Fernanda Câncio defende-se da Operação Marquês. Não sabia, não viu e não beneficiou

     

A jornalista e ex-namorada de José Sócrates Fernanda Câncio garante que muitos dos esquemas investigados na Operação Marquês, como o das entregas de dinheiro vivo, lhe passaram ao lado. 

Num texto explosivo (e de várias páginas) publicado pela Visão, a ex-namorada de Sócrates assegura também que sempre pensou que a casa de Paris fosse alugada pelo ex-primeiro-ministro a franceses, adiantando nunca ter tido conhecimento de que o proprietário formal fosse Carlos Santos Silva. Diz que o seu envolvimento em notícias sobre a Operação Marquês não passa de uma “tentativa de destruir a [sua] reputação pessoal e profissional”.

“Se fizesse ideia da relação pecuniária entre Santos Silva e Sócrates teria feito perguntas por considerar a situação, no mínimo, eticamente reprovável”, afirma.

Segundo refere no artigo “há uma série de factos que foram revelados e assumidos por José Sócrates e Carlos Santos Silva depois de novembro de 2014 dos quais […] não fazia a mínima ideia”.

O choque da detenção

A também jornalista do Diário de Notícias, explica que a detenção de Sócrates e Carlos Santos Silva em novembro de 2014 a apanhou de surpresa. “Foi um enorme choque para mim. Não apenas porque não via motivos para esta ocorrer, mas também porque só soubera da possível existência de uma investigação através da revista Sábado, em agosto de 2014”.

A casa de Paris

“Foi pela Sábado que soube ser Carlos Santos Silva o proprietário de um apartamento em Paris que José Sócrates usara. Até então estava convicta de que tal apartamento, que nunca vi e que pensava ser o segundo no qual José Sócrates teria vivido naquela cidade, tinha sido arrendado a proprietários franceses”, refere, concluindo que manifestou até a sua surpresa a José Sócrates por tal facto num telefonema “que está decerto nas escutas”.

As férias pagas por Sócrates e os empréstimos

No texto publicado na Visão, a ex-namorada de Sócrates explica também que nunca teve conhecimento de que as férias que passou com Sócrates foram na verdade pagas com dinheiro proveniente de Santos Silva. Câncio diz também nunca ter visto motivos “para suspeitar de que quem [a] convidava não assumia […] a despesa”.

Além dessa explicação, avança ainda que nunca pediu ou recebeu quantias em dinheiro de José Sócrates, fosse a que título fosse. “É uma calúnia que publicações e o canal do Grupo Cofina, assim como o SOL, refiram ou sugiram sistematicamente que estou incluída num ‘grupo de mulheres’ que seriam ‘sustentadas’ por José Sócrates e Carlos Santos Silva”.

O esquema do livro

Este é outro dos pontos a que Câncio dá ênfase no seu texto. Diz que foi surpreendida com a notícia de que terá sido montado um esquema para a compra massiva do livro de José Sócrates e chega mesmo a dizer que não comprou nem um exemplar.

As notícias sobre si

Câncio critica de forma muito dura as acusações que lhe foram feitas pelo Correio da Manhã, mas sobretudo o pedido feito por dois jornalistas daquele jornal que são assistentes no processo para a constituir arguida. Um requerimento cuja consulta lhe foi negada: “O país saber do requerimento do Correio da Manhã por via de quem o fez e publicitou não viola o segredo, eu conhecê-lo para me defender, já viola. Mas, porque, eu  ao contrário do Correio da Manhã, respeito a verdade e, ao contrário do MP, não me refugio em fórmulas sonsas, e porque é óbvio que neste momento quem quiser tem acesso ao processo – está em todas as redações do país -, assumo que já o li”.

Diz ainda que nada do que fora invocado pelo Correio da Manhã e que agora conhece resulta em qualquer forte indício do seu envolvimento.

A conversa com o inspetor tributário

Câncio lembra mesmo no artigo da Visão uma conversa que teve com o inspetor tributário Paulo Silva após ser ouvida como testemunha no final do ano passado. Disse que questionou Paulo Silva e a procuradora Ana Catalão sobre se existia referências no processo a imputações que lhe tinham sido feitas em notícias do Correio da Manhã. Segundo agora revela, o inspetor tributário ter-lhe-á respondido: “Isso não está no processo”. A ex-namorada de Sócrates assegura ainda que o mesmo investigador lhe terá dito que o problema de tudo isto estava na lei, que permite a constituição de jornalistas como assistentes.

Sobre as fundadas suspeitas, adianta também que não é por ter dito a Sócrates numa SMS que este tinha “muita massa” e “uma casa em Paris” que se pode supor que tinha conhecimento do esquema. Defende que a referência à “massa” era a informação que tinha e que até já tinha sido publicada de que o ex-primeiro-ministro tinha uma fortuna de família.

E com base nisso e em bens de Sócrates como o apartamento da Rua Castilho, justifica que não era nada de extraordinário ter falado por telefone com o ex-namorado sobre a possibilidade de compra de um apartamento no Caldas, com um preço de 2,2 milhões de euros.

Não sabia de nada

A terminar diz-se completamente descrente na justiça, uma das razões por que decidiu escrever o artigo. Criticando o MP e os media (que diz nunca a terem contactado para uma entrevista) afirma que “é natural que haja gente bem-intencionada e séria que se questiona sobre como poderia […] não saber” de tudo o que se passava. Garante que não e que não é a única do círculo próximo a ter ficado surpreendida com tudo o que foi revelado nos últimos meses.