Valha-nos Deus!

À esquerda e à direita – com honrosas exceções – há um grande consenso a favor da nacionalização do Novo Banco.

Terão razão?

Nesta questão há duas vertentes.

Uma é a vertente ideológica.

Se já é questionável o facto de o Estado ter um banco – que navega muitas vezes ao sabor dos interesses dos partidos que dominam o Governo -, será aceitável o Estado (mesmo temporariamente) ter dois bancos?

Não será mais um local para colocar os boys e um saco azul para financiar os amigos?

A outra é a vertente financeira.

Ora, está bem fresca na memória de todos a tragédia que foi a nacionalização do BPN, com consequências terríveis para os contribuintes.

O Estado enterrou nele muitos milhares de milhões de euros – nem se sabe bem quantos – e acabou por vendê-lo a custo zero (ou abaixo de zero).

Foi um buraco colossal.

Depois deste caso, como pode falar-se da ‘nacionalização do Novo Banco’?

Estão a brincar connosco?

Uma experiência falhada não chega?

Acresce que o Novo Banco tem muitos rabos-de-palha, que podem arrastar-se indefinidamente no tempo, sendo um risco enorme para o Estado assumir a sua propriedade.

Para não falar nas necessidades de recapitalização, que levantam problemas bicudos em face da legislação europeia.

Uma coisa parece óbvia: se os privados não dão muito por ele, é porque não é grande aposta; vai o Estado meter-se em mais um negócio duvidoso?

Mas há mais.   Ainda está por resolver o imbróglio da Caixa Geral de Depósitos.

O Governo quis a CGD 100% pública, mas não conseguiu solucionar o problema mais básico que é arranjar uma administração.

A CGD está há um ano sem administração efetiva!

Além de que a sua gestão não tem sido propriamente um modelo, estando neste momento o banco cheio de buracos.

Agora precisa de 5 mil milhões de euros – para iniciar um novo ciclo que, possivelmente, acabará daqui a meia dúzia de anos com a necessidade de outros 5 mil milhões.

Com este caso de ‘gestão exemplar’, para que quer o Estado mais um banco?

Para ter mais um sumidouro de dinheiro? 

No tempo de Pedro Passos Coelho, pensei que íamos entrar no caminho certo: um Estado mais pequeno, mais leve, com menos risco, menos despesa, menos gente, permitindo que os cidadãos e as empresas fossem gradualmente aliviados de impostos.

Chegou a falar-se na privatização da RTP, que seria um sinal saudável de que o Governo não desejava condicionar os media. 

Mas com a ‘geringonça’ voltámos ao passado: ao caminho triunfal de termos um Estado gordo, pesado, intervencionista, com mais gente e mais despesa.

Aquilo que já estava privatizado (como a TAP) foi outra vez nacionalizado, os tribunais que tinham fechado voltaram a abrir, alguns funcionários públicos que estavam na porta de saída foram reintegrados, etc. 

E agora quer-se a nacionalização do Novo Banco! 

Se ainda fosse só a esquerda a defendê-la, ainda vá que não vá.

O mais intrigante é haver também gente da direita a advogar esse caminho.

Argumentam com o exemplo do Lloyds, que foi recuperado com sucesso pelo Estado britânico (com o português Horta-Osório na presidência).

Mas poderá comparar-se Portugal com  o Reino Unido?

O rigor e a isenção que os anglo-saxónicos colocam nestes processos terão alguma coisa a ver com os nossos hábitos trapalhões?

Algum banco português foi recuperado com sucesso?

Uma característica das pessoas inteligentes é aprenderem com os erros dos outros, evitando repeti-los; ora, nós nem conseguimos aprender com os nossos próprios erros.

As nossas elites não prestam.

Não aprendem, por mais que a realidade lhes entre pelos olhos dentro.

Não é uma questão de pessoas: é uma questão de ambiente, de caldo de cultura.

Se o Novo Banco for nacionalizado, vai ser mais um palco de lutas partidárias, de financiamentos duvidosos ou ruinosos, de colocação de boys.

E os contribuintes continuarão a pagar a fatura.

Valha-nos Deus, pois com esta elite nunca chegaremos a lado nenhum.

P.S. 1 – O ex-ministro das Finanças Campos e Cunha fez uma afirmação gravíssima, que só por si fragiliza enormemente os que defendem a banca pública: disse que Sócrates insistiu com ele para que demitisse Vítor Martins da CGD, substituindo-o por Santos Ferreira e Armando Vara. Sócrates veio desmentir esta versão, mas os factos não o ajudam: na verdade, logo que Campos e Cunha saiu, a administração da Caixa  mudou. Agora, se o Novo Banco for nacionalizado, poderemos ter Mariana Mortágua e João Galamba como administradores… 

P.S. 2 – Sobre este mesmo tema, o sucessor de Campos e Cunha, Teixeira dos Santos, fez declarações lamentáveis na Comissão de Inquérito à CGD. Parecia Zeinal Bava a dizer que não se lembrava de nada…