Política. Acontecimento do ano: Guterres no topo do mundo

O ex-primeiro-ministro foi eleito secretário-geral da ONU num processo de seleção aberto e transparente. Uma candidatura consistente e que foi também uma vitória para a diplomacia portuguesa.

Política. Acontecimento do ano: Guterres no topo do mundo

Quando o Governo português anunciou a candidatura de António Guterres a secretário-geral das Nações Unidas, em fevereiro, a sua concretização parecia remota. Tudo indicava que o antigo primeiro-ministro partia em clara desvantagem. Isto porque desde o início do processo que estiveram em cima da mesa dois pré-requisitos informais: ser mulher, um desejo também expresso pelo secretário-geral cessante Ban Ki-moon e originário da Europa de Leste. 

Mas aos poucos, a hipótese de um português chegar aos comandos da ONU foi-se tornando cada vez mais realista. O ex-alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados foi vencendo as votações informais uma após a outra até à coroação, onde obteve 13 votos de encorajamento e dois sem opinião, ou seja, não teve qualquer veto por parte dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança: China, França, Reino Unido, Rússia e Estados Unidos.

Um percurso consistente, apesar de uma candidatura de última hora da búlgara Kristalina Georgieva. A entrada na corrida da vice-presidente da Comissão Europeia sempre foi uma sombra desde o primeiro dia, mas só se concretizou depois de o Governo de Sófia ter retirado o seu apoio a Irina Bokova, diretora-geral da UNESCO que já se encontrava na corrida. 

As búlgaras foram sempre apontadas como potenciais adversárias de peso. A ameaça pairou sobre o português, não só porque a búlgara cumpria os tais pré-requisitos informais, mas também devido seu forte currículo – além da Comissão, também trabalhou no Banco Mundial, organização a que regressou após a derrota. Sem esquecer que a sua candidatura contava com o apoio nunca desmentido da chanceler alemã e do presidente da Comissão Europeia. O desfecho da corrida, aliás, foi também uma derrota tanto para Angela Merkel como para Jean-Claude Juncker.

De nada lhe valeram estes apoios de peso num processo de seleção que se pautou pelos princípios da abertura e da transparência. António Guterres foi o escolhido da corrida. Uma vitória não só para o antigo primeiro-ministro como para a diplomacia portuguesa, uma vez que a candidatura resultou de um empenho conjugado entre várias instituições e personalidades, designadamente do Governo e do Presidente da República.

A notícia de que o socialista seria o nome proposto pelo Conselho de Segurança à Assembleia-Geral das Nações Unidas, órgão que nomeia o secretário-geral, surgiu a 5 de outubro. «Desejamos boa sorte ao sr. Guterres no cumprimento dos seus deveres como secretário-geral das Nações Unidas nos próximos cinco anos», afirmou o embaixador russo nas Nações Unidas, Vitaly Churkin. A confirmação da Assembleia-Geral chegou uma semana depois. «Tenho a honra de anunciar que António Guterres foi confirmado, por aclamação, secretário-geral para o cargo entre 1 de janeiro de 2017 e 31 de dezembro de 2021», disse o presidente da Assembleia Geral da ONU, Peter Thomson.

Na posse, a 12 de dezembro, Guterres foi perentório. «Chegou a hora de mudar». Uma tarefa dura, especialmente numa altura em que muitos põe em causa a força da ONU e a sua capacidade de gerir os conflitos mundiais. Conseguirá o português revolucionar a máquina das Nações Unidas?