Mobilidade. Transportes do futuro já fazem parte do nosso presente

A aliança entre tecnologia e o software tem possibilitado inovações nos transportes. Pessoas e mercadorias vão movimentar-se de outra forma. As mudanças já chegaram. A questão é a velocidade de implementação

Ontem, na Web Summit, os carros autónomos estiveram no centro de uma discussão que entusiasmou e deixou vários pontos de reflexão. O mote foi a que “velocidade vão estar os carros autónomos na maioria das estradas e se é realista estar entusiasmado com esta tecnologia”.

O primeiro a intervir foi Jim Scheinman. “Os carros autónomos são a tecnologia que mais mudança vai trazer à nossa economia”, sentenciou. O fundador da Venture Capitals, empresa que investe em startups e companhias que se dedicam a desenvolver esta tecnologia, sustentou que a mudança é tão rápida que os carros de nível 4 e 5 – sem qualquer interferência humana – “estarão daqui a dez anos em algumas cidades”.

O seu opositor no debate mostrou-se mais cético em relação ao calendário, mas não em relação ao conteúdo. “O Jim tem razão, vai acontecer, mas acho que vai demorar muito, muito tempo”, disse George Arison, que justificou a sua posição com três pontos: tecnologia, regulação e questões morais.

Segundo o fundador da Shift, “a tecnologia existe, mas ainda há uma variedade de problemas” que vão desde a interferência da meteorologia no funcionamento à resolução de problema mecânicos nos automóveis.

O empresário argumenta que o sistema de regulação “vai demorar muito tempo a ser afinado”, uma vez que há muitos aspetos a ter em conta e que as questões morais são prementes. “Imaginem, por exemplo, que uma criança se atravessa na rua: o carro vai escolher atropelar essa criança para salvar os seus passageiros ou vice-versa?”, questiona.

Soluções Jim Scheinman contrapõe que todas essas questões são “solúveis” e centra a argumentação da velocidade da mudança no dinheiro. “Com tanto dinheiro envolvido, as coisas vão evoluir muito mais depressa”, e acrescenta vários outros pontos para defender a sua posição. “Serão salvas milhões de vidas [pessoas que morrem em acidentes de automóvel em todo o mundo]; é melhor para o ambiente [todos estes carros serão elétricos]; e é muito mais seguro para as populações envelhecidas – não esquecendo a mobilidade que permite a deficientes e cegos”, diz o responsável.

Sobre as dúvidas levantadas sobre o seu opositor de debate, afirma que “o computador será programado para reagir da melhor forma possível” a situações-limite. “As entidades públicas estão a mexer-se rapidamente – já há diretrizes políticas sobre carros autónomos”, e haverá “soluções criativas” para os problemas mecânicos e de tecnologia. Já George Arison pensa que cada um destes temas “será muito complicado de resolver” e daí que “não demorará pouco tempo”.

Quando perguntada sobre quem tinha ganho o debate, a audiência dividiu-se quase a meio.

Energia Uma das características dos carros autónomos é que são todos elétricos. A energia necessária para a mobilidade do futuro é um aspeto decisivo e há experiências um pouco por todo o mundo que estão a resultar – nas quatro rodas, mas acima de tudo nas duas.

Uma destas é uma empresa de partilha de scooters elétricas. Mas só das baterias. Horace Luke, fundador da Gogoro, explicou que a sua empresa tem como propósito ser uma “comunidade de partilha de baterias” que “elimine a ansiedade e preocupação” do condutor em relação ao combustível.

Segundo Luke, o papel da tecnologia “é mudar a forma de vida de uma maneira profunda” e o seu desafio é usar “a tecnologia para mudar a energia” numa sociedade que assenta nos fatores energéticos. A portabilidade da energia é uma procura constante de várias empresas – a japonesa Panasonic é parceira estratégica desta empresa e, na Europa, é com a Bosch que Horace Luke trabalha.

