CGD. Houve erro de perceção, não haverá demissão. Marcelo caucionou

Centeno e António Costa pediram a Marcelo uma espécie de “atestado político” para evitar a demissão do ministro das Finanças. Marcelo deu, mas não quis falar sobre isso

Segunda-feira, 13 de fevereiro, hora do almoço. O ministro das Finanças, Mário Centeno, entra em Belém para uma reunião com o Presidente da República. Objetivo: explicar ao chefe de Estado como vai tentar desenvencilhar-se da polémica que o tem vindo a fragilizar nas últimas semanas. 

Não é só Centeno que pede a caução de Marcelo para o que iria fazer depois – uma conferência de imprensa onde admitiu que pudesse ter existido “um erro de percepção mútuo” que possa ter induzido António Domingues a convencer-se de que o governo iria desobrigar os gestores da Caixa da apresentação da declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional. Da República Centro-Africana, onde se encontra em visita oficial, António Costa também telefona ao Presidente da República. Objetivo: envolver Marcelo na renovação dos votos de confiança política no seu ministro das Finanças. 

Apesar de se ter desdobrado nos últimos dias em manifestações de confiança a Mário Centeno, o primeiro-ministro desta vez subiu um degrau – pediu a Marcelo um ámen e publicitou-o. “Tendo lido a comunicação do senhor ministro das Finanças e após contacto com Sua Excelência o Presidente da República, entendo confirmar a minha confiança no professor Mário Centeno no exercício das suas funções governativas”, reza assim o início do comunicado do gabinete do primeiro-ministro, divulgado pouco depois do ministro das Finanças ter acabado a sua conferência de imprensa. 

No resto do texto, Costa desdobra-se em elogios aos sucessos de Centeno como ministro das Finanças. “Sob sua responsabilidade direta, Portugal logrou, em 2016, a estabilização do setor financeiro. As condições do setor bancário são hoje substancialmente melhores do que as que encontrámos em dezembro de 2015”, diz Costa, repetindo que “a tudo isto se soma a melhoria da economia real”. 

“Em 2016, o professor Mário Centeno conseguiu o melhor exercício orçamental da nossa vida democrática, no quadro de uma reorientação da política económica, que permitiu a devolução de rendimentos e a criação de condições para o investimento, que se saldou pela aceleração do crescimento e melhorias significativas na criação de emprego”, lê-se ainda no comunicado do gabinete do primeiro-ministro. “Este esforço tem de prosseguir a par do processo de estabilização do setor financeiro”. Para António Costa, com a bênção de Marcelo, está “esclarecida a lisura da atuação do governo” e nada justifica pôr em causa a estabilidade governativa e a continuidade da sua política, para o que o contributo do professor Mário Centeno continua a ser de grande valia”. 

Marcelo, no teatro de São Carlos, recusou a responder a qualquer pergunta sobre o episódio Centeno – apesar de horas antes de lhe ter renovado a confiança política, segundo o comunicado do gabinete do primeiro-ministro. O Presidente está entre dois fogos: por um lado, está consciente da trapalhada em que o ministro se meteu e na semana passada chegou a admitir que, caso aparecesse um papel escrito, a sua reação perante o caso podia ser diferente. Por outro, acha que perante as instituições europeias a saída de cena do ministro das Finanças seria neste momento desastrosa. No entanto, recusou-se a acompanhar publicamente a renovação da confiança em Centeno. “Sobre essa matéria não vou dizer nada”, afirmou aos jornalistas à porta do teatro de São Carlos. 

Na conferência de imprensa em que admitiu que “erros de percepção mútuos” possam “não ter afastado do entendimento do dr. António Domingues” que a isenção de entrega de declarações no TC não se aplicava ao decreto-lei, Mário Centeno não conseguiu dar uma explicação cabal quando questionado sobre o comunicado do Ministério das Finanças de 25 de outubro em que se afirmava não ser “lapso” o facto dos gestores estarem isentos de entregar declarações de rendimentos ao Tribunal Constitucional. 

Mário Centeno reafirmou que a qualquer momento poderia pôr novamente o cargo à disposição: “É evidente que o ministro das Finanças tem que estar dotado da confiança de todos os agentes económicos e sociais nacionais. Sempre e quando isso não acontecer, agirei”.