Big Little Lies. Crime, disseram elas

Sabe-se que acaba num banho de sangue. Que se passará antes entre mulheres, filhos e os ex?

Primeiro dia de aulas na “escola privada com preços de pública” Otter Bay Elementary de Monterey. O verão entrara de férias. As mães levam os filhos à escola em viaturas de SUV para cima. Os problemas são de primeiro mundo. Uma Reese Witherspoon (Madeline Mackenzie) em forma estupenda prepara-se para escoltar o petiz ao primeiro dia de aulas. Pelo caminho, dá com a filha mais velha no banco de trás de um carro conduzido por uma amiga. O volante é o telemóvel, o vidro o ecrã e o asfalto www. Por mero acaso, conhece Shailene Woodley (Jane Chapman), mãe solteira recém-chegada à cidade. E haverá de encontrar Celeste Wright (Nicole Kidman), bela, insinuante e mais reservada. Em prol do mistério.

Mackenzie é uma mãe rica, dona de uma casa em frente ao mar, com ciúmes da mulher do ex-marido. Wright é uma ex-advogada de topo, casada com um homem mais novo e atraente (Alexander Skarsgard). Woodley é adoptada pelas duas anfitriãs, após extenso interrogatório que não responde a todas as questões do passado. E entrará Laura Dern, recém-promovida à administração de uma grande empresa – a única orgulhosa da carreira. Algo não vai correr bem.

No primeiro dia do resto das vidas bem-sucedidas das crianças, a paz será abalada. Estala o verniz retocado antes das mães catarem as imperfeições das outras mães, enquanto trocam sorrisos cínicos e planeiam vida perfeita para os filhos. Cerram-se fileiras. Um muro entre Reese Witherspoon e Laura Dern é construído sem a ajuda de Trump. “As mulheres têm que ser sempre as mais invejadas”, repara o marido da administradora enquanto os dois se curvam perante a linha do horizonte numa mansão paradisíaca sobre o mar.

“Big Little Lies” (estreia dia 19, de domingo para segunda, às 2h no TVSéries) tem chamado a atenção graças a um elenco de luxo mas reduzi-lo às vistas seria um convite a entrar no clube de ódio de associações feministas porque se na aparências estas vidas são fúteis entre ir pôr e trazer os filhos à escola, os romances, o que elas escondem são jogos de poder, ambições, intrigas e invejas. E, claro, o lugar da mulher na sociedade retratado, por exemplo, quando Reese Witherspoon implora à filha para seguir uma carreira académica. “Tens de ser independente”, alerta para indiferença da filha. E desespero da mãe.

Mini-série de sete episódios baseada no best-seller de Liane Morarty, “Big Little Lies” tem produção executiva de David E. Kelley (de “Ally McBeal” e “Boston Legal), foi realizado por Jean-Marc Vallée (“O Clube de Dallas”) e é um drama tramado para quem vive no sonho de encontrar o “amor e uma cabana”. A cabana, ou neste caso, o casarão já está construído. O sol da Califórnia podia ser a terra do sonho americano mas este amor é um lugar estranho, ora desfeito pelas memórias, ora adiado pelas dúvidas do presente. Reina a competição social sobre a paz frívola.

Na aparência, “Big Little Lies” é um misto de “Donas de Casa Desesperadas” e “Sexo à Cidade” mas o âmago é violento e o crime podia ter sido planeado por Tarantino. A noção de injustiça surge elevada ao patamar da burguesia. Shailene Woodley (Jane Chapman), o patinho feio entre mães sexy, é “o (Toyota) Prius à porta da Barneys”, a conhecida loja de luxo onde se imagina estas mulheres a fazer compras semana-sim, semana-sim para matar o tempo e gastar o plafond de crédito.

Haverá sangue. Um homicídio misterioso. Uma investigação policial. Depoimentos. Dúvidas. Questões existenciais. Verdades à tona. Opiniões que nem Maomé diria do toucinho. Personagens a andar à roda. Imagens em corropio. Sabemos como começa e como acaba. E o porquê de ter acontecido também. Mas quem matou e quem morreu neste jogo de espelhos, aparências e ilusões?