Há cerca de uma semana, quando liguei o televisor, estava sintonizado na SIC-Notícias.Transmitia a Quadratura do Círculo.Não via o programa há muito tempo, e fiquei a assistir, por curiosidade.Percebi que falavam da TSU.
Pacheco Pereira estava no final de uma intervenção – e só pude entender que criticava o PSD.
Lobo Xavier, que falou a seguir – embora não estivesse no estúdio, aparecendo num ecrã ao lado –, disse que estava de acordo com os outros e ainda carregou mais nas tintas, arrasando a atitude dos sociais-democratas, que classificou como «absurda».
A Quadratura do Círculo é um programa engraçado, pois as opiniões dos participantes foram-se aproximando ao longo do tempo (por isso, aliás, deixei de o ver).
Apesar de um (Jorge Coelho) ser socialista, outro (Lobo Xavier) ser liberal, e o terceiro (Pacheco Pereira) ser ex-esquerdista e ex-social-democrata, dizem todos mais ou menos o mesmo, por outras palavras.
Mesmo quando divergem, fazem-no num clima de concórdia: não me lembro de os ver discutir mais acaloradamente.
Muitas vezes, Passos Coelho é o bombo da festa.
Jorge Coelho ataca-o porque a sua condição de socialista o exige; Pacheco ataca-o porque o detesta; Xavier ataca-o por diletantismo.
É óbvio que o PSD não é coerente ao vetar a descida da TSU.Isso nem se discute. Mas a política nunca primou pela coerência.
Mário Soares dizia que «só os burros não mudam», para justificar os seus frequentes ziguezagues.
O PS votou contra todos os Orçamentos no tempo da troika, depois de ter negociado o acordo com a troika; e, no Governo, ao contrário do que disse quando era oposição, fez crescer os impostos, não aumentou o investimento público, não diminuiu a dívida (antes a aumentou imenso), estrangulou o SNS e outros serviços com as cativações, etc.
Mas, sendo o PSD incoerente ao chumbar a TSU, jogou uma corajosa cartada política.Porquê? Porque confrontou a ‘geringonça’ com as suas limitações.
O PS dizia que tinha entrado num tempo novo ao juntar-se ao PCP e ao BE – e que ia provar no Governo a viabilidade dessa opção.
Ora, o veto do PSD à descida da TSU mostrou o contrário.
Mostrou que o apoio da extrema-esquerda não chega para o Governo tomar certas medidas que gostaria de tomar.
Mostrou que, em alguns casos, o Governo precisava da ajuda do PSD.
E irá precisar cada vez mais, por uma razão evidente.
A ‘geringonça’ foi uma aliança negativa, feita para reverter as medidas do tempo da troika.
O seu objetivo era desfazer o que estava feito, era destruir– e por isso dificilmente servirá para construir uma nova política minimamente equilibrada.
O PS contará com o PCP e o BE para aprovar medidas de esquerda, mas só isso.
Para governar ao centro, precisaria do apoio do PSD – e esse já viu que não terá.
Ora, Portugal não pode passar mais três anos a ser governado à esquerda.
Foi isso que percebeu Francisco Assis, quando apelou a eleições.
Ele concluiu que a ‘geringonça’ não pode ir muito mais longe.
Que é uma fórmula esgotada.
O chumbo da descida da TSU foi um momento importante, porque tornou claro que o PSD não está disposto a ser a ‘perna direita’ da ‘geringonça’.
Que esta tem de contar apenas com as suas forças.
Mas atenção: se o PSD não quer ser muleta do Governo, também não deve ter pressa de regressar ao poder.
É bom que os portugueses percebam as limitações deste modelo de governação, apenas apoiado nas esquerdas.
É importante que os portugueses percebam aquilo que um Governo destes é capaz e não é capaz de fazer – e os resultados que pode alcançar.
E para isso são necessárias duas condições.
A primeira é a ‘geringonça’ ter tempo suficiente para mostrar o que vale.
A segunda é governar sozinha, sem a ajuda de ninguém.
Até por isso, seria estrategicamente errado o PSD dar-lhe a mão.
P.S. – Antes de a Operação Marquês se ocupar da PT, tive a intuição de que o maior crime de Sócrates estava justamente aqui. Como? Primeiro, chumbando a OPA da Sonae, com argumentos duvidosos; depois, chumbando a venda da Vivo à Telefonica, mas aprovando-a a seguir, sob condição de a PT permanecer no mercado brasileiro; finalmente, validando a compra da Oi. Foram as decisões de Sócrates que destruíram a PT. E serviram a quem? A venda da Vivo rendeu grandes dividendos a Salgado. E a compra da Oi (que não valia quase nada mas pela qual a PT pagou 3,75 mil milhões) rendeu muito dinheiro a muita gente (Lula incluído).
A Justiça começou entretanto a ocupar-se do caso – e agora Ricardo Salgado foi constituído arguido. E as suspeitas coincidem exatamente com o que escrevi nos artigos: Sócrates foi o grande responsável pelo enterro da PT. E Salgado foi um dos grandes beneficiários. A única diferença é que eu disse não saber se Sócrates tinha recebido ou não ‘luvas’ – e a Justiça acha que sim. E não terá sido pouco: cerca de 20 milhões…