Hong-Kong regressa à insurreição

Pequim quer afastar dois deputados independentistas do parlamento local. Confronta-se agora com protestos volumosos, vindos de áreas que habitualmente não tomam ação.

Hong-Kong regressa à insurreição

O governo chinês optou esta semana por usar todos os poderes que tem à disposição para evitar que o incipiente movimento independentista em Hong-Kong cresça para além do seu controlo. Pequim iniciou preparativos para suspender o mandato de pelo menos dois deputados que contestam o domínio sobre o território semiautónomo. Recebeu em resposta protestos a uma escala rara.

A semana começou com o Congresso do Povo a recomendar que Sixtus “Baggio” Leung e Yau Wai-ching fossem impedidos de tomar posse como deputados no Parlamento de Hong-Kong, usando como pretexto o facto de ambos terem repetidamente fugido às regras do juramento oficial – os dois disseram ser leais à «nação de Hong-Kong», usaram um termo depreciativo comum no Japão imperial para se referirem à China e levaram também bandeiras em que reivindicavam a separação do território continental. Pequim tem o direito a interpretar a lei de Hong-Kong – chamada a “Lei Básica”, fruto da negociação que resultou no acordo de “um país, dois sistemas”, acertado entre britânicos e chineses, quando transferiram o território –, mas a decisão não foi bem recebida.

Desde os grandes protestos de 2014 por uma maior autonomia de Hong-Kong em relação à China que Pequim caminha em areia movediça em todas as suas demonstrações de poder. Esta não foi exceção. O Governo chinês pronunciou-se antes do tribunal que estava a julgar as violações de protocolo em Hong-Kong, dando a ideia de que a decisão em relação ao futuro dos dois deputados já estava tomada. O governador da região, apontado por Pequim – foi essa a razão dos protestos de há dois anos – disse prontamente que iria acatar a ordem. Na noite de domingo, porém, numa marcha que antecipava a ação de Pequim, a polícia teve de disparar gás lacrimogéneo contra as dezenas de pessoas que tentaram invadir o edifício da delegação chinesa em Hong-Kong. Durante o dia, manifestaram-se umas quatro mil pessoas.

Pequim tem uma política de tolerância-zero para movimentos independentistas – quer impedir que se propaguem ao Tibete e a Xinjiang –, mas a intransigência parece só estar a incentivar o sentimento de autonomia. Alguns habitantes de Hong-Kong temem que a sua relativa independência esteja ameaçada e os protestos alastraram-se durante a semana para grupos que invulgarmente se manifestam contra Pequim. Na quarta-feira, centenas de advogados de Hong-Kong marcharam em silêncio contra a restrição de mandatos dos dois deputados. No dia seguinte, porém, abriu-se um processo semelhante contra outros oito deputados que defendem maior autonomia