O que encrava a geringonça?

Há sete pontos que se podem revelar sensíveis. Alguns deles não estão sequer no Orçamento, outros ainda estão em negociação. Mas são dossiês que António Costa terá de gerir com cuidado para manter o apoio de BE e PCP.

Condição de recursos

António Costa quer que só receba pensões mínimas de velhice ou invalidez quem fizer prova de que precisa delas. Chama-se a isso impor uma condição de recursos e Passos Coelho já disse que a ideia lhe parece «justa». Mas BE e PCP nem querem ouvir falar nisso. Catarina Martins teme que esta seja uma forma de cortar as pensões mínimas e preferia fazer outro debate: mudar as condições de recurso para o Complemento Solidário para Idosos para que os rendimentos dos filhos deixem de impedir os mais velhos de aceder a esta prestação. Não se sabe quando haverá decisões nesta área, mas advinha-se tensão neste tema.

 

Deduções na Educação

O BE quer alterar as deduções de Educação no IRS. A ideia é que quem tem filhos no público não fique prejudicado por não poder deduzir faturas de cantinas e transporte ou equipamentos desportivos ou artísticos quando no privado há formas de o fazer. No Governo torce-se o nariz a uma medida que é difícil de desenhar e que pode ser difícil de explicar uma medida que – para ser mais justa – poderia levar à redução do teto de contribuições. Não chega a ser um braço de ferro, mas no BE esta é uma matéria vista como «muito importante». Para já, Joana Mortágua diz ao SOL que «este é um dos dossiês que ainda está em negociação» no Orçamento.

 

Rendas na Saúde

Em agosto, Catarina Martins dizia que «2017 terá de ser o ano do combate às rendas na saúde e energia». No dossiê da energia, o BE conseguiu ganhos importantes neste Orçamento que devem levar a poupanças nas faturas da luz para os consumidores. Mas na Saúde o tema parece fora do radar político. Desde que Marcelo Rebelo de Sousa deixou claro que está contra cortes nas Parcerias Público Privadas no setor, que o Governo tem evitado o assunto. Mas, mais cedo ou mais tarde, o BE vai voltar a levantar esta bandeira. E isso pode ser difícil de gerir pelo Governo, sobretudo tendo em conta a posição do Presidente da República.

 

Caixa Geral de Depósitos

Catarina Martins chamou «inaceitáveis» aos salários dos gestores da CGD, Jerónimo de Sousa falou em «fartos aumentos» e ficou claro que a esquerda não está confortável com os cerca de 30 mil euros que António Domingues vai ganhar por mês para gerir o banco do Estado. O PSD acabou por dar uma ajuda a António Costa nesta matéria quando chumbou – ao lado do PS – a proposta do PCP para impor limites aos salários na CGD. Mas o dossiê da Caixa ainda terá novos episódios difíceis de gerir, nomeadamente graças às saídas a que vai obrigar o plano de recapitalização do banco.

 

Défice e dívida

Mário Centeno dizia há uma semana ao Expresso que este «é um Orçamento de esquerda». Catarina Martins discorda e di-lo esta semana ao Jornal de Negócios. O que os separa? Os constrangimentos impostos pelo Tratado Orçamental e pela dívida. Sem que se saia do garrote de limites ao défice impostos por Bruxelas e sem uma reestruturação da dívida, que Catarina Martins considera «inevitável», não haverá margem para investimento público. E esse é um pecado capital para a esquerda. Todas as negociações entre PS, BE, PCP e PEV são feitas cumprindo as regras europeias. Resta saber durante quanto tempo será possível essa quadratura do círculo.

 

Complemento salarial

O tema não tem estado no centro da discussão política, mas foi trazido esta semana para a agenda por Francisco Louçã. O ex-dirigente bloquista deixou claro que o BE não vai aceitar a criação de um complemento salarial que está a ser ponderado pelo Governo como forma de aliviar o esforço das empresas por causa da subida do salário mínimo nacional. «Essa medida foi excluída dos acordos com as esquerdas, que não podem aceitar que o Estado pague para as empresas manterem os salários mais baixos. Isto vale mesmo uma guerra política na maioria parlamentar, pergunto eu?», escreve Louçã esta semana no Público.

 

Pensões

BE e PCP vão ser confrontados na especialidade com uma proposta do CDS para aumentar todas as pensões em 10 euros. Era isso que o PCP pedia. Mas durante a negociação do Orçamento, bloquistas e comunistas aceitaram um aumento de 10 euros para as reformas entre 275 e 628 euros. O momento de votação da proposta centrista será, por isso, de embaraço. Também está por saber se BE e PCP vão insistir em conseguir mais durante a discussão na especialidade, mas Costa já deu o assunto por encerrado. Em qualquer dos casos, o BE prefere olhar para o copo meio cheio. «É maior aumento de pensões dos últimos 20 anos», diz Joana Mortágua.