Relação não vê um único erro na condenação de Duarte Lima

O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou ontem a condenação de Duarte Lima por burla agravada e branqueamento de capitais no âmbito do processo BPN/Homeland. Os desembargadores Rui Rangel (relator), Francisco Caramelo e Trigo Mesquita decidiram por unanimidade que não houve erros no julgamento do ex-deputado do PSD, argumentando que o coletivo da 7.ª Vara…

Relação não vê um único erro na condenação de Duarte Lima

A única alteração face à decisão de 2014 foi a redução da pena a todos os condenados, incluindo a de Duarte Lima – de 10 anos de prisão para seis. O seu sócio, Vítor Raposo, terá de cumprir quatro anos de prisão, em vez dos seis a que tinha sido condenado em primeira instância.

Juristas contactados pelo SOL afirmam que os arguidos não podem recorrer desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, uma vez que as penas são inferiores a oito anos de prisão – mas poderão sempre tentar uma argumentação contrária.

Penas ‘manifestamente exageradas’

No acórdão do Tribunal da Relação, a que o SOL teve acesso, pode ler-se que «o julgador [a primeira instância] seguiu um processo lógico e racional na formação da sua convicção, desta não resultando uma decisão ilógica, arbitrária, contraditória ou claramente violadora das regras da experiência comum»  

Os desembargadores acusam mesmo os arguidos de inventarem interpretações para discordar do acórdão de primeira instância: «A quantidade de vícios ficcionados que os recorrentes viram no acórdão recorrido não passa de uma forma encapotada para discordarem da valorização probatória feita pelo tribunal recorrido».

Os desembargadores dão assim como provado que «os arguidos Vítor Raposo e Domingos Duarte Lima criaram nos responsáveis da Imofundos e do BPN a convicção errónea de que o valor de aquisição dos terrenos [em Oeiras] era de 22,8 milhões, quando na realidade foi de 5 milhões de euros, conseguindo, dessa forma, autofinanciarem-se e obterem proveitos próprios». Tudo isto beneficiando do «clima de promiscuidade que se vivia no BPN», à data liderado por Oliveira e Costa.

Ainda que afirmem diversas vezes que «nada mais poderia ser exigido ao julgador», e lembrem que o coletivo da 7.ª Vara «foi exaustivo na apreciação da prova e na sua fundamentação», os desembargadores admitem que foi exagerada a pena aplicada a Duarte Lima e a Vítor Raposo. «São manifestamente exageradas e desproporcionais no que concerne, em particular, ao arguido Domingos Duarte Lima. E exagerada no que concerne ao arguido Vítor Raposo», dizem, esclarecendo que «ultrapassam a culpa dos recorrentes, violando o princípio da proporcionalidade das penas e não satisfazem os interesses da prevenção geral e especial».

Por estes motivos, os juízes desembargadores reduzem a pena aplicada ao ex-líder da bancada parlamentar do PSD para seis anos, a do seu sócio para quatro anos e a de Francisco Canas (também conhecido como ‘Zé das Medalhas’, arguido no processo Monte Branco), para três anos. Tudo penas de prisão efetiva. 

Já os advogados João e Pedro Almeida e Paiva viram as penas serem reduzidas para dois anos e seis meses e dois anos, respetivamente – podendo ser suspensas mediante pagamento de donativos de 15 mil e 10 mil euros ao Instituto Português de Oncologia.

Duarte Lima e Vítor Raposo terão ainda de devolver ao BPN (ou seja, o Estado, que ficou com os processos e ativos tóxicos) o valor em que este foi prejudicado: 17,8 milhões de euros. 
 
A burla ao BPN

Todo este caso gira em torno de um fundo imobiliário, o Homeland. Foi constituído em 2007 para a aquisição de terrenos em Oeiras «com grande expectativa de valorização em futuro próximo» e era detido em 85% (8,5 milhões de euros) por Pedro Lima (filho do ex-deputado do PSD) e Vítor Raposo, e ainda em 15% pelo Fundo de Pensões do BPN.

Porém, a compra das unidades participativas dos dois arguidos foi também ela suportada por créditos contraídos junto do BPN – facilidades concedidas pela gestão de Oliveira e Costa, à data presidente do banco.

Tanto Pedro Lima como Raposo terão pago estes empréstimos, ou seja, 8,5 milhões no total, com recurso a contas a descoberto no BPN. Isto é, ainda que o banco só detivesse 15%, entrou com o total do capital para a criação do fundo.

Além disso, o pagamento dos descobertos foi feito, não com dinheiro dos próprios, como deveria ser, mas com dinheiro do BPN. Isto porque, depois de criado o fundo Homeland, os arguidos pediram 22 milhões de euros para a compra dos terrenos de Oeiras que, na verdade, tinham adquirido por 5 milhões. Foi com o remanescente (17 milhões de euros) que foram pagos os 8,5 milhões de euros em dívida ao BPN. 

Sobraram ainda 8,5 milhões de euros que não regressaram ao fundo e foram parar às contas dos arguidos. Parte do montante serviu para pagar contrapartidas aos advogados dos herdeiros dos terrenos da família Neta Franco – os arguidos João e Pedro Almeida e Paiva, também condenados. No total, tais contrapartidas ascenderam a 620 mil euros.

Além dos 22 milhões de euros usados para comprar o conjunto de sete terrenos da família Neta Franco, outras 27 frações foram também compradas pelo fundo por 25 milhões à família Canas – o que significa que o banco pagou um total de 47 milhões de euros quando, na prática, a totalidade dos terrenos comprados às duas famílias custou 30 milhões aos arguidos.

O coletivo da primeira instância considerou, por isso, que se tratou de um «negócio calamitoso» para o BPN.