Ribeiro e Castro: ‘Não esperava que PSD e CDS se juntassem à geringonça’

Ribeiro e Castro critica duramente Passos e Portas por terem ajudado a aprovar as barrigas de aluguer e a PMA. «Estamos perante uma fraude e uma deslealdade com o eleitorado».

Ribeiro e Castro: ‘Não esperava que PSD e CDS se juntassem à geringonça’

Ficou desiludido com a posição assumida pelos partidos de direita na discussão sobre as chamadas barrigas de aluguer e a Procriação Medicamente Assistida (PMA)? 

Creio que para os eleitores da PàF foi uma enorme surpresa negativa e um grande desapontamento. Não esperava que a PàF se juntasse à gerigonça para aprovar uma legislação bastante radical. Acho muito negativo o comportamento dos líderes. Acho muito negativo que Pedro Passos Coelho tenha votado a favor de uma das leis e que Paulo Portas faltasse à votação das duas. Contribuiu, com a sua ausência, para a aprovação das duas leis.

O PSD deu indicação aos deputados para votarem contra…

Isso então ainda é mais paradoxal. É uma coisa que ninguém percebe. Não se consegue entender. Até porque há sempre uma grande confusão com estas chamadas matérias de consciência. Em minha opinião tudo é matéria de consciência. Os impostos são matéria de consciência. Acho bizarro, como também acho bizarro que o ex-presidente do CDS não se sentisse obrigado a estar presente na votação.

Tem alguma expectativa sobre a posição do Presidente da República? 

Não. Eu não faço isso. Não vou por pressão. O Presidente da República tem formação suficiente para avaliar e decidir e, sobretudo, não dou para o peditório daqueles que querem isentar de responsabilidades os dois partidos da PàF e desviar a pressão para o Presidente da República. Isso não faço. Sou muito crítico do comportamento do ex-líder do CDS e do presidente do PSD até porque isto cria uma situação muito difícil ao Presidente da República. Creio que o comportamento de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas cria uma situação muito difícil para o Presidente da República.

Porquê?

Não nos podemos esquecer aquilo que foi o comportamento desde dois partidos e dos dois líderes quando Cavaco Silva vetou leis anteriores já nesta legislatura. Sabemos que Cavaco Silva o fez, nomeadamente contra a adoção de crianças por casais homossexuais, e o Presidente foi deixado completamente sozinho. Isso não pode ser escondido, não pode ser escamoteado. É um problema muito sério que os dois líderes têm que discutir e avaliar seriamente.

Qual é a sua opinião sobre a procriação medicamente assistida? 

A PMA é um tratamento da infertilidade. É uma resposta clínica a uma situação clínica de infertilidade e é uma ajuda a um casal para que consiga ter filhos que,  por razões de infertilidade ou do pai ou da mãe, não consegue ter. Vamos ter, no fundo, uma geração de crianças sem pai.

Também não concorda com a gestação de substituição (barriga de aluguer). 

A questão principal não é o aluguer ou não aluguer. A questão principal é a cisão da maternidade relativamente à gestação e à gravidez. É uma questão ética muito complexa e muito sensível. Creio que não se devia abrir essa porta, porque, aberta essa porta, virá tudo o resto. A questão principal é, como sempre foi, desde o direito romano, que mãe é aquela que gera e dá à luz o filho. Mãe é aquela que tem o parto, é aquela que dá à luz e esse princípio fundamental da natureza não deve ser atropelado.

Acha que há uma tendência da direita para aderir às chamadas causas fraturantes?

Eu não me identifico com essa questão da direita. As minhas posições são centristas e personalistas. Creio que há é uma questão de completa deslealdade com o eleitorado, deplorável e altamente censurável. É mais um dos sinais da profunda crise do nosso sistema político e da completa falta de respeito pelo eleitor. O que era interessante era que Paulo Portas e Passos Coelho dissessem essas coisas antes das eleições. Devem dizer essas coisas na campanha eleitoral para que as pessoas não comprem gato por lebre. Acho muito bem que assumam as posições que entendam, mas têm a obrigação de o dizerem, porque esta é uma democracia representativa.

E não o fizeram?

Estamos perante uma fraude. Estamos perante uma fraude clara, porque antes do dia 4 de Outubro ninguém acreditaria que estas leis iriam ser aprovadas em Portugal com parte relevante, do ponto de vista político, do PSD e também com a ajuda do CDS. Ninguém acreditaria que estes partidos iriam ser muletas da geringonça. Nas barrigas de aluguer, o PSD foi substituir na gerigonça o lugar do PCP. O PCP votou contra. E o PSD e a ausência de Paulo Portas foram cobrir a falha na geringonça.

A esquerda conseguiu vencer várias batalhas em pouco tempo. A adoção de crianças por casais homossexuais, os casamentos entre homossexuais, a despenalização da interrupção voluntária da gravidez… As posições mais conservadoras estão a perder terreno?

Há uma vitória clara do BE. O grande vencedor dos últimos quase 15 anos chama-se Bloco de Esquerda, que definiu claramente um discurso. Um discurso que é radical, mas que se apresenta bem. Um discurso muito bem articulado por pessoas inteligentes e com capacidade de comunicação, mas um discurso marcadamente ideológico, sem nenhum tipo de ambiguidade ou de hesitação na sua afirmação. E com esta persistência conquistaram um espaço na comunicação social, cercaram o PCP, que teve de rever algumas posições, capturaram e condicionaram a ala esquerda do PS e condicionaram uma parte da direita, que vai atrás do discurso moderninho e não tem ideias próprias. Eu diria que este é um caso, não é o único, que prova que o BE é o vencedor destes últimos 15 anos, conseguindo ter uma influência política que vai muito além do seu peso eleitoral.

Há uma fatia do eleitorado que não está representada no parlamento?

Isso é evidente. As pessoas que gostariam de ver valores e princípios afirmados sentem-se frustradas. Tenho pena de que determinados princípios não sejam afirmados no parlamento e é cada vez mais difícil. Ainda há quem tente contrariar isso – uma parte significativa do PSD e o CDS com exceção de Paulo Portas -, mas o debate é desigual, porque os valores de que emanam as nossas posições não são afirmados com clareza, nem com convicção. Isso obviamente que resulta numa grande fragilidade política por haver uma grande fragilidade ideológica e uma grande inconsistência doutrinária.

A esquerda e uma parte da direita colocaram na agenda política a despenalização da morte assistida. Presumo que seja contra. 

Acharei uma palhaçada se a eutanásia vier a ser aprovada em Portugal. A Constituição portuguesa, no seu artigo 24.º, tem uma das formulações mais vigorosas do direto à vida. Diz assim: «A vida humana é inviolável». É a formulação cristalina da Constituição. Eu considero uma palhaçada que um país que tem este princípio, sem rever a Constituição, torne a vida humana violável.