Se este casamento fosse de amor, falhava

O falhanço da solução de governo seria penalizador para os três partidos envolvidos.

Vai haver Orçamento. Hoje ou amanhã, na generalidade ou na especialidade, faça chuva ou faça sol, com vários sapos pelo meio, já se sabe que o Orçamento do Estado para 2017 será aprovado. Nem é preciso que fique tudo já arrumado: o Presidente da República veio lembrar que o prazo decorre até dezembro.

A geringonça tem quase 11 meses. Quem duvidava que fosse possível que três partidos tão estranhos entre si conseguissem uma espécie de coligação – palavra que nunca é usada, o que faz com que o termo “geringonça” tenha ganho território para designar o que parece inominável – entende agora que a espécie de coligação vai durar até ao limite.

O facto de o casamento entre PS, PCP e Bloco de Esquerda se fundar no interesse individual de cada partido – e não em qualquer arroubo lírico de união de esquerda – é o que dá a solidez efetiva ao governo de António Costa. Todos têm de ceder, porque o casamento por interesse não pode acabar.

O facto de PCP e Bloco de Esquerda terem aceitado submeter-se às estritas regras do Tratado Orçamento para fazer funcionar um governo socialista é a mais dura de todas as cedências. Mas é nela que assenta o acordo de cada partido com o PS. Nem PCP nem Bloco de Esquerda têm ainda condições objetivas para deitar o governo abaixo.

O PS também não tem, para já, possibilidades de avançar para eleições antecipadas porque o resultado arriscava-se a ser o mesmo: a não existência de maioria absoluta. O falhanço da solução de governo seria penalizador para os três partidos envolvidos. E se, a longo prazo, tanto o PCP como o Bloco de Esquerda podem vir a ressentir-se eleitoralmente do apoio dado a um governo que vela pelo “estrito cumprimento dos compromissos europeus” – e aí cair-lhes o céu em cima da cabeça –, hoje não é a véspera desse dia. Enquanto houver interesse comum em manter a geringonça, ela vai continuar.

Se fosse o amor o cimento disto, a espécie de coligação nunca teria existido. Se este casamento fosse de amor, falhava.