Urbanidade A Gogoro apresenta ainda uma solução de futuro para um outro problema: a crescente urbanização das sociedades. Estudos recentes anteveem que, em 2050, mais de dois terços da humanidade vai habitar em zonas urbanas. “Onde houver densidade, há uma necessidade”, diz Luke, que começou por desenvolver a sua empresa em Taipé, uma cidade de “22 milhões de habitantes onde há 14 milhões de scooters”.

Outras metrópoles de dezenas de milhões de habitantes, como Ho Chi Minh, Jacarta ou Manila, “têm também problemas de poluição e ruído” para os quais a mobilidade elétrica pode ser uma solução. “Oferecemos um serviço melhor nas cidades com muitas pessoas”, diz o responsável, acrescentando que “dados históricos, em tempo real e ambientais”, fazem parte da tecnologia da Gogoro. “Aprender é o primeiro passo para se poder, de facto, inovar”, e a “segurança das pessoas é a primeira coisa em que pensamos”, diz Luke.

A questão da segurança das pessoas está também em aplicação noutra área dos transportes e mobilidade: os drones.

A DJI, principal fabricante de drones do mundo, colabora com a EENA – European Emergency Number Association, a entidade responsável pelo 112 (número de socorro europeu), no sentido de “melhorar os serviços de emergência”.

O diretor de educação da DJI esteve ontem na Web Summit a explicar esta parceria feita na Europa “para testar a reação de diferentes culturas” e que tem como objetivo “usar os dados recolhidos pelos drones para garantir a segurança das pessoas”. Romeo Durscher deu como exemplo incêndios, “em que uma câmara térmica instalada no drone pode mostrar quais são os hotspots do fogo”, e o transporte de “medicamentos ou equipamento médico entre hospitais de uma mesma cidade” numa altura de trânsito mais complicada. “Muitas mais aplicações e utilizações para os drones virão com o desenvolvimento de software e hardware”, prevê Durscher.

Trânsito aéreo Com a proliferação de drones levantam-se questões de regulação do espaço e trânsito nos céus. Um exemplo recente são os fogos do último verão na Califórnia.

A determinada altura, a estrada principal que liga Los Angeles a São Francisco ficou cortada por um incêndio e o avião de combate às chamas foi impedido de despejar retardante sobre as chamas porque o céu estava cheio de drones privados que filmavam e tiravam fotografias do incêndio.

A história foi contada no painel dedicado à navegação – com três responsáveis de empresas ligadas a esta indústria –, a sua segurança e correta utilização do espaço aéreo. “Está a ser construído um ecossistema com uma perspetiva de abertura e partilha de dados entre as diferentes empresas”, disse Daniel Alcaron-Rubio, CTO da Airmap. “Através do software, conseguimos ligar e coordenar os diferentes aparelhos e os órgãos de regulação movimentam-se na direção certa”, corrobora Michael Winn. O CEO da Drone Deploy defende a “separação dos drones para uso comercial dos de outras utilizações e que os riscos serão contemplados pelo nível de tecnologia atual e “pela indústria dos seguros”.

Rob Coneybeer, cofundador da Shasta Ventures, antevê que as “cidades serão proeminentes” nesta regulação e que os “sistemas de interceção de drones, aliados ao mapeamento das principais especificidades de cada zona”, permitirão que os drones “não voem para zonas proibidas”. Segundo o responsável, “a tecnologia existe, não penso que este venha a ser um problema”.

Daniel Alcaron-Rubio concorda que será a tecnologia a “ajudar os drones a voarem em segurança”, uma vez que “haverá cada vez mais voos com cada vez menores custos”.

milhões de voos de drones, em média, contabilizados por ano em todo o mundo milhões é o número de drones que se estima existam hoje em dia acidentes catastróficos registados em voos: 100

milhões é o número de drones que se estima que existam hoje em dia: 3 a 4

acidentes catastróficos registados em voos realizados por drones: 0

jorge.afonso@ionline.pt