Praxes resistem a governo e reitores

O ministro escreveu uma carta a todas as associações académicas e assume ser contra a praxe. Reitores proibiram atividades dentro das universidades, mas alunos continuam a realizar as praxes. 

Praxes resistem a governo e reitores

Há cinco anos que os reitores começaram a proibir as praxes dentro dos recintos das universidades. Mas nem por isso as praxes abrandaram. 

Além desta restrição, este verão o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, assumiu ser contra as praxes, mas os estudantes dizem ao SOL não sentir qualquer desistência dos novos alunos em participar neste tipo de atividades. 

«A participação em atividades de praxe não sofreu qualquer abalo apesar da controvérsia que tem sido gerada nos últimos anos em torno desta tradição», diz ao SOL, Francisco Duarte, presidente da Associação Académica de Lisboa (AAL). Apesar de não terem dados concretos da evolução da participação dos caloiros (novos alunos) nas praxes, esta é a perceção das quatro associações académicas ouvidas pelo SOL. 

E em algumas instituições de ensino superior, garantem ao SOL os estudantes, continuam a ser realizadas praxes académicas, como é o caso da maioria das faculdades da Universidade de Coimbra, do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade de Lisboa ou até mesmo na Faculdade de Direito e da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Nova, em Lisboa.  

Mas o mesmo não acontece na Universidade do Porto, da Universidade de Évora, da Universidade do Minho e na maioria das faculdades da Universidade de Lisboa, por exemplo. Aqui as praxes foram proibidas pelos reitores – os únicos que têm poder para tomar essa decisão –, mas os estudantes contornaram estas limitações e «cada vez mais os alunos saem das faculdades para realizarem as dinâmicas de praxe, seja de que índole for», explicou ao SOL o presidente da Federação Académica do Porto (FAP), Daniel Freitas.  

Crato criou linha de apoio em 2013
As restrições à praxe pelos reitores e pelo governo foram reforçadas depois do caso polémico do Meco, onde seis estudantes da Universidade Lusófona morreram em 2013, alegadamente, na sequência de uma praxe. Nessa altura, o ministro Nuno Crato enviou, às universidades e politécnicos, orientações e recomendações sobre as praxes académicas. A tutela lembrava que existem «instrumentos legais para combater estas condutas abusivas, humilhantes e vexatórias» sendo as instituições, em última instância, as responsáveis «por não limitarem e proibirem» comportamentos violentos. O ministro criou ainda uma linha de apoio através de um endereço de correio eletrónico – praxesabusivas@mec.gov.pt – onde os alunos podem comunicar eventuais abusos ocorridos no âmbito das atividades de praxe. 

No ano letivo passado (2015-2016) houve dez queixas por parte de alunos, segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES). Menos 70 face às 80 queixas registadas no ano letivo anterior. 

A tutela indicou ainda que as queixas de 2015-2016 chegaram de alunos que frequentam as universidades do Minho, Porto, Évora e Autónoma e que os casos, quando assim o justificaram, foram comunicados aos reitores das instituições a que pertenciam os alunos.

Manuel Heitor assume oposição às praxes
A oposição às praxes endureceu depois de o ministro do Ensino Superior, Manuel Heitor, ter enviado, em setembro, uma carta a todas as associações académicas de universidade e politécnicos a solicitar que as instituições de ensino superior não reconheçam as comissões de praxe e outros órgãos que regulam as praxes académicas. O governante considera, lê-se no documento, que «as manifestações de abuso, humilhação e subserviência a que assistimos na praxe académica» põem em causa «a credibilidade» do ensino superior. «Não posso aceitar mais uma vez o ciclo repetitivo de imagens degradantes que nos envergonham», frisa o ministro que diz dar o seu «sincero apoio» a todos os que combatem as praxes, uma «prática fascizante» com «caráter boçal e grosseiro». 

Já em 2008, o então ministro Mariano Gago – de quem Manuel Heitor foi secretário de Estado – enviou uma carta semelhante às associações académicas. 

Os estudantes não tardaram a mostrar o seu descontentamento com a tomada de posição do ministro e garantem ser contra manifestações de violência e humilhação. Ao SOL dizem que a visão de Manuel Heitor sobre as praxes é de «fraca verdade» e que o «exagero» do ministro provoca a «destruição da imagem do estudante», lamenta Manuel Marchante, presidente da Associação Académica de Évora. 

Opinião partilhada pelo Dux João Luís Jesus, o presidente do Conselho de Veteranos da Universidade de Coimbra – órgão que regula as praxes – que garante que «a maior parte do que se diz ser praxe foge à essência da praxe».