Inspeção-geral da Saúde diz que a Ordem é “uma espécie de sindicato”. E os enfermeiros não gostaram

Em causa está a denúncia de que doentes ficaram sem comer num hospital público. IGAS diz que situação não se comprovou. Enfermeiros admitem recorrer ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

A Ordem dos Enfermeiros insiste que houve doentes que ficaram dias sem alimentação e medicação num serviço hospitalar do SNS. A denúncia foi feita pela bastonária em dezembro mas Ana Rita Cavaco nunca divulgou publicamente a instituição em causa. A Inspeção Geral das Atividades em Saúde reconheceu, entretanto, que a situação reportada dizia respeito ao Hospital dos Capuchos mas garante que não foi comprovada nenhuma das afirmações de Ana Rita Cavaco. A bastonária já reagiu e diz que irá levar o caso até às últimas consequências: “Faremos tudo o que está ao nosso alcance para garantir a segurança dos doentes e a qualidade dos cuidados, nem que para isso seja necessário recorrer ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem”, afirma a Ordem dos Enfermeiros.

As declarações da inspetora-geral das Atividades da Saúde surgem numa entrevista publicada hoje pelo jornal “Público”. Leonor Furtado diz que Ana Rita Cavaco “não fez queixa nenhuma”. Foi ela própria, “em face do que estava a ocorrer”, que estranhou que não tivesse sido comunicada qualquer situação à IGAS e que contactou a bastonária. “A seguir fizemos uma inspeção e o que posso afirmar é que não resultou comprovada nenhuma das suas afirmações.”

Leonor Furtado refere que o relatório da inspeção está em fase de contraditório mas traça desde já duras críticas a Ana Rita Cavaco. “A senhora bastonária pode dizer o que quiser, é uma espécie de sindicato”, afirma. “Eu tenho de fazer um trabalho silencioso. O que não pode acontecer é alguém dizer que soube de um caso e depois não pormenorizar, não dizer quem lhe fez chegar a informação. Isto não é sério. Há aqui também uma questão de ética profissional: então as senhoras enfermeiras verificaram uma questão daquelas e não participaram aos seus superiores hierárquicos? Quem é o enfermeiro que está num serviço e que verifica que não tem medicação para dar aos seus doentes e segue feliz e contente?”, remata Leonor Furtado, lembrando que já na denúncia anterior da bastonária, sobre haver hospitais portugueses onde é praticada eutanásia, a averiguação teve o mesmo desfecho. “Quando foi da eutanásia disse-o e torno a dizer. Este tipo de afirmação que pode gerar alguma insegurança no cidadão devia ser tratado com cautela.”

Numa nota enviada ao i, a Ordem dos Enfermeiros diz estranhar que a IGAS tenha apresentado à imprensa as conclusões de um projeto de relatório “sem solicitar, para a elaboração do mesmo, a denúncia concreta que nos chegou por escrito, e sem ouvir todos os profissionais do serviço em causa”.

Ana Rita Cavaco questiona ainda que “os peritos da OE que visitaram a unidade também não tenham sido ouvidos e que não nos tenha sido solicitado o relatório dessa mesma visita”.

A OE lamenta que a inspetora-geral não tenha aceitado o convite da bastonária para uma visita conjunta a 14 de dezembro. "A OE já informou a IGAS que o projecto de relatório não é satisfatório, pelo que seguirá para a Procuradora-Geral da República, juntamente com a denúncia escrita e outros meios de prova recolhidos", garantem ainda os representantes dos enfermeiros.