Lixo. Mar português tem mais de 750 mil objetos a boiar

Foi analisada pela primeira vez a quantidade de lixo que o mar português tem à superfície. Ao todo são mais de 750 mil objetos, com o plástico a dominar esta lista negra

Nunca antes se tinha feito um estudo sobre o lixo que fica à superfície do mar português, mas as conclusões alertam para uma realidade que há muito devia ser tema de debate. Ao todo foram registados 752 740 objetos a boiar ao longo da costa portuguesa em zonas que abrangem a ZEE portuguesa (zona económica exclusiva).

Por se tratar da primeira investigação do género em Portugal, os cientistas partiram à descoberta sem expetativas, o que não os impediu de olhar com alguma surpresa para valores tão elevados. “Não chega para sermos considerados os piores, mas é suficiente para lançar o alerta”, explica ao i Sara Sá, investigadora responsável pelo estudo, lembrando que são valores similares aos de estudos realizados, por exemplo, no mar do Norte, nas águas costeiras do Japão e na península Antártica.

A recolha de dados foi feita no verão de 2011 e publicada este ano na revista científica “Marine Pollution Bulletin”. Os investigadores integraram a equipa que seguia a bordo da embarcação Santa Maria Manuela, no âmbito do projeto “LIFE+ MarPro”, coordenado pela Universidade de Aveiro. Sara Sá juntou-se a um grupo de investigadores – cada um com o seu propósito – e tomou o lixo marinho como a sua causa. Em julho viajou em alto-mar durante 15 dias, experiência que repetiu nos meses seguintes, ainda que durante períodos mais curtos. “Para uma primeira vez, foi logo uma experiência em grande”, conta, recordando o tempo de observação, a que chamam “tempo de esforço” e que é regido pela luz do dia. “Acordávamos todos os dias às 8 da manhã e ficávamos alerta até ao pôr-do-sol”. Para isso, coordenava-se com outros dois investigadores de modo a fazerem turnos rotativos: uma hora de observação, uma hora a registar o que era observado, uma hora de descanso e assim sucessivamente.

Todos os objetos encontrados a boiar foram registados num formulário, com pormenores que vão desde o tamanho à distância a que estavam do barco, a hora a que foram encontrados e o material de que eram feitos.

Muito plástico E é quando se fala em material que não resta espaço para dúvidas: o plástico domina o lixo encontrado em alto-mar. “Sacos, garrafas e pedaços de plástico flutuante era bastante comum”, explica Sara. Ainda a completar o top-3 desta lista está a esferovite e o material de pesca, que vai desde redes a cabos e linhas. O lixo com dimensões entre os 10 centímetros e 1 metro é o mais abundante.

O tipo de material encontrado leva Sara a concluir que a origem estará mais ligada a fontes locais oceânicas, ou seja, à passagem de embarcações de recreio e de pesca, mais do que propriamente ao lixo que vem da costa. “Saber a origem é o primeiro passo para que se tomem medidas efetivas de redução do lixo em alto-mar”, refere, na esperança de que a sua tese de mestrado sirva para mudar uma realidade que, apesar de preocupante, não passa de uma percentagem pequena de toda a ameaça. “O que encontramos a boiar à superfície é só uma amostra do que se pode encontrar debaixo de água”, lembra a investigadora. Daí que tenha abraçado como causa aquilo que seria inicialmente apenas a sua tese de mestrado em Biologia Marinha. Parte agora para doutoramento, no qual vai dar seguimento à investigação, desta vez centrada no estudo do lixo marinho nas águas costeiras, incluindo o lixo presente nas praias e na coluna de água (a mais de 40 centímetros de profundidade) e os impactos da ingestão de lixo para várias espécies da fauna marinha.

lixo nas praias Plástico, metal, madeira, borracha, vidro, têxteis e papel: o lixo marinho é cada vez mais variado e não para de se multiplicar nas praias portuguesas. E mais: quase todos os objetos são mais pequenos que uma tampa de garrafa, o que dificulta a sua identificação e posterior remoção.

O MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente já alertou para os problemas que advêm do lixo que se encontra nas praias e que vai muito além da parte estética. No estômago das aves marinhas têm vindo a ser encontrados pedaços de plástico, mas também isqueiros e escovas de dentes.