211 famílias à espera de justiça

MP anunciou que o inquérito ao surto de legionella em Vila Franca de Xira tem nove arguidos, mas investigação prossegue.

Mais de duas centenas de famílias deverão começar a avançar com pedidos de indemnização pelos danos com o surto de legionella que no final de 2014 assolou a região de Vila Franca Xira. Há quase dois anos à espera de justiça, as famílias tiveram conhecimento esta semana, pela comunicação social, de que o inquérito desencadeado pelo Ministério Público já tem arguidos, entre os quais duas empresas: a ADP Portugal e a General Electric (GE).

Se logo no rescaldo do surto a empresa de fertilizantes foi apontada como estando provavelmente na origem da infecção, soube-se agora que estarão também a ser imputadas responsabilidades à GE, que fazia a manutenção das torres de arrefecimento da empresa sediada no concelho e onde foi detetada contaminação com as mesmas estirpes de legionella encontradas nos doentes.
Em outubro do ano passado, a Procuradoria-Geral da República informou que o inquérito estava em fase adiantada mas só agora revelou que já foram constituídos nove arguidos: duas empresas e sete pessoas.

O inquérito permanece em fase de investigação, informou a PGR, não identificando os arguidos. «O inquérito encontra-se em investigação e envolve recolha e análise de prova que se tem vindo a revelar como muito complexa e exames periciais igualmente de grande complexidade, alguns deles complementares a outros já realizados mas essenciais para a descoberta da verdade», adiantou fonte oficial.

Segundo o SOL apurou, nos últimos meses foram anexadas ao inquérito 211 queixas de lesados que, na ausência da identificação de responsáveis, apresentaram queixa contra desconhecidos. Agora, poderão acionar pedidos de indemnização civil em separado do processo-crime. Em janeiro de 2015, a câmara municipal de Vila Franca de Xira – à qual pertencem as freguesias mais afetadas pelo surto de Vialonga e Póvoa de Santa Iria/Forte da Casa – assinou um protocolo de apoio às vítimas do surto de legionella com a Ordem dos Advogados, para oferecer consulta jurídica durante três anos aos lesados. A autarquia tem uma linha de atendimento direto ( 263 285 602) para encaminhar estes casos para a bolsa de advogados da delegação Delegação do Concelho de Vila Franca de Xira da Ordem.

Lesados unidos em associação

Perante os novos desenvolvimentos, Jorge Ribeiro, presidente da junta de freguesia de Póvoa de Santa Iria e Forte da Casa, adiantou ao SOL que vão tentar avançar com a criação de uma associação, ideia que tinha sido proposta no final de 2014 por algumas famílias. Depois de uma fase inicial de muita preocupação, o autarca sublinha que nos últimos tempos se assistiu a alguma resignação perante a «morosidade» da justiça. «Compreende-se a complexidade, mas isto aconteceu no final de 2014. É muito tempo, tendo em conta aquilo por que as pessoas passaram e a rapidez com que queriam que se soubesse a verdade e que fosse feita justiça».

Em Vialonga, o sentimento é idêntico, partilha o autarca André Gomes. Além de 12 vítimas mortais, muitas pessoas continuam a ter de deslocar-se ao hospital regularmente e houve perda de vencimentos em dias de baixa, danos físicos e emocionais. Em Vialonga, diz André Gomes, o caso mais grave – excetuando as vítimas mortais – é o de um homem de 60 anos que ficou com problemas respiratórios e de memória e teve de ir para um lar. A mensalidade tem sido, desde então, totalmente suportada pela família.

Segundo o balanço final da Direção-Geral da Saúde, o surto que terá começado a 12 de Outubro e só foi detetado a 7 de novembro, levou 375 pessoas ao hospital. Após a deteção, foi declarado controlado após duas semanas. A 11 de novembro de 2014, o ministro do Ambiente, Jorge Moreira da Silva, apontou responsabilidades à ADP e referiu, pela primeira vez, estar-se diante de um eventual crime ambiental – punível com uma pena de prisão até oito anos e multa até 2,5 milhões de euros. Posteriormente, as declarações oficiais tornaram-se mais cautelosas. Todas as análises feitas pela DGS e pela Inspeção Geral do Ambiente foram entregues ao Ministério Público.