Manifesto Anti-Pelintras

Isto é para vocês: bestas das bombas de gasolina, carrancudos dos restaurantes, sisudos das repartições, medíocres molengas da função pública em geral.

é para os cretinos ao volante de táxis, para os chico-espertos de centro comercial, os artolas das baixas fraudulentas e dos atestados via médico amigo, para as empregadas de balcão mal-encaradas e os polícias armados ao pingarelho. para os cromos que houver nas agências bancárias, os chulecos das seguradoras a quem servir a carapuça, segue pelos patifes dos créditos imediatos, chega aos senhores gestores que andam de smart para agradar aos subordinados enquanto escondem o ferrari no parque privativo de um hotel 5 estrelas. vai com especial apreço para os antipáticos das tabacarias, os snobs das lojas pedantes, os soberbos de gravatinha, os palhaços dos seguranças da noite armados em oficiais dos serviços secretos. sem esquecer a maltinha que não cumprimenta, todos aqueles que não aprenderam boas maneiras quando crianças, para os ótários que falam alto ao telefone no meio da rua através daqueles kits mãos-livres possidónios no intuito de provar ao mundo que justificam o oxigénio desperdiçado. já agora também serve aos animais do trânsito, convencidos de que possuem no automóvel uma segunda pele, tão lestos a descarregar frustrações na estrada como lentos de compreensão. chega para os prepotentes que podem ajudar mas não o fazem, fecham a loja 20 minutos antes do ponto ou não oferecem um minuto a mais por maior drama que lhes apareça à frente; abraça os senhores do ‘pois-isso-não-é-comigo’, encaixa que nem uma luva aos cobardes do agarra-me-senão-vou-me-a-ele, os escroques da boca atirada de longe, os solitários infelizes que utilizam a internet como saco de boxe, os queixinhas tem-te-não-caias em geral, que resmungam pelas costas mas continuam ruminantes pela frente. seres humanos incompetentes versão genérico, loja do chinês, feira de carcavelos.

estão mal, mudem-se. desamparem-nos a loja. vão ver se chove. penteiem macacos. vão dar banho ao cão, depois de uma curva ao bilhar grande. pisguem-se, desapareçam. fora.

estão infelizes, é? a vidinha não vos correu como sonhavam? não gostam do patrão, do papá, da mamã, da casa onde vivem, são maus na cama, estão sós na dita, puseram-vos os palitos, detestam o reflexo ao espelho, não fazem aquilo de que gostam? têm muito bom remédio: demitam-se. troquem a azia por um pingo de orgulho e, por uma vez, escolham agir. façam alguma coisa das vossas vidas em vez de somente desperdiçá-las – enquanto ainda por cima atrapalham as nossas. não gostam do emprego? pirem-se. não gostam do horário? procurem alternativa. não gostam do ordenado? trabalhem, busquem outros talentos, reinventem-se. carpe diem, seus pelintras. façam da excepção regra e, sem mais demoras, transformem a ameaça velada e vã ao menos num gritinho perante quem manda. párem de ter pena de vocês próprios. a auto-comiseração é estúpida, perda de tempo, onanismo pateta, não vos leva a lado nenhum, não paga dívidas nem saca gajas, repito: estão mal, mudem-se. reconheçam que são profissionais reles e sigam o vosso caminho, dêem o lugar ao próximo. se não estão felizes com aquilo que fazem, há muito boa gente (boa mesmo) à espera da oportunidade. sejam francos convosco e leais com os outros. saiam. portugal precisa de outros. e eles estão aí, em número bem maior do que o desejável. merecem um lugar ao sol. pelo menos poder provar que fazer pior do que vós é uma tarefa homérica. honrem o salário que recebem, dignifiquem o cargo que ocupam, agradeçam a sorte que têm – ou então arrumem a trouxa e vão carpir misérias para outra freguesia.

detesto a vossa apatia, desprezo a arrogância vazia que passeiam como um caniche no braço duma dondoca, abomino a irónica atitude de que o inferno… são os outros. «muda de vida, não / deves viver contrafeito / muda de vida, se há / vida em ti a latejar» – tal qual como na canção. emigram tantos bons, ficam tantos maus. de ‘tantos’ a ‘todos’ vai a diferença entre um país a sério e a república dos bananas. l

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