Drones fazem razias a aviões e comprometem segurança aérea

Este ano já houve oito comunicações ao Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves. Diretor diz que legislação é urgente 

Este ano já foram comunicados ao Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves (GPIAA) oito incidentes com drones no espaço aéreo português. O último caso aconteceu no passado domingo. Eram 13h41 quando a tripulação de um voo comercial com quase duas centenas de pessoas a bordo, que se preparava para aterrar em Faro, avistou um drone de cor vermelha. O aparelho não chegou a tocar na aeronave, mas passou “incrivelmente perto da asa direita”, revela a comunicação feita ao gabinete, à qual o i teve acesso. Os pilotos chamaram a polícia do aeroporto, que por sua vez informou a GNR. “Fomos informados que, devido à falta de legislação, caso fosse identificado o responsável apenas seria alertado para o incidente”, reportaram.

Álvaro Neves, diretor do GPIAA, admite que a falta de controlo sobre os drones está a revelar-se preocupante. “Em algumas ocasiões é posta em causa a segurança aérea das aeronaves tripuladas”, afirma o responsável. Os incidentes reportados ao gabinete referem-se a aproximações de drones de aeronaves em circulação ou pontos estratégicos que podiam configurar situações de risco aéreo. No ano passado foram reportados nove, número que este ano, em oito meses, está quase a ser ultrapassado. Em 2014 houve apenas quatro registos. 

Em maio esteve em discussão pública a proposta de lei que deverá regular o uso de drones em Portugal mas, até ao momento, o normativo não foi publicado. “A legislação é mais do que urgente para que, pelo menos, se dê inicio à publicação de procedimentos operacionais quando se trata de operar com aviação tripulada em meios onde possam existir aeronaves não tripuladas”, diz o responsável, alertando para a falta de sensibilização dos operadores de drones para os riscos da entrada no espaço aéreo. 

Perigo a 9 MIL pés De acordo com a proposta de lei elaborada pela Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), de futuro deverá ser proibido o voo de drones acima dos 120 metros de altitude (400 pés), passando a ser obrigatório pedir autorização sempre que esteja em causa cruzar o espaço aéreo controlado. 

Por agora sem qualquer validação prévia, os registos do GPIAA revelam que os aparelhos surpreendem as tripulações a baixas altitudes – na fase de descolagem e aterragem –, mas também em pleno voo. 

Em abril, um voo comercial que fazia ligação de Madrid a Lisboa reportou o avistamento de um drone de cor azul e amarela a 9 mil pés, na zona entre Felgueiras e Celorico de Basto. “O avião passou por baixo do drone, a cerca de 50 metros”, indicaram os pilotos. Em junho, a tripulação de um voo com 188 pessoas a bordo a 2300 pés de altitude avistou um drone de forma oval a passar por debaixo do avião, a uma distância de 150 metros. 

Álvaro Neves salienta que a legislação não vai resolver todos os problemas, mas é essencial para reforçar a segurança: enquanto os operadores não forem obrigados a declarar os voos, aumenta a probabilidade de colisões. 
Por outro lado, ao levar à responsabilização dos operadores de drones com contraordenações em caso de violação da lei, poderia ter um efeito de consciencialização. “Esta indústria vale muitos milhões de euros, a sua evolução jamais terá retorno. Portanto, urge a necessidade de sermos capazes de pôr a aviação tripulada a coabitar com a não tripulada, nunca abdicando da segurança.” 

O especialista alerta para que o risco de embate é o mais grave, mas não é a única ameaça. 

“As colisões podem danificar seriamente as aeronaves tripuladas, mas temos de alargar a possibilidade de risco ao âmbito da segurança operacional”, explica. “Ainda na fase de voo, se a aeronave avistar um drone e for forçada a provocar uma manobra evasiva, a tripulação pode perder o controle da mesma, havendo um elevado grau de risco de acontecer um acidente.” 

Colocam-se ainda problemas de segurança ao nível das infraestruturas aeroportuárias. 

“Existem equipamentos que necessitam das áreas esterilizadas de qualquer obstáculo e/ou equipamento”, salienta Álvaro Neves, dando como exemplo o sistema ILS (instrument landing system), que auxilia os pilotos nas aterragens.

“Se, por mero acaso, um drone entra na zona e está uma avião a aterrar em operação de baixa visibilidade, pode provocar um desvio de sinal e a aeronave sofrer uma saída da pista.” 

Drones na 2.ª circular No verão de 2014, um drone que circulava nas imediações do aeroporto de Lisboa, junto das bombas da BP, obrigou o gestor de segurança operacional do aeroporto de Lisboa a intervir. O caso foi entregue à justiça. 

Em 2015 foram detetadas outras três intercorrências com voos que sobrevoavam a zona da circular em Lisboa, situação que tem merecido a atenção dos peritos do GPIAA. Uma das preocupações é que, caso ocorra alguma situação de emergência nos aeroportos nacionais e imediações, não existem garantias de que não ocorre uma invasão de drones à procura de captar imagens. Por outro lado, não está definido por agora a quem compete afastar as aeronaves não tripuladas que possam intrometer-se nos canais de operação dos aeroportos. “Enviam-se os F16 como está regulamentado nestes casos? Enviam-se os falcões que têm a tarefa de espantar aves?”, são algumas das questões suscitadas pelos peritos.

Questionada sobre o ponto de situação da legislação nacional, a ANAC informou esta semana que estão a ser analisados mais de cem contributos recebidos no período de discussão pública da regulamentação, não sendo adiantado um prazo para a publicação da mesma.