Um dos piores pesadelos dos portugueses? As faturas

Estudo mostra que as faturas continuam a não ser de leitura fácil, sendo este um dos maiores problemas. Entre as faturas da luz, água e gás, as piores são as das empresas de água

“Os kWh faturados resultam do produto dos m3 medidos pelo Fator Multiplicativo (=Fator de Correção de Volume x Poder Calorífico Superior), com exceção da aplicação de consumo padrão em kWh conforme normativa legal.” Consegue perceber o escrevemos? Devia porque há muitas probabilidades de fazer parte de uma das suas faturas, mas a verdade é que não é fácil. Aliás, com base num estudo feito recentemente, pode dizer-se que as faturas que são entregues aos consumidores nacionais têm acima de tudo dois graves problemas: “Uma linguagem muito solene e técnica e um detalhe denso e hermético”.

A análise foi feita pela Claro, empresa que tem como missão ajudar as empresas a usar a clareza para melhorar a experiência dos clientes, e partiu da comparação de 13 faturas de água, eletricidade e gás por serem estes os serviços considerados essenciais para os consumidores portugueses.

A empresa que mais se destacou pela clareza foi a EDP “pela organização lógica dos conteúdos, uma linguagem bastante simples e um grafismo leve”. Ainda assim, para os autores do estudo, deveriam ser feitas duas alterações estruturais: colocar os dados de pagamento logo na primeira página do documento e substituir o gráfico em donut por um feito de colunas, de forma a facilitar ao cliente a comparação entre o que “paga de eletricidade, gás, serviços e impostos”.

Com uma pontuação de zero a dez, na lógica de que quanto mais alta a classificação mais clara é a fatura, a EDP Comercial conseguiu alcançar uma pontuação de 8,1, um valor muito acima do resultado da Goldenergy, que ficou em segundo lugar, com uma pontuação de 6,4. A Galp Energia ficou a fechar o pódio com 5,7. Nos últimos lugares ficaram as empresas de água: as Águas de Cascais ficou na pior posição da tabela com apenas 1,8.

A empresa responsável pelo estudo garante que as faturas foram escolhidas em função do número de pessoas que as recebem, tanto no caso da água como no caso da eletricidade e do gás. “Recolhemos exemplares de faturas dos dez concelhos onde vivem mais pessoas. Para isso, consultámos os dados do Instituto Nacional de Estatística para a população residente a 31 de dezembro de 2015. E recolhemos exemplares das faturas dos comercializadores de eletricidade e de gás que detêm 95 % da quota de mercado (número de clientes). Para isso, consultámos as estatísticas mais recentes da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos”, explicam.

Queixas aumentam em 2015 Em março deste ano, a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (DECO) sublinhava que durante o ano passado recebeu mais 24% de queixas do que em 2014 – ao todo foram entregues à associação 700 mil. A maioria reclamações estavam ligadas ao setor da energia e da água, que pela primeira vez ultrapassou o das telecomunicações – que liderou durante quase dez anos a lista das atividades que mereciam mais queixas por parte dos consumidores nacionais. 

De acordo com a DECO, este aumento nos registos de reclamações estava relacionado com a devolução de cauções da água e eletricidade (indevidamente cobradas). Além disso, a falta de transparência no processo de mudança de comercializador, nomeadamente pela dupla faturação e falta de informação, era um dos principais motivos das reclamações apresentadas à associação.

“Este aumento deveu-se, em grande medida, aos 100 mil processos de devolução de caução. As reclamações nos setores mais reclamados continuaram a sê-lo em 2014, mas houve um acentuado aumento [de reclamações] no setor da energia, nomeadamente sobre a mudança de comercializador”, explicava, nesta altura, Ana Sofia Ferreira, jurista da Deco.

A verdade é que, de acordo com os dados apresentados pela associação, só o processo de devolução de cauções dos serviços de água e luz foi responsável por cerca de 100 mil reclamações, mas mesmo descontadas estas queixas o setor da energia e água continuava a ser mais reclamado do que o das telecomunicações (mais 2398 reclamações).
Também o mercado liberalizado da luz e da gás fez com que o número de reclamações começasse a disparar. O processo de faturação era, em 2015, uma das principais queixas dos consumidores. 

Mas quem pensa que os problemas aconteceram só no ano passado, desengane-se. Em 2014, a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) já tinha recebido cerca de 15 mil reclamações, o que representou um aumento de quase 19% face a 2013, ano em que somaram 12 609. “O número de reclamações recebidas pela ERSE é, na sua esmagadora maioria, referente ao mercado elétrico, o qual é responsável em 2014 por cerca de 83% do número acumulado de reclamações do ano”, explicou fonte do regulador.

Um dos problemas apontados estava relacionado com o facto de haver faturação excessiva e acertos que eram feitos e conduziam a um valor a pagar muito elevado.