Estamos bem: os Radiohead sabem onde vivemos

Saber fazer, sobretudo isso. E se há craques nesta dança estridente que é o mercado discográfico são os Radiohead. Alergia ou gaguez, vamos mais para a primeira, os ingleses recusam-se a pronunciar a frase: «Vamos editar um novo disco, malta!» Troquemos isso então por uma súbita fuga da internet, qual Twitter: qual Facebook, quais Radiohead,…

Estamos bem: os Radiohead sabem onde vivemos

Se no domingo os Radiohead só existiam pela memória dos seus milhões de fãs – feitos baratas tontas a jogar à futurologia em fóruns nerds e especializados – e pelos seus vídeos no YouTube, um dia depois faziam questão de nos relembrar que ao domingo é dia de família, que todos podemos – devemos, ou, pelo menos, devemos desejar – sumir. E claro que segunda às 10h já lá estamos todos e que os Radiohead não só existem como têm novo tema, ‘Burn the Witch’, que até deu direito a teledisco. Isto tudo não sem antes fazerem das suas, como lançarem um pequeno teaser na sua nova vida – que mais não é que a mesma mas com uma imagem diferente – na internet. Mais: enviaram para alguns fãs um pequeno postal – ver fotografia ao lado – onde se podia ler: «Sing the song of sixpence that goes/Burn the Witch/We know where you live». Queimar a bruxa como forma de precipitar o misticismo, piscadela de olho que serviu para preparar os ouvidos para o que aí vinha. E com single cá fora – e depois de Brian Message, agente da banda, em abril ter dito que talvez fosse junho o mês desse tão aguardado nono disco – torna-se mesmo pouco provável que este seja um caso isolado. ‘Burn the Witch’ deveria mesmo ser o single de avanço para o sucessor de King of Limbs. E era. Mas não veio sozinho. Três dias depois era apresentado mais um single – ‘Daydreaming’ – e com ele a confirmação desejada: «Taken from our album released digitally on Sunday May 8th at 7pm BST». Assim, sem rodeios ou fogos de artifício.

Inquietos e provocadores

Tal como o teledisco de ‘Daydreaming’, realizado por Paul Thomas Anderson, também o do primeiro single deste novo trabalho da banda de Oxfordshire traz a sua picada. Com inspiração na série britânica dos anos 60 Trumpton, a produção realizada pelo colaborador de longa data Chris Hopewell – que já havia feito ‘There There’ a meias com a animadora Virpi Kettu, que também volta a estar presente – e com a ajuda de Stanley Donwood – responsável por grande parte das capas do conjunto – recorre à técnica cinematográfica stop-motion, uma espécie de animação mas com bonecos que parecem feitos de plasticina, com um ritmo meio trôpego.

Kettu passou 14 dias sem dormir, porque quando o telefone toca e os Radiohead pedem pouco mais há a fazer do que reforçar o stock de café e de bebidas energéticas. A animadora inglesa falou à Billboard sobre o conceito do filme, que mostra uma vila supostamente perfeita onde uma série de eventos macabros acaba com os populares a incendiarem uma figura gigante de madeira, a mesma do filme The Wicker Man (1973). «Eles queriam que o vídeo contrastasse com o que estão a tocar e acordar as pessoas um bocado», sugerindo que o disco que aí vem é algo obscuro. Em seguida acrescentava que, na sua opinião, o vídeo pretende ser um abre-olhos no que à crise de refugiados diz respeito, sobretudo a chama final: «A acusação de diferentes pessoas, a acusação dos muçulmanos e da negatividade» pode levar a sentimentos daquele género. O mesmo se aplica à frase «we know where you live» que Vettu acredita que seja uma indireta para o jogo de culpas entre os países anti-imigração e a União Europeia.

Novas empresas = novo disco

Recuemos a 2007 e a 2011. Nas vésperas de In Rainbows e de The King of Limbs, estes cinco senhores registaram novas empresas no mercado. Mania que repetiram em janeiro e fevereiro – aí deu-se o real alerta para os fanáticos – com as novas empresas Dawn Chorus LLP e Dawnnchorusss Ltd, respetivamente.

Os sinais repetem-se. Aliás, mesmo esta forma inovadora de agitar o mercado não é novidade absoluta para Thom Yorke, Ed O’Brian, Philip Selway, Jonny e Colin Greenwood. Em outubro de 2007 perderam o amor ao dinheiro – não é que tenham ficado pobres depois disto, ou mesmo antes – e lançaram, por sua conta, In Rainbows através do modelo pague-o-que-quiser, mas o que quiser mesmo, o que significa que qualquer um podia descarregar o disco a custo zero. Não repetiram a façanha, mas a verdade é que só as pré-vendas desse disco renderam mais que a totalidade de Hail to the Thief (2003). Prova de que a sua saída da EMI não lhes fez mal nenhum, In Rainbows foi o vinil mais vendido de 2008 e, segundo a Wired, rendeu-lhes 3 milhões «instantâneos». Números à parte, os Radiohead tocam dia 8 de julho no NOS Alive. Esperemos ter tempo para decorar as novas letras.