Lei laboral. A luta continua à esquerda mas o PS pede calma

António Costa quer garantir o consenso mais alargado possível para reformas laborais e vai usar os 18 meses de suspensão da caducidade da contratação coletiva para negociar com patrões e sindicatos. Até ao final deste trimestre será apresentada uma “radiografia do mercado laboral”

PCP e CGTP não vão baixar os braços na luta contra o fim da caducidade na contratação coletiva. Os comunistas têm um projeto-lei entregue no parlamento e os sindicalistas garantem que o combate continua nos locais de trabalho. Mas, à esquerda, as posições não se devem extremar – pelo menos para já – porque do governo vem a garantia de que haverá alterações importantes à lei do trabalho ao longo deste ano.

Livro verde em março Até ao final do primeiro trimestre, o executivo vai apresentar um “livro verde das relações de trabalho” que será uma radiografia ao mercado laboral e servirá de ponto de partida para uma negociação que António Costa quer que passe pela concertação social, mas que os socialistas admitem se fará também no parlamento.

A promessa ajuda a explicar a forma como, apesar de a esquerda querer manter alta a pressão sobre o tema, não ter havido ainda uma crispação maior em relação à forma como o ministro do Trabalho se revelou frontalmente contra o fim da caducidade dos contratos coletivos.

“Vou ser claro: nós não somos a favor da reversão do princípio da caducidade na legislação laboral”, disse Vieira da Silva na sexta-feira durante o debate de urgência sobre contratação coletiva marcado pelo PCP. A oposição do ministro veio, contudo, acompanhada de uma nuance que deve ser valorizada: o ministro admitiu “alterações pontuais” à lei para reforçar a importância da negociação coletiva.

“O governo tem de girar vários pratos ao mesmo tempo”, nota o deputado socialista Tiago Barbosa Ribeiro, explicando que é importante para o executivo que a discussão passe pela concertação social. “Claro que a concertação não tem nenhum poder de veto. Isso é evidente. Mas um acordo dá mais força institucional a mudanças de ciclo político”, aponta o parlamentar com a pasta do trabalho no PS.

A ideia é, por isso, encontrar “um consenso alargado” e é para isso que devem servir os 18 meses de suspensão da caducidade que os patrões aceitaram no acordo assinado com Vieira da Silva em dezembro. “Isso dá-nos um ano e meio para negociar”, explica Barbosa Ribeiro, que acha importante valorizar a agenda laboral do governo.

“Este é o ano da precariedade e esse é um avanço histórico”, nota o socialista, frisando que “o que o governo está a fazer não é o mesmo que fez o governo PSD/CDS, e que abria caminho até a alterações ao despedimento individual.”

Com o processo de integração dos trabalhadores precários no Estado a dar os primeiros passos, Tiago Barbosa Ribeiro considera “natural” que BE e PCP tenham “as suas agendas próprias” em matérias laborais, mas pede alguma paciência. “Não podemos fazer tudo ao mesmo tempo”, avisa.

À esquerda não se baixa os braços, mas também não há declarações de guerra. “A posição do ministro só veio tornar mais evidente que a luta nos locais de trabalho é evidente”, comenta a deputada comunista Rita Rato, explicando que o PCP quer “manter a questão da caducidade na agenda política”.

“Só há dinamização da contratação coletiva com o fim da caducidade”, insiste Arménio Carlos, que diz que o governo acaba por reconhecer a importância dessa medida ao introduzir a suspensão desse mecanismo no acordo de concertação social que assinou com a UGT e as confederações patronais.

Trabalhadores mais pobres Para Arménio Carlos, a luta pelo fim da caducidade faz parte do combate pela valorização do trabalho, que considera ser essencial para reverter os efeitos das políticas impostas pela troika. “Houve um empobrecimento dos trabalhadores e das suas famílias à custa da desvalorização do trabalho”, observa o líder da CGTP, lembrando que 11% dos trabalhadores, 25% das crianças e jovens e 42% dos desempregados estão abaixo do limiar da pobreza.

Arménio Carlos acha importante que o governo se defina neste ponto. “O governo tem de definir se a pretexto de uma falsa competitividade quer manter uma política de baixos salários ou se quer romper com essa política. Cada um assumirá as suas responsabilidades”, avisa ao i.

Ontem, também Jerónimo de Sousa deixou claro que o maior compromisso dos comunistas é com os trabalhadores e não com António Costa, pelo que o primeiro-ministro tem de saber que o PCP vai manter a sua agenda de luta. “O compromisso do PCP é com os trabalhadores e com o povo, e não com o governo”, avisou Jerónimo, criticando “a conformação por parte do PS de opções que não rompem com a política de direita”, como a recusa do fim da caducidade.

Um aviso que Tiago Barbosa Ribeiro não quer dramatizar. “O que está nos compromissos políticos é para cumprir, o que não está é para negociar. A divergência faz parte da democracia. Não há nenhum drama nisso”, defende o socialista.