Ir à bola com o Passos Coelho

O que vou dizer vai chocar muita gente. Mas ninguém me tira da ideia que ir a um congresso partidário se assemelha bastante a ir a um jogo de futebol.

Ninguém no seu perfeito juízo pode pretender que os congressos de hoje tenham o mesmo significado de há vinte anos. Mudou tudo.

Antigamente, e até ao aparecimento dos canais informativos por cabo, a política na televisão entrava na casa das pessoas apenas à hora do telejornal. Das oito da manhã às oito da noite não havia política. Atualmente, com vários canais informativos a emitirem 24 horas por dia, a política está sempre a passar na televisão. Com a net, nem precisamos da TV, basta-nos um telemóvel.

Sejamos sérios. Um congresso não eletivo é um jogo a feijões. Não se vai lá decidir nada. As centenas de militantes do PSD do norte ao sul e ilhas, as bases, encontraram-se para um momento de celebração que acontece de dois em dois anos. Um momento emocional, de convívio, de debate, de confronto, de claques, de alguns ídolos.

Basta constatar o que acontece sempre a partir do meio da tarde de sábado, o segundo dia do congresso. Mal se anunciam os nomes mais sonantes, o recinto fica à pinha para os ouvir.

É que o militante, por mais simples que seja, percebe de política como o aficionado percebe de bola. Não sabe fazer um discurso, mas sabe muito bem ver quem os sabe fazer. Um aficionado não sabe fazer um drible, mas paga bilhete para ver um médio habilidoso.

Foi por isso que neste congresso se fez silêncio entendido para ouvir o José Eduardo Martins, que se vem assumindo como crítico da atual liderança; se fez silêncio para ouvir o Pedro Duarte, que também tem tecido algumas críticas; e para Paulo Rangel, por ter fama e proveito de fazer bons discursos. Guardou-se uma ovação para o «keep cool» de Pedro Santana Lopes a respeito das autárquicas.

De modo que há um certo respeito. Respeito por quem sobe ao palanque, controla os nervos, o frio na barriga, o tremor nos joelhos, o embargo na voz e debita um discurso bem dito e com substância. É um teste. Não é para todos. É muito mais fácil sentarmo-nos num estúdio de TV a falar do que subir ao palanque e enfrentar a multidão, olhos nos olhos.

Se há coisa para que ainda serve um congresso, é para lançar futuros líderes. Desse ponto de vista, se Rui Rio tem a ambição de liderar o PSD no futuro, fez mal em não ir. Perdeu um momento de afirmação. Há muitos momentos de calculismo no congresso do PSD ou de outro partido qualquer. Mas também há momentos de profunda honestidade.

Aquelas centenas de pessoas percebem de política. Sabem muito bem quando têm à sua frente alguém com estofo de campeão, de líder. Passos Coelho teve a sua pior votação para o Conselho Nacional quando indicou Miguel Relvas em primeiro lugar. E teve a pior votação para a Comissão Política agora, quando indicou a ex-ministra Maria Luís Albuquerque.

Pelos vistos, os militantes não hesitam em sacar do cartão amarelo quando é preciso…

sofia.rocha@sol.pt