Impostos: Classe média mais apertada?

Empresários e fiscalistas duvidam que as mexidas no IRS, impostos indiretos e nova tributação no imobiliário sejam para «proteger a classe média».

A discussão que animou na última semana o panorama político nacional centrou-se nos impostos. O ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, foi o primeiro a vir admitir a possibilidade de os contribuintes com rendimentos mais altos poderem vir a pagar mais em sede de IRS – tendo sido corrigido pelo ministro das Finanças. Depois foi a vez de Marques Mendes, no seu espaço de comentário político semanal, anunciar  que os escalões do IRS iriam mesmo ser alterados e a taxa de solidariedade dedicada aos rendimentos mais elevados aumentada. Mais desmentidos se seguiram.

De seguida, voltou a entrar em cena o ministro das Finanças, Mário Centeno, que afirmou, na Assembleia da República, que o IRS vai ficar como está. Mas os impostos indiretos terão que ser alterados na mesma medida do que foi feito no Orçamento do Estado para 2016. No entanto, disse, o IVA ficará como está.

Por essa altura, as dúvidas eram muitas e as certezas nenhumas. Até que veio o Bloco de Esquerda anunciar a grande novidade do Orçamento do Estado para o próximo ano: um novo imposto progressivo sobre o património avaliado acima dos 500 mil euros.

Segundo o partido de Catarina Martins, as negociações estão fechadas. O PCP veio dizer que não: ainda está à mesa com o PS porque quer que a tributação se estenda não só ao património imobiliário mas também ao  mobiliário (ações, participações de capital ou títulos financeiros).

As contas do IRS

Em sede de IRS, Manuel Caldeira Cabral afirmou, na entrevista da semana passada, à SIC: «O aumento da progressividade poderá afetar as classes mais altas marginalmente. Um ajustamento dos escalões poderá ter um efeito desse género». Dias depois, em Bratislava, Centeno garantia que as taxas não serão alteradas. Há que ter em conta, no entanto, que a extinção da sobretaxa do IRS ficou marcada para o próximo ano. Ou seja, a sobretaxa aplicada já a metade pelo atual governo deverá render entre 400 a 500 milhões de euros. Em 2017, a receita será de zero.

No programa de governo do PS prevê-se, no entanto, aumentar a progressividade do IRS. Essa medida pressupõe, na opinião do fiscalista Tiago Caiado Guerreiro, um agravamento do imposto para a classe média-alta. E esse «é um dos grandes problemas para a fuga de cérebros do país», afirmou ao SOL. Ou seja, a acontecer a mexida nos escalões do IRS, serão os dois patamares mais altos a ser alterados.

Atualmente, o segundo escalão, que vai dos 40.200 euros até 80 mil euros, paga 45%. No escalão imediatamente abaixo, quem tem rendimentos anuais  entre os 20.100 e os 40.200 euros é tributado em 37% – isto significa que um casal com o rendimento anual de         20.200 euros ficará, depois de retirada a percentagem de IRS, com 7.437 euros (3.718,5 euros para cada um). A acontecerem as alterações nos escalões do IRS, a situação pode ainda piorar.

Por isso, diz Caiado Guerreiro, esta situação pode levar «à deslocalização de pessoas». Mas é necessário compensar a falta da sobretaxa do IRS. E isso seria possível sem mexer nos escalões do imposto «se a despesa pública não tivesse aumentado. Com a falta de investimento e de crescimento terão de subir os impostos indiretos».

 

‘IVA terá de subir’

O ministro das Finanças, Mário Centeno, anunciou que os escalões do IRS ficarão como estão, mas os impostos indiretos poderão sofrer alterações – exceto o IVA. Tiago Caiado Guerreiro desconfia: «Estou convencido de que mais cedo ou mais tarde vão ter de aumentar o IVA».

Recorde-se que, no OE do ano passado, o IVA da restauração diminuiu de 23% para 13%, mas a tributação sobre combustíveis, tabaco e álcool e os automóveis aumentou. E este ano a receita pode ser a mesma.