Marcelo Rebelo de Sousa quer ter o PS na mão (e vai votar em António Costa em 2019)

Conforme prometemos no nosso último texto, convém hoje pronunciarmo-nos sobre o conteúdo das entrevistas e declarações do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, na semana transacta. Cinco notas se impõem:

1)Marcelo Rebelo de Sousa quer aguentar o Governo da geringonça até ao fim da legislatura. Porquê? Para assegurar a estabilidade política porque tal é positivo para Portugal? Na cabeça de Marcelo, está esse objectivo: contudo, apenas parcialmente. Marcelo sabe – tem inteligência e experiência suficiente para o saber – que esta solução política apenas na aparência é estável.

Quanto muito, a geringonça assegura a estabilidade do erro e da inacção: alguém acredita que este Governo, esta maioria política artificial e fraudulenta, é capaz de promover alguma reforma que seja? Claro que não! Serve apenas para manter Passos Coelho da liderança do Governo e permitir a António Costa concretizar o seu sonho de criança. Problema: Marcelo Rebelo de Sousa, por natureza, é um político com convicções a menos – e habilidade a mais.

É um Presidente com estratégia a menos – e táctica a mais. É um puro jogador político que está a apostar na sua carta predilecta: no sucesso político de António Costa.

Porquê? Porque isso lhe interessa tendo em vista a sua reeleição. Marcelo quer ser reeleito com o apoio de PS, PSD e CDS – e para atingir esse objectivo, Marcelo quer ter o PS no bolso, para o condicionar nas suas escolhas políticas estratégicas;

2) Marcelo acredita que, nas próximas legislativas, a decorrerem na data prevista, ele próprio será o grande vencedor. Porquê? Porque Marcelo está convencido de que nenhum partido obterá uma maioria absoluta. Nem PSD (mesmo com o CDS), nem PS. E o PS chegará a 2019 mais forte, na liderança das sondagens, sendo o vencedor mais provável. António Costa saberá agradecer a Marcelo o apoio dado e retribuir devidamente.

Já quanto ao PSD, Marcelo está convencido – e já o confidenciou aos mais próximos – que Passos Coelho jamais vencerá uma nova eleição. Perderá as autárquicas; perderá naturalmente as legislativas.

Ora, face a este seu feeling, Marcelo Rebelo de Sousa mudou a sua estratégia quanto ao PSD – a sua intenção já não é fomentar uma movimentação ruidosa, indiscreta ou tão só latente de oposição a Pedro Passos Coelho, mas sim ir matando lentamente o actual líder do PSD.

Discretamente, longe dos holofotes mediáticas, dando centelha, antes, a uma guerrilha surda (e eficaz) que visará produzir o mesmo efeito útil, que é o mesmo que dizer, dar a oportunidade a Marcelo de escolher o sucessor de Pedro Passos Coelho. Como? A resposta leva-nos ao nosso ponto n.º 3;

3)Marcelo quer que Passos Coelho saia com uma derrota nas legislativas. De facto, Rebelo de Sousa já percebeu que a sua estratégia inicial foi devidamente assinalada pelos comentadores mais independentes da comunicação social portuguesa, tendo depois encontrado eco na factualidade, não sendo mais possível ser ignorada pelos media do politicamente correcto e pelos portugueses em geral.

Pois bem, o que fez o Presidente Marcelo? Calculou os riscos políticos a que se submetia caso optasse por prolongar a guerra aberta com Passos Coelho e alimentasse activamente a candidatura de Luís Montenegro – mudando, de seguida, de estratégia.

Qual é o seu plano actualmente? Fácil: esperar pela derrota do PSD de Passos Coelho em 2019, obrigando depois o actual líder a demitir-se sem honra, nem glória. Por conseguinte, o hábil político Marcelo Rebelo de Sousa precisa de elogiar grandemente António Costa e a sua geringonça e ignorar o PSD – porque, afinal de contas, elogiar a geringonça é matar gradualmente a liderança de Passos Coelho, na óptica de Marcelo.

E como Luís Montenegro só avançará quando Passos Coelho se demitir, Marcelo (com a ajuda do seu conselheiro principal oficioso, Miguel Relvas, por acaso, o cérebro da candidatura de Montenegro) pode esperar por 2019;

4)Nunca na história constitucional portuguesa um Presidente da República se havia referido a medidas legislativas do Governo em funções como “nós fizemos”, “aprovámos”, “conseguimos”.

Nós, o Governo e o Presidente da República. Aconteceu, pela primeira vez, na entrevista de Marcelo Rebelo de Sousa à SIC. Ora, Marcelo Rebelo de Sousa assumiu-se como jogador político-partidário e não como árbitro, ao contrário do que manda a Constituição da República Portuguesa.

O Professor de Direito Constitucional Marcelo Rebelo de Sousa chumbaria o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Sem apelo, nem agravo;

5) Marcelo reconheceu que se sente mais Primeiro-Ministro do que Presidente da República. Quando? Quando afirmou que não teme o risco da sua excessiva exposição pública, pois os Presidentes Obama e Hollande e a Chanceler Angela Merkel aparecemm muito mais do que ele – e os respectivos povos nunca se cansaram. Ora, o que têm em comum os três políticos referidos por Marcelo? Os três são Chefes de Governo.

O Presidente Obama era Presidente dos EUA, um sistema presidencialista em que o Presidente é simultaneamente Chefe de Estado e Chefe de Governo.

François Hollande é também Chefe de Estado e tem poderes executivos muito relevantes, escolhendo e exercendo um poder efectivo sobre o Primeiro-Ministro.

A Chanceler Angela Merkel é Chefe de Governo e não Chefe de Estado.

Significa, pois, que Marcelo Rebelo de Sousa é influenciado no exercício das suas funções por líderes políticos que são Chefes de Governo, detendo poderes executivos relevantes! O que não sucede no sistema de Governo português!

Como o diabo – e Marcelo! – se revela nos detalhes, significa que, de facto, o nosso Presidente julga que é Primeiro-ministro…

Nossa dúvida: no meio de tantas selfies, de tantas festas e de tantas jogadas políticas, quando é que o nosso Presidente tem tempo para pensar, genuina e seriamente, no futuro de Portugal e dos portugueses?