Um ano depois dos atentados de Paris, o país continua em guerra

Hollande não falou durante as homenagens às vítimas, mas Valls defendeu a extensão do Estado de emergência pelo menos até às eleições

Fez ontem um ano que um grupo de terroristas armados semeou o terror pelas ruas de Paris e matou 130 pessoas. A catástrofe desse dia 13 de novembro de 2015 – numa altura em que a França ainda recuperava do abalo causado pela morte de 12 cartoonistas do jornal satírico “Charlie Hebdo”, ocorrida no início do ano – marcou um ponto de viragem na abordagem estratégica seguida pelo governo francês, de defesa e segurança interna, personificada nas palavras marcantes do presidente François Hollande no dia seguinte: “Estamos em guerra.”

Desde esse dia que as autoridades francesas estão a levar tal espírito à letra. Polícias e militares têm aproveitado a luz verde concedida pela declaração do estado de emergência e de exceção para fazer buscas e deter preventivamente suspeitos de ligações terroristas, à margem dos limites legais permitidos pela Constituição francesa.

A situação, segundo Manuel Valls, está para durar. Numa entrevista à cadeia de televisão britânica BBC, o primeiro-ministro francês lembrou que os ataques acima referidos e o atropelamento mortal de 84 pessoas em julho deste ano por um camionista, em Nice, são motivos mais do que suficientes para se manter o estado de emergência. “Enquanto líder do governo e cidadão francês, também eu ficarei permanentemente marcado pelo que experienciámos. A vida mudou. Vivemos com o terrorismo”, explicou Valls, defendendo que o país “necessita de se manter seguro” pelo menos até às eleições presidenciais, com data marcada para abril de 2017, para que se possa evitar “outra Nice”. 

Num artigo de opinião escrito pelo próprio, no sábado, para outro meio de comunicação britânico, o jornal “The Guardian”, Valls reforçou a necessidade de um controlo apertado das autoridades de segurança. Para além disso, fez um apelo aos restantes países da União Europeia para avançarem definitivamente para o (eterno) processo de criação de um exército europeu, com vista ao combate da “pesada e permanente ameaça” que paira no continente, motivada pelo jihadismo.

“Para salvaguardarmos a nossa segurança, nós, europeus, temos de tomar conta de nós próprios, agora mais do que nunca. Isto significa, em primeiro lugar, [que temos de] proteger as fronteiras externas da UE de forma mais efetiva, através do controlo sistemático e obrigatório [de pessoas], incluindo os nacionais dos Estados- -membros”, propôs Valls.

Em silêncio por Paris

O chefe de Estado francês, François Hollande, presidiu no domingo às cerimónias de homenagem às 130 vítimas dos ataques do dia 13 de novembro, mas optou por não discursar, para evitar que um dia de luto pudesse ser visto como um pretexto para fazer campanha política.

Acompanhado pela presidente da Câmara de Paris, Anne Hidalgo, Hollande realizou um percurso por seis zonas da cidade onde morreram pessoas naquela noite. Em cada um dos locais foram afixadas placas com os nomes de todos os que ali morreram às mãos dos terroristas – as cerimónias de homenagem tiveram início, no entanto, na noite anterior, com um concerto de Sting na sala de espetáculos Bataclan, onde morreram 90 pessoas há um ano.

Manuel Dias, filho do português que foi morto nas imediações do Stade de France, foi o escolhido para falar naquele local e, emocionado, pediu aos franceses mais “tolerância”, lembrando que o seu pai representava a “prova de que a integração é possível” em França.