Os pedófilos não têm chifres

Os abusadores sexuais dividem-se, na minha perspectiva, e na de muitos que foram obrigados a estudar sobre estas coisas, em dois grandes grupos: – os pedófilos e os que são apenas depravados.

estes, os depravados, não são doentes, existem apenas pela sensação de impunidade que a lei, e a sociedade portuguesa no seu todo lhes assegura.

a ministra da justiça tornou pública a decisão de alterar a lei penal, no que a estes dois tipos de predadores diz respeito, e desenvolver uma estratégia de prevenção que permita, segundo o grau de perigosidade, notificar escolas, famílias e instituições da presença, nas proximidades, de condenados por crimes deste género.

esperamos, senhora ministra, que as pressões de toda a espécie, a que será sujeita, não a façam desistir.

mal li a notícia, esperei enfadada a contestação do senhor bastonário da ordem dos advogados. já cansa tanta falta de objectividade. cada profissão tem o bastonário que elege.

perturbou-me, sem dúvida, mais a opinião citada na comunicação social de pedro bacelar de vasconcelos, pessoa que respeito e estimo: «estão em causa direitos fundamentais, cujas lesões têm que ser ponderadas. pode ser uma pena para a vida».

conheço dezenas de crianças cujas vidas cedo foram destruídas por redes destes criminosos. foram objecto de abusos sistemáticos provenientes de pais, tios, padres, educadores em geral. as suas vidas foram truncadas definitivamente desde essa altura, sem terem cometido qualquer crime. não haverá, parece que não, lei fundamental que as defenda.

quando comecei a estudar o problema, muito antes do processo casa pia, vi dezenas de vídeos.

homens, velhos e novos, abusavam de crianças, quase bebés, até à morte. e riam alarvemente. vomitei físico.

nem sonhava que cedo voltaria a ter vómito semelhante ao ouvir as histórias de infâncias roubadas de garotos que eram da responsabilidade do estado. o tal que deve assegurar os direitos fundamentais.

passados dez anos, o código penal permite que mesmo os já condenados em várias instâncias continuem a ser recebidos por esta sociedade complacente, a usar garotos semi-esfomeados, e a passar provocatoriamente frente à instituição que se calou tempo demais.

o professor furness, especialista das nações unidas para a prevenção dos abusos sexuais, e que tem vindo a portugal, orientar módulos de formação para profissionais de educação, saúde e justiça, diz habitualmente: «os pedófilos não têm chifres». são iguais a si e a mim. habitualmente são muito interessados nos problemas das crianças e circulam no meio onde elas procuram crescer.

são compulsivos.

se não têm chifres, que os possam distinguir dos outros humanos, têm que ter nome e endereço, para que você e eu possamos defender os seus filhos ou os meus netos.

nos eua ou no reino unido isso já acontece.

os períodos de crise são facilitadores da invasão de predadores sexuais, sobretudo nas zonas turísticas.

senhora ministra: somos centenas, talvez milhares. se for preciso lutaremos pelos direitos dos mais frágeis, ao seu lado, mesmo tendo opções ideológicas diferentes.

catalinapestana@gmail.com