que acaba de realizar um documentário polémico sobre o vocalista dos Nirvana, Kurt Cobain, foi ainda mais longe, ao afirmar que se a polícia tivesse feito corretamente o seu trabalho podiam ter sido salvas várias vidas. “As pessoas não sabiam que estava alguém a caçá-las”. O facto de as vítimas serem marginais teria estado na origem do desinteresse pelas suas vidas. “Elas eram vistas como pessoas descartáveis. A própria Polícia usava esse termo, NHE, que significa Nenhum Humano Envolvido. Por isso não procuravam provas. Com alguma frequência, nem sequer usavam o nome verdadeiro da prostituta, apenas a registavam como ‘Jane Doe’”, expressão usada para indicar uma pessoa com identidade desconhecida.

Broomfield foi à zona dos crimes e encontrou-se com amigos do assassino e familiares das vítimas. O seu trabalho valeu-lhe uma nomeação para o Óscar de melhor documentário em 2014. Em breve saberá se foi feita ou não justiça.