A primeira grande derrota de António Costa

Quem conhecer António Costa o suficiente saberá que ele é um prodígio da tática. 

Apartir daqui as coisas estão esclarecidas: isto não é um Governo ao estilo de António Guterres. Porquê? Porque não pode ser. Guterres formou governos minoritários que dependiam de geometrias variáveis – e contou com o grande apoio do então líder do PSD Marcelo Rebelo de Sousa, que foi aprovando orçamentos e mantendo a estabilidade política. Ao contrário de Guterres, que tinha vencido as eleições, a  legitimidade de António Costa reside exclusivamente na maioria de esquerda que o apoia no parlamento – foi ela e só ela que lhe permitiu transformar-se em primeiro-ministro sem ter ganho as eleições. É verdade que o acordo para a ascensão de Costa a chefe de Governo é de ‘serviços mínimos’ – ou seja, PCP e Bloco de Esquerda aceitaram que o Governo cumprisse aquilo que é a base do programa do PS, nomeadamente os compromissos europeus e a política internacional. Isto também lhes permite, para os respetivos eleitorados, distanciar-se quando é necessário e invocar que «o Governo é do PS». Na realidade é. Mas só existe porque tem maioria na Assembleia da República. 

É verdade que, talvez influenciado pelo Presidente da República ou pela sua crescente popularidade nas sondagens, António Costa inebriou-se e julgou que estava à frente de um Governo ao estilo Guterres. Ao acordar com os patrões uma medida – a baixa da Taxa Social Única para os empregadores – que nem no PS é consensual, Costa acreditou que teria o PSD à sua disposição para o que fosse preciso. No caso, dar o ámen na Assembleia da República a uma medida que o próprio PSD já apoiou.

Quem conhecer António Costa o suficiente saberá que ele é um prodígio da tática. Até da tática que lhe permitiu a sua sobrevivência política, quando fez o acordo de esquerda. É verdade que existem socialistas profundamente identificados com uma solução de esquerda, mas há muito outros que só a defendem neste momento porque lhes permite a sobrevivência política. A questão da TSU foi uma lição: Costa não pode brincar com a esquerda. E tem razão quando disse ontem no parlamento que «o PSD não conta para nada». É verdade: não conta para o manter no poder. Se Costa fosse líder da oposição depois de ter ganho as eleições ia dar batatinhas a Passos? Está-se mesmo a ver, não é?