Fisco vai aceder a dados bancários, mesmo com parecer negativo

Bancos terão de enviar à Autoridade Tributária os saldos das contas, uma vez por ano. Comissão de Proteção de Dados considera “excessivo”.

A administração fiscal vai ter acesso a dados bancários de todos os portugueses a partir do próximo ano, mesmo com um parecer negativo da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), que considera esta mudança “claramente excessiva”.

O governo aprovou em abril um diploma que obriga as instituições financeiras a enviar à Autoridade Tributária (AT) dados sobre as poupanças detidas em Portugal por residentes e não residentes. A informação sobre todas as aplicações financeiras dos clientes deve ser enviada por bancos, seguradoras ou sociedades gestoras de fundos de investimento.

A CNPD foi consultada sobre a mudança na legislação e o parecer foi negativo. O organismo considera que a obrigação de comunicação de dados à Autoridade Tributária viola a reserva da vida privada e põe em causa o sigilo bancário.

“A previsão de comunicação à Autoridade Tributária de informação sobre contas financeiras (máxime, saldos de contas) de todos os residentes em território nacional traduz uma restrição desnecessária e excessiva dos direitos fundamentais à protecção de dados pessoais e à reserva da vida privada, em violação clara do número 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa”, refere a CNPD.

Parecer não vinculativo Contudo, o parecer não é vinculativo e o governo já deixou claro que, embora esteja a estudar a posição da CNPD, o acesso às contas bancárias é mesmo para avançar, já que a alteração deriva de acordos internacionais. A medida, justifica o Ministério fas Finanças, resulta “no essencial de compromissos internacionais com carácter vinculativo assumidos pelo Estado português”.

O gabinete de Mário Centeno explica que está em causa a chamada directiva DAC2, que prevê um mecanismo automático de acesso e troca de informações financeiras em relação a contas detidas em Portugal por não residentes e a contas detidas por residentes no estrangeiro, incluindo cidadãos portugueses.

As Finanças realçam que Portugal está “numa situação de incumprimento perante a União Europeia por ainda não ter sido transposta” a diretiva. Assim, uma vez por ano a partir de 2017, o Fisco vai consultar o saldo bancário de cada cidadão, excluindo dessa operação informações relativas a “movimentos das contas, nos exatos termos definidos pela diretiva”.

Sobre as ideias que a CNPD apresentou o ministério garante que estão a ser estudadas. “As recomendações específicas de alteração do texto formuladas pela CNPD, que não contendem com a solução de fundo, estão em análise na sequência do processo de consulta e serão na generalidade acolhidas no texto final”, frisa ainda a tutela.

Segundo o “Jornal de Negócios”, há quatro recomendações da CNPD que as Finanças irão acolher: “Vedar expressamente o acesso por terceiros, qualquer que seja a sua natureza jurídica, aos dados assim obtidos pela AT; reafirmar a necessidade de decisão da Comissão Europeia ou de parecer da CNPD para a transmissão de dados a países terceiros ao abrigo das obrigações internacionalmente assumidas por Portugal; reforçar as medidas de segurança relativas à informação em causa; e assegurar o cumprimento das regras de protecção de dados pessoais por quaisquer entidades subcontratadas pelas entidades financeiras”.