Este ano já não há crise…

À direita havia muito quem vaticinasse o fim da geringonça ao fim de pouco tempo. Mas a aliança de esquerda que apoia o Governo tem dado sinais de solidez e uma crise política parece fora do horizonte mais próximo. Ainda há quem no PSD acredite que a queda do Governo pode estar ao virar das…

O aliado em Belém

Mesmo que a aliança possa não ser eterna, a cooperação institucional entre Belém e São Bento está a passar por uma fase de alta. O Presidente tinha dito durante a campanha que queria evitar crises políticas e é esse o guião que está a cumprir.

Marcelo tem ajudado na frente interna, mas também na externa. Mostrou apoio a António Costa na forma como o primeiro-ministro geriu o dossiê da banca, apoiando a entrada de capital angolano no BCP em troca da saída do BPI. E tem ajudado, através de Jean-Claude Juncker com quem tem uma relação próxima, a criar um clima favorável em Bruxelas em vésperas da entrega do Programa de Estabilidade e Crescimento e do Plano Nacional de Reformas.

Dentro deste espírito, Marcelo convidou também o presidente do Banco Central Europeu, Mário Draghi para estar naquele que será o seu primeiro conselho de Estado como Presidente, no dia 7 de abril.

“Nenhum Presidente da República passa cheques em branco mas também nenhum Presidente da República deve ter preconceitos”, disse na passada quarta-feira Marcelo, marcando a tónica do que serão os seus primeiros meses em Belém.

A força da geringonça

O Orçamento do Estado para 2016 foi uma prova de fogo que a geringonça passou com distinção. António Costa e os parceiros de esquerda mostraram que concordam no que deixaram por escrito nos acordos políticos e discordam naquilo que os separa sem que isso ponha em causa o apoio parlamentar ao Governo.

O próximo passo é o arranque dos grupos de trabalho para preparar o Orçamento de 2017 ao mesmo tempo que o Governo prepara o Plano de Estabilidade e Crescimento e o Programa Nacional de Reformas. É natural que haja divergências, mas ninguém à esquerda espera grandes turbulências.

E há ainda um cimento que dá força a esta união à esquerda: nem BE nem PCP querem ficar com o ónus de deixar cair o Governo para abrir espaço ao regresso de uma maioria de direita.

Bons ventos da Europa

O calendário político de António Costa tem um sinal vermelho marcado no dia 30 de abril. Nessa altura, terá entregar o Plano de Estabilidade e Crescimento e o Programa Nacional de Reformas, documentos que terão de ser avaliados por Bruxelas.

Mas os ventos estão mais favoráveis na Europa este ano. A Comissão Europeia já deu sinais públicos de estar aberta a “políticas mais amigas do crescimento”, depois da avaliação feita aos efeitos dos programas de ajustamento nos países sob ajuda financeira. E isso pode ajudar Costa que pretende aproveitar também a iniciativa que espera que venha de Itália para renegociar a dívida. Este é um clima muito mais favorável do que o do ano passado até porque, nesta altura, a Europa deve querer evitar novas crises.

Sondagens

Três meses depois de formar Governo, o PS começou a descolar do PSD. Foi isso que mostrou o último barómetro da Eurosondagem para o Expresso e a SIC, que dava aos socialistas 35% das intenções de votos e aos sociais-democratas apenas 32%. A diferença é ténue ainda, mas é lida como uma tendência que pode vir a reforçar-se e aconselha a cautela do lado da oposição.

Durante algum tempo, Passos Coelho estava convencido de que poderia desencadear uma crise política para derrubar o Governo e clarificar o resultado das eleições. Agora, esse jogo parece mais difícil de fazer porque as sondagens mostram que o risco de ficar tudo na mesma depois de eleições é demasiado elevado.

A forma como António Costa chegou ao poder fez com que, quer à esquerda quer à direita, os eleitores percebessem que pode não valer apena aplicar a lógica do voto útil na hora de ir às urnas. E isso faz com que haja mais gente a votar em opções para lá do PS e do PSD, tornando muito mais imprevisíveis os resultados eleitorais e muito menos desejável uma crise política que poderia não clarificar nada.

Mudanças à direita

Assunção Cristas é um dado novo na política nacional. Apoiada no discurso do fim do voto útil, quer fazer o CDS crescer e isso será feito sobretudo à custa do PSD que, com o mesmo líder, mostra dificuldade em se reinventar. Está por provar se o caminho da nova líder dos centristas será eficaz, mas é mais um elemento a aconselhar cautela no desencadear de uma crise política por tornar ainda mais imprevisível o seu desfecho.

Ainda assim, há uma coisa que não parece que vá mudar: PSD e CDS continuam a ser parceiros naturais para chegar ao poder, mesmo que o PS tenha começado nas últimas semanas a elogiar Cristas para deixar isolado Passos Coelho